quinta-feira, 21 de outubro de 2010

Houve uma República da Atlântida


Carlos Loures

Desde que Platão em Timeu e a Natureza e em Crítias se referiu a um misterioso continente perdido, o mito da Atlântida tem dado lugar a narrativas de toda a espécie e a mil e uma teorias, uma ou outra com alguma consistência científica. Uma dessas teorias, situa a Atlântida na chamada região da Macronésia, que abrange as Canárias, a Madeira, Cabo Verde e os Açores. Segundo essa teoria, estes arquipélagos seriam os pontos mais elevados do continente tragado pelo oceano devido a uma catástrofe (e as hipóteses vão desde o Dilúvio, a uma bomba nuclear, talvez lançada por extra-terrestres…).

A 4 de Fevereiro de 1931, Houve uma revolta na Madeira que ficou conhecida, pela “revolta da farinha". Hei-de falar desta revolta popular. Mas hoje queria referir-me a outro levantamento, este feito por militares, que eclodiu cerca de um mês depois da "revolta da farinha". Ia a Ditadura Militar no seu quinto ano de vigência, quando em Abril de 1931, eclodiram na Madeira, nos Açores, na Guiné, levantamentos militares contra o Governo. Desde a Grande Depressão de 1929, Salazar então Ministro das Finanças, impusera medidas que, tentando restringir os efeitos dessa «crise global», como hoje diríamos, obrigava a população mais carenciada a complicadas ginásticas para resolver problemas básicos de subsistência.

As liberdades democráticas que tinham ficado como herança da I República, iam sendo, uma a uma, suprimidas. Daí as revoltas insulares desencadeadas por militares. Foram todas elas rapidamente juguladas, menos a da Madeira que, devido ao apoio popular que teve, resistiu durante alguns dias às tropas e aos navios de guerra que foram enviados do continente. Os revoltosos eram coordenados pela «Liga de Paris», directório de refugiados políticos portugueses na capital de França.


Esperava-se que as unidades continentais aderissem, o que não aconteceu. Só em 26 do Agosto seguinte foi desencadeada em Lisboa uma outra revolta militar e civil, orientada no sentido de repor as liberdades fundamentais coarctadas pela Ditadura, que após a rendição dos revoltosos, se cifrou em cerca de quarenta mortos e duzentos feridos.

Os revoltosos das ilhas chegaram a ponderar proclamar a independência daquilo a que chamaram a «República da Atlântida». Feita por militares na sua maioria continentais colocados nas unidades sediadas na Madeira, foi a primeira ameaça de secessão que dali nos chegou. Mas não seria a última, pois agora essas ameaças chegam-nos com muito maior frequência. Primeiro foi a FLAMA, Frente de Libertação do Arquipélago da Madeira, que se terá extinguido em 1978. Daí para cá, ou são alguns dirigentes históricos do movimento separatista ou o próprio presidente da Região Autónoma que, de forma explícita ou implícita, agitam esse fantasma.

Dessas ameaças hei-de falar proximamente. Hoje queria apenas dizer aos que não sabiam e lembrar aos que se tenham esquecido que em 1931, como que saída da imaginação de Júlio Verne, foi proclamada a efémera República da Atlântida,

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