quarta-feira, 22 de dezembro de 2010
Histórias de suicidios famosos em Portugal . 6 - por José Brandão
António Francisco da Silva Porto (1817-1890)
Historiador, explorador e africanista português, nasceu a 24 de Agosto de 1817, cidade do Porto.
Morreu a 3 de Abril de 1890, em Bié, Angola. Filho de pais humildes, na infância, ao se alfabetizar, a família toda embarcou no Rio Ave e foi para o Brasil em1829. No Rio de Janeiro empregou-se como caixeiro e, percebendo que seu futuro ali seria restrito, em 1835, embarcou para a Bahia e logo ao chegar, anunciou no jornal Correio Mercantil que mudara de nome: doravante se assinaria António Ferreira da Silva Porto.
Dois anos depois, partiu para a Africa, desembarcando em Angola, onde permaneceu por pouco tempo, indo depois para Cabo Verde, onde ficaria ainda menos tempo.
De regresso à Bahia, encontrou-a num período de revoltas políticas e estagnação comercial. Assim, partiu outra vez para a África, desta vez, com destino a Luanda, onde iria se iniciar na vida de explorador e sertanejo.
Nesta colónia portuguesa, por várias vezes embrenhou-se na selva, comerciando e travando relações com novas tribos, actividades sempre anotadas em seus diários que se tornariam famosos. Nestas anotações — que dedicou aos portugueses — conta em detalhes as sucessivas viagens que realizava: em 1839 penetrou as planícies internas de Luanda; em 1841, desceu por Benguela, explorando as selvagens regiões de Lui pelo rio Lutembo e o Zambeze superior, pelo Riambeje. Em 1845, fixou-se no Bié, de onde iniciou sua frequente e sucessiva jornada ao Barotze, que abriu ao comércio com Benguela e implantou o que acreditava ser uma digna civilização (1845 a 1852).
Silva Porto residiu pouco tempo em Luanda, preferindo seguir para o interior do território em 1839, como funante, levando bens para mercadejar no sertão. Fundou a povoação de Belmonte em 1847 (depois chamada Silva Porto, elevada à categoria de cidade; actualmente é Cuito, capital da província angolana do Bié).
Percorreu as vastas regiões então praticamente desconhecidas do sertão, a ele se ficando a dever um melhor conhecimento do Bié, remota zona para onde a sua actividade desbravadora viria a atrair colonos e comerciantes. As relações com indígenas bienos foram em geral pacíficas até à grande revolta destes, eclodida em 1890.
A acção mais memorável da sua longa vida de sertanejo e aventureiro foi a travessia que iniciou na mira de atingir a costa oriental africana, acompanhando mercadores árabes.Durante o percurso viria a encontrar o célebre missionário e explorador Livingstone (1853), a quem forneceu informações acerca do caminho a seguir até Luanda.
Silva Porto viria a desistir da travessia no Alto Zambeze, a qual seria no entanto completada por pombeiros seus que atingiram Moçambique em1854. Anos depois, o sertanejo, tendo adoecido, regressou a Portugal, para se tratar e se ressarcir das canseiras do mato.
Quando se restabeleceu, partiu para Angola, esperando-o no Bié uma calamidade: um grande incêndio havia destruído, durante a sua ausência, todos os seus haveres.Denodadamente, voltou ao trabalho e reconstruiu as instalações de Belmonte, sem poder contar com o auxílio da Sociedade de Geografia de Lisboa ou do rei D. Luís, aos quais solicitara ajuda.
Incumbido do governo português sob a tutela de D. Luís I (1861-1889), foi encarregado de pacificar tribos e pôr um fim às injustiças sociais a que se submetiam os selvagens. A isso e aos iminentes perigos de invasão, solicitou ajuda da corte para uma intervenção militar na região. Não atendido, fez-se agricultor, formando uma grande fazenda no Bié (Belmonte) e outra próximo a Benguela.
Regressou a Portugal para negociar e, assim que retornou à África, viu suas propriedades incendiadas. Foi nomeado capitão-mor da região, realizando grandes esforços para assegurar o prestígio das autoridades portuguesas ante as invasões estrangeiras e as ameaçadoras tendências da política nativa.
Velho, empobrecido e extremamente nacionalista, esperava que chegassem recursos e reforços para que Portugal não sofresse grandes humilhações. Mas essa ajuda nunca chegou: a metrópole sofria a transição com a posse de D. Carlos I (1889-1908), a situação se tornou cada vez mais tensa e percebeu seu isolamento diante da rebelião dos nativos ao colonialismo que por mais de meio século ali se instalara.
Era capitão-mor do Bié quando a população indígena se revoltou contra a autoridade portuguesa, representada na vasta região por escassas forças militares, que protegiam um reduzido número de colonos.
Ainda hoje não se conhecem as razões fundamentais que o levaram a um bizarro suicídio.
Só, desamparado e amargurado, optou pelo suicídio. Levantou-se de madrugada, embrulhou-se na bandeira portuguesa, sentou-se sobre um barril de pólvora e ateou fogo, explodindo com ele.
Abandonado no interior, na sua fazenda «Belmonte», perante uma revolta de naturais, segundo alguns quase contrário a violências e sem protecção militar, decidiu fazer da sua morte uma página da história-pátria, protestando talvez com esse gesto.
Os seus diários estão hoje na Biblioteca Municipal do Porto e outras obras como Cinco Viagens ou costumes e usos gentílicos; Diários de meus apontamentos (1860); Notas para retocar minha obra assim que as circunstâncias permitam; Jornadas do alto Cassabi e país do Meio; Vocabulário quimbundo e Memorial de Mucanos, encontram-se na Sociedade de Geografia de Lisboa, de onde saiu seu imponente funeral para o Porto.
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