terça-feira, 2 de novembro de 2010

Arte poética: Walt Whitman, Joan Brossa, Carlos Loures e Gastão Cruz


Walt Whitman
(Huntington, 1819 – Camden, 1892)

Ouçamos a leitura de um excerto de "Leaves of Grass", obra capital de Whitman, do qual extraímos o poema que seleccionámos para esta maratona.


MÁQUINA ALGUMA DE POUPAR TRABALHO

eu nada fiz, nada inventei,
nem sou capaz de deixar para trás
nenhum rico donativo
para fundar um hospital ou uma biblioteca,
reminiscência alguma
de um acto de bravura pela América,
nenhum sucesso literário ou intelectual,
nem mesmo um livro bom para as estantes
— apenas uns poucos cantos
vibrando no ar eu deixo
aos camaradas e amantes.

(Leaves of Grass)

 ____________________



Joan Brossa
(Barcelona, 1919-1998)

A LA POESIA


Oh Poesia, emmotlla en els avenços
l’orgull de poder dir company o pàtria;
els rics detalls han envelat les fustes
dels brots del cant.

Cada hora modifica’t, Poesia;
fes campejar severa fantasia
amb l’escalfor de l’esperit del poble
del meu país.

L’art del carrer on has estat bastida,
l’escultura del ferro que afaiçones,
no els vols un quadre mort. De vida intensa
forja el record.

Esmena’t de l’afany dels qui et fan fosca,
poetes de la mel i la melassa,
capells de copa groga i cementiris,
productes bords.

Treu-te la cucurulla dels diumenges,
posa’t a lloc i reparteix els gustos
per al coronament d’un goig estètic
amb vida al fons.

Sigues mestressa amb seny en la manera
de referir-te als homes i a les coses;
constant corrent de brisa, ret justícia
a pobres flors.

Torna, amor meu, integra’t a les vides,
uneix les fletxes a la senzillesa;
deixa de banda els fòssils de les bèsties
fets de més tro.

Enrotlla’t al meu cos. Però il•lumina,
com el feix lluminós d’una lent clara,
la molta empenta d’aquest sol concepte:
la Llibertat.
__________________________



Carlos Loures

(Lisboa, 1937)


NÓS POETAS


Dizemos Povo cantamos Povo
sem que as nossas vozes edifiquem
por vezes as traves da palavra
as sibilinas trevas do seu som.

A que pedra arrancámos a sua abóbada
de mãos erguidas e crispados gritos?
Em que mesa compartilhámos a sua fome
em que dorso sofremos o seu cansaço
e em que lenço enxugámos o seu suor?
Em que rosto chorámos as suas lágrimas
em que peito acolhemos a sua dor?

Ah companheiros de ofício nem sempre
ou quase nunca o Povo dos poemas
é aquele que transcorre pelas paisagens
em que habita o desespero e espera a morte.

Bandeira será florindo o nosso verso
mas Povo no poema é coisa rara
que em rosa não cabe a sua sorte

(A Poesia deve ser feita por todos, 1970)

_______________________________

Gastão Cruz
(Faro, 1941)

A VIDA DA POESIA


Hoje sei como se exprime a vida da poesia
com a sinceridade das emoções linguísticas
com que o mundo devasta e enche as nossas vidas

Aprendi a clareza das imagens fictícias
recolhidas na luz do corpo nu e vivo
entre os golpes orais errante desferidos

(Campânula)
_________________________________

Sem comentários:

Enviar um comentário