domingo, 13 de junho de 2010

Novas Viagens na Minha Terra


Manuela Degerine

Capítulo XVIII

Etapa 6: Fátima (conclusão)

No refúgio encontro dois espanhóis a fazer o jantar. Ele é de Santiago de Compostela, segue pela segunda vez o Caminho, na primeira partiu de Saint-Jean-Pied-de-Port e agora de Lisboa; comunicamos em galaico-português, uma ou duas vezes peço-lhe para repetir, por exemplo, quando ele pronuncia Xulho (Julho). Ela percorre-o pela terceira vez, as primeiras por variantes do Caminho Francês, neste momento pela Via Lusitana. Inquiro porquê. Ele sublinha logo que não tem motivações religiosas, no entanto já foi a Roma, a Lurdes, a Santiago pelo Caminho Francês, agora passa por Fátima e continua para Santiago, afirma crer numa transcendência que não é apenas católica, projecta ir em seguida à Meca e a Jerusalém. Ela caminha para descobrir as forças que em si traz; em Março, quando foi a Santiago pela primeira vez, incharam-lhe os pés, teve que cortar as botas para as descalçar, caíram-lhe as unhas – mas não interrompeu a caminhada. Também gosta de ver paisagens, descobrir cidades, encontrar outros caminhantes porém, mais que tudo, deseja voltar a sentir, pela terceira vez, a emoção da chegada a Compostela; confessa que faz muitos pedidos a Santiago.

Estes dois andarilhos percorrem no mínimo quarenta quilómetros por dia e caminham, por enquanto, quase sempre à beira das estradas, para irem mais depressa, pois dispõem de um pecúlio reduzido e os alojamentos, nesta parte do percurso português, ao contrário do que se passa em todo o espanhol, são muito incertos – por exemplo, os bombeiros de Santarém, onde esperavam ser acolhidos, não lhes deram pousada.

Quando chegaram ao refúgio, tomaram duche, lavaram a camisola do dia, que amanhã hão-de vestir húmida pois, para limitarem o peso da bagagem, só trazem duas cada um. Depois de jantar, vão ao santuário; voltam uma hora mais tarde.

Chega então um neozelandês. Andou perdido a pé, foi recuperado por um autocarro de peregrinos e, chegado a Fátima, deu inúmeras voltas de joelhos à capela das aparições. Dorme numa tenda de campismo mas utiliza a cozinha e a casa de banho do refúgio.

Na manhã seguinte tomamos o pequeno almoço todos juntos. Os espanhóis oferecem o chá, eu o chocolate preto, o neo-zelandês o seu colossal apetite: devora os croissants dos espanhóis. Peregrinou num santuário da Croácia, se bem percebi, em Roma, em Lurdes, aqui... Fátima deve todos os dias atrair malucos desta espécie.

Os espanhóis partem logo a seguir. Despedimo-nos com simpatia. Ver-nos-emos em Santiago.

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