Um texto sobre a Irlanda, sobre a forma como se alimentou a dimensão da bolha, da crise, que agora a maioria de todos nós está a pagar. Viveu-se e vive-se um período em que para alguns tudo era ou é permitido enquanto que a outros tudo era ou passou agora a ser exigido, é o que texto também mostra. Estranha duplicidade de critérios, marca inegável do neoliberalismo que os governos dos Estados membros da UEM, de direita ou de esquerda apelidados, assim como a Comissão Europeia tudo fazem para manter. Talvez por isso ninguém viu, ninguém previu o que aí estava a acontecer, salvo por ironia ou por destino, James Joyce quandon escreveu: “A casa de um irlandês é o seu caixão“..
Júlio Marques Mota
Anglo Irish Bank- Um escândalo irlandês
Roche Marc
Como um pequeno banco de retalho criado em 1964 se transformou num imenso casino que desmoronou como um castelo de cartas? A História da ascensão e da queda do Banco que é símbolo dos erros da economia irlandesa. Por Marc Roche
Simon Kelly é um jovem promotor imobiliário irlandês. Antes de ter estar falido, era frequentemente convidado a tomar o pequeno - almoço com os emissários do Anglo Irish Bank, o seu principal Banco para obtenção de fundos . O cenário: uma pequena sala do Shelboume Hotel forrado a tecido almofadado, ao abrigo dos ouvidos indiscretos. A ementa: ovos mexidos com bacon e chouriço. E também café. Uma primeira cafeteira, depois uma segunda. “Tudo se passava nesta fase da conversa, recorda-se o promotor. Um simples aperto de mão selava um projecto de várias dezenas de milhões de euros. Anglo Irish Bank financiava, de olhos fechados, os projectos mais loucos.
Simon Kelly fez destes encontros no velho Hotel a base do seu livro, Breakfast with Anglo, consagrado a maior falência financeira da verdejante Irlanda . O actual presidente do Anglo Irish Bank, Alan Dukes, terá sem dúvida todo o tempo de se irritar ao olhar para as vitrines dos livreiros. Os dias do seu poder , símbolo dos erros e abusos da forte expansão imobiliária irlandesa entre 1997 e 2007, estão de facto contados. Face ao falhanço da operação de resgaste financeiro e ao facto das perdas líquidas atingirem uma profundidade abissal, a União Europeia e o Fundo Monetário internacional exigiram, com efeito, o encerramento do banco, declarado em falência a 19 de Novembro de 2010, como uma das condições para a concessão de uma ajuda internacional à Irlanda.
Como o céu de Dublin, Alan Dukes passa do sorriso o mais feliz a uma tristeza latente: «os antigos dirigentes cometeram o grave erro de se concentrarem num único sector , a construção , violando assim todas as normas de prudência », explica este ex-ministro da economia que alcançou este seu posto algumas semanas antes do banco ter sido colocado sob a tutela do Estado, em Janeiro de 2009.
O Estado-maior anterior deixou atrás de si o caos. Com a sua chegada, a nova equipa de direcção descobre um sistema gangrenado, cheio de conflitos de interesses e de compromissos . Na primeira fila estavam os antigos dirigentes que encheram bem os seus bolsos. O anterior presidente, Sean FitzPatrick, tinha uma gestão, no mínimo muito pessoal , como testemunham os empréstimos concedidos de 88 milhões de euros a si-mesmo, a título privado e no maior segredo. Estes fundos foram investidos com associados seus numa plataforma de exploração petrolífera na Nigéria, num complexo hoteleiro na Hungria, num casino em Macau. Por seu lado, o director geral, David Drumm, também levantou 8 milhões de euros sem o conhecimento dos outros para comprar duas vastas propriedades, uma em Dublin, a outra em Capa Cod, no Massachusetts.
Fazer crer que há uma riqueza que não existe e dissimular uma dívida que existe: ao longo dos anos, a maquilhagem das contas do balanço tinha-se tornado a norma contabilística. Assim, uma instituição financeira irlandesa que trabalhava sobre hipotecas , uma caixa que trabalhava no imobiliário, emprestou cerca de 7,3 mil milhões de euros através de incríveis acrobacias para esconder os prejuízos na véspera da publicação dos resultados de 2007 do Anglo Irish Bank. Por último, recorrendo a produtos financeiros sofisticados para confundir as pistas, o banco financiou em cerca de 28% o seu aumento de capital com as contas de um grupo de clientes . E isto será apenas o princípio . Porque até agora, o inquérito da polícia tem-se defrontado com uma sabotagem dos códigos informáticos que permitem aceder aos documentos mais comprometedores. Além disso, os faltosos transferiram os seus activos (casas, automóveis luxuosos, etc.) para as suas esposas. Como é que uma pequena sociedade criada em 1964, especializada no seu início no financiamento da compra de material electrodoméstico, se conseguiu transformar num imenso casino que se desmoronou como um castelo de cartas ?
(Continua)
Estas golpadas só têm originalidade por serem de valor astronómico porque de resto são o que sempre se fez. A verdadeira originalidade é que agora são tidas como "engenharia financeira" e são autorizadas pelos reguladores e pelos estados.
ResponderEliminarIsto é que eu gosto! Isto é maravilha!É que dizer que estes tipos, espalhados por toda a parte do mundo, são inteligentes. Sem esta gente o mundo financeiro era uma sensaboria!Gregos, Irlandeses, Portugueses, Espanhóis e Italianos são 5 magníficos inspirados pelo mar.
ResponderEliminarAntónio Sales, o que quero dizer é que estes truques são os que se aprendem primeiro, só que há anos ia-se para a cadeia, agora é engenharia...um amigo meu que estava à frente de uma agência bancária esteve 3 anos preso porque deixou "rolar" uns cheque de uns milhares de contos. Eu, como director financeiro, depositava cheques no banco do outro lado da rua e sacava numa agência nos Açores, o que correspondia a pagar sem dinheiro(sem as comunicações de hoje ganhava 8 dias a descoberto). Tudo sobre controle, mas agora acaba tudo nas off shores, o truque é o mesmo, só que agora é aos milhões e em proveito próprio. Era isso o que queria dizer. Não tem nada de inteligente, tem de ganância e saber de antemão que nada lhes acontece...
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