quinta-feira, 13 de maio de 2010

Vagas em lares compradas com donativos.

Carlos Mesquita



Anúncio: tenho sido um blogo-céptico, participarei neste com a satisfação de estar com alguns companheiros que aprecio e conheço há imensos anos. Com eles passei dos tempos mais significativos da minha vida. Estou habituado a escrever mais opinião que crónicas; é o que me proponho fazer aqui, falar do que se passa. Como tenho uma vida profissional atribulada quando há trabalho, e folgada quando não há, se escrever muito é sinal de agravamento da crise económica. Obrigado Carlos Loures.



Ouvi no primeiro dia da visita do Papa, repetir na rádio o que o ministro da presidência Pedro Silva Pereira disse à Agência Ecclesia em Abril, cito. “É muito importante sublinhar que esta visita acontece num momento em que as relações entre o Estado e a Igreja são muito fortes na acção social. Há uma enorme convergência entre o Estado e as Instituições de Solidariedade Social ligadas á Igreja. Um recente estudo da Universidade Católica Portuguesa indicava que aproximadamente 60% das receitas das IPSS ligadas à Igreja vêm do Estado.”Fim de citação. Diz o ministro que as relações entre o Estado laico e a Igreja católica se fortaleceram pagando os contribuintes a maior parte da acção social da Igreja. Acção social que tendo aspectos meritórios é também um veículo de difusão dos interesses da Santa Sé. Bem podia o Papa passar para além da Torre de Belém, pelo Ministério das Finanças; é de lá que saem as novas caravelas a espalhar a Fé.


A ideologia religiosa é facilmente suportável na nossa sociedade, menos tolerável será que haja lares sustentados pelo Estado, sem fins lucrativos como rezam os seus estatutos, que exijam dinheiro para permitir a entrada de idosos. Há lares que vendem as vagas, o método é elementar; afirmam a quem os procura que há quem esteja inscrito aguardando vez e na disposição de dar um donativo à instituição, se o necessitado se mostrar permeável pode iniciar-se o negócio, ou há um preço de tabela, que rondará hoje o mínimo de 5.000 euros, ou entram em leilão regateando valores. Mais grave é que este abuso, que constitui um crime de burla, está generalizado no país. Em qualquer pequena cidade todos sabem quanto custa em dinheiro ou em propriedades ter acesso aos lares da região, é conhecido das autoridades, os responsáveis das instituições sabem que é uma ilegalidade, mas a prática indigna continua sem intervenção judicial que lhe ponha cobro. As instituições ligadas à Igreja, as tais com quem “o Estado tem fortalecido as relações” como as Misericórdias, têm sido acusadas desta actuação vergonhosa, nem o negam. O padre Lino Maia presidente da Confederação Nacional das Instituições de Solidariedade justificou-se há já algum tempo à Lusa, dizendo que “muitas instituições estão a lutar pela sua sobrevivência” e que “vêem-se forçadas a recorrer a esses estratagemas”. Modelar de mais um pináculo da superioridade moral da Igreja, edificante exemplo para a sociedade. Eles sabem, todos sabemos, que são os mais carenciados, sem posses, bens ou família que lhes acuda, que ficam abandonados.


Não eram esses os primeiros destinatários da Acção Social?

4 comentários:

  1. Os que não têm dinheiro não entram.A acção social é para os que não têm dinheiro, entrem. Há aqui alguma coisa que me escapa!

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  2. Meu caro Carlos Mesquita: eu é que te agradeço a tua adesão a este projecto - sê bem-vindo. Mas deixas-me com um problema de consciência (a juntar a outros...) - como só podes escrever em fases de crise económica pessoal, eu que gostaria de ter aqui textos teus diariamente, fico num dilema. Em todo o caso, talvez consigas compatibilizar a tua produtividade bloguista com a prosperidade económica. É que a tua escrita transpira humor, mesmo quando falas de coisas sérias, como é o caso do post de hoje. E o humor é muito necessário, principalmente em épocas como a que atravessamos. Um grande abraço, carlos.

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  3. A Acção Social precisa dos que não têm dinheiro para poder criar instituições, para poder receber subsídios para ... para dar ajuda não tanto aos mais necessitados mas aos eleitos de bolsa cheia. Pobre de quem mais precisa que tão abandonado anda.
    maria

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  4. Reza a História que Jesus de Nazaré, irado, mandou “a barraca abaixo” à porta do templo de Seu Pai, em Jerusalem. Se Ele aparecesse, pois, no Vaticano (ou em Fátima…) decerto que traria a M-60 do Rambo…

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