domingo, 3 de outubro de 2010

Últimos dias de praia

Clara Castilho


A luz já e diferente, o sol já aquece pouco. Mas prevemos as chuvas e o cinzento e vamos ainda beber sofregamente os últimos raios solares que nos permitem estender o corpo sobre a areia, relaxado, lendo, dormitando, ou só ouvindo as ondas do mar.

O mar está cheio de cabecinhas pretas. São jovens a surfar – uns a fazê-lo mesmo, outros a aprender. Um negócio que floresce correspondendo a uma necessidade sentida ou oportunismo de modas?

A vista é engraçada e faz-me mergulhar, não na água que está fria, mas na relação do homem com a natureza. Ou melhor, no homem que quer dominar a natureza, naquela que é uma luta corpo a corpo.

Admiro a “coragem” de quem anda mesmo dentro das ondas gigantes (não estas que são franganitas), a coragem do João Garcia quando em 1999 foi o primeiro português a subir o Monte Everest, e em Abril deste ano a subir o Annapurna, sem oxigenação artificial, e sem carregadores de altitude. O que leva estas pessoas a querem atingir tais metas? Terá certamente o elemento da coragem. Terá o elemento de quererem ser reconhecidas, atingir fama, ultrapassar recorde, receber prémios. Querer ser melhor do que os outros é positivo?

Nos dois casos que citei, as ondas e os altos cumes cheios de neve, é uma luta solitária, do homem com um elemento que se quer dominar, ultrapassar. Relembro algumas leituras, outras situações em que encontro alguma semelhança. Haverá sentimento de “indissolúvel comunhão”? De fazer parte da totalidade do mundo exterior? Haverá aquilo a que alguns chamaram “experiência numinosa”, outros de “sentimento oceânico”?

Seja como for é algo que nunca senti e que, racionalmente, não consigo entender. O melhor é continuar a só apanhar sol, armazenando energias para o inverno que se aproxima e que dispensava…

3 comentários:

  1. Está um belo dia de praia.
    Cuida-te, não venha do mar uma prancha voadora.

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  2. Agora não, que já não tenho idade para isso. Mas esquiei durante muitos anos nos Alpes, com meus filhos e sobrinhos, que me desafiavam, de forma responsável, para aventuras levadas da breca. Cheguei a descer com eles pistas negras muito difíceis. Cheguei a esquiar a 3000 metros de altitude, com vinte graus negativos. No alto das pistas, muitas vezes, quase as lágrimas me vinham aos olhos, pelo medo e pelo sacrifício que via à minha frente, quando iniciávamos uma descida. No entanto, chegado ao funda da montanha, após um penoso mas deslumbrante trajecto, só ansiava subir de novo para repetir a façanha. Vamos lá saber porquê.

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  3. A minha maior aventura foi aquela em que ia morrendo afogada. Não teve nada de épico.Mas é bom sentir a adrenalina.

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