No texto anterior, disse a Carla Romualdo que Coimbra não é só fado. Pois claro que não - além da música mais recente que se pode escutar na cidade, há o folclore da região. E o que se entende por folclore e por música folclórica?
No dizer de Fernando Lopes Graça, os grupos folclóricos em que o salazarismo pretendeu encerrar, aprisionar a música popular, constituíam «mera contrafacção». E Lopes Graça que com o etnomusicólogo Michel Giacometti levou a cabo uma das mais exaustivas recolhas da música verdadeiramente popular, sabia do que falava.
A definição de música genuinamente folclórica era, para o maestro, “ a música que está sujeita ao processo de transmissão oral. É produto de evolução e acha-se dependente de circunstâncias de continuidade, variação e selecção”. Para Fernando Lopes Graça a música de raízes verdadeiramente populares não era compatível com a a visão o regime ao criar os ranchos,“criações artificiosas, produtos daquela já anunciada folclorite aguda(...) Os ranchos folclóricos são folclore organizado, e já se deixa ver que folclore organizado é folclore deturpado – deturpação em que há um misto de ingenuidade, de cálculo, de parvoinha competição regionalista ou bairrista”. Como disse em A Canção Popular Portuguesa -
"O verdadeiro sentido do Folclore consiste no que ele tem de verdadeiro e no que pode contribuir para o conhecimento etnográfico de um povo e não no que ele tem de adulterado, servindo funções propagandísticas O folclore é, no fundo, um capítulo de etnografia e, implicitamente da antropologia – portanto um modo de conhecimento do homem nas suas manifestações artísticas, literárias e culturais tradicionais”.
No entanto, vinda a Revolução de Abril, alguns «ranchos» sobreviveram. Sinal de que alguma coisa significam para os que neles exercem a sua actividade e para os que acorrem a ver as suas exibições. E para quem os subsidia. Coimbra tem os seus grupos folclóricos e intérpretes que se dedicam á divulgação da música popular. É o caso de Isabel Silvestre, criadora do Grupo Cantares e Trajes de Manhouce, que, com preocupação etnográfica, tem participado em diversos trabalhos em distintos pontos do País e que podemos ouvir em Vira de Coimbra.
O Grupo Etnográfico da Região de Coimbra parece ter conservado todas as características que o Estado Novo insuflava nos ranchos, Nem a designação de "Grupo Etnográfico" o liberta da pesada herança dos "ranchos".
E lá longe, do outro lado do Atlântico Sul, o Rancho Folclórico Tricanas de Coimbra - Santos,São Paulo segue a mesma linha dos ranchos constituídos durante o Estado Novo e subsidiados pela Junta central das Casas do Povo - interpretar o folclore como visão estática e museográfica dos costumes e tradições dos povos e não na dimensão antropológica, dinâmica em que a vida dos povos decorre.
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quinta-feira, 23 de dezembro de 2010
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