Carlos Luna
Simples curiosidade histórica: sonetos completos - os 22 sobreviventes do oliventino Caetano José da Silva Souto-Maior, o "Camões do Rossio" (1694-1739):
Soneto dedicado à mártir cristã Santa Bárbara, quando era despida pelos seus algozes
Virgem bela, não julgues tirania
ser despojada desse adorno insano;
não se cobre um planeta mais que humano
e despido aparece à luz do dia.
Toda espírito o orbe te advertia,
e o decreto infalível do tirano,
mostrou que em ti, com raro desengano,
no mortal o imortal não se encobria.
A beleza, em que o véu ditas apura
desprezando essas galas infelices (*),
brilha triunfante, resplandece pura.
Jesus foi, não violento que existisses
sem manchas no esplendor da formosura,
porque vestido o Sol padece eclipses.
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(*) -Forma moderna: infelizes
Soneto a D. João V (o Rei !), mandando celebrar exéquias do Papa Clemente XI
Túmulo excelso a régia potestade
na morte erige do Pastor Romano,
qu`o afecto do Monarca Lusitano
excede a vida, e chega à eternidade.
No sentimento empenha a majestade,
pois vendo que da Parca o raio insano
profanou o alto Sólio Vaticano
a obediência converte hoje em piedade.
Das cinzas frias à memória rara,
na funesta, magnífica estrutura,
Triunfo, ´inda que fúnebre, prepara.
Pois nesse altivo mausoléu procura
que pareça o respeito da tiara
ornato, e não despojo, à sepultura.
Soneto dirigido ao príncipe, por ocasião do beija-mão
Da Líbia ardente o morador adusto
teme o ver-me, senhor, de vós honrado,
pois nessa mão se admira vinculado
de Lísia (*) o bem, da Mauritânia o susto.
Receia que esse braço, sempre augusto,
dos portugueses todos adorado
seja com vaticínio antecipado
pródigo de valor triunfante, e justo.
Conhece que os turbantes orgulhosos
cheguem, senhor, a ter tantos perigos
quantos tendes agrados decorosos.
Publique a minha dita os seus castigos,
que a mão, que fez vassalos venturosos
é o mais certo terror dos inimigos.
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(*) figura mitológica greco-latina
Soneto a uma Senhora nobre que fugiu para Espanha com um Marquês,
tendo-se depois arrependido e recolhido a um Convento
Esse claustro, em sagrada penitência,
pio te esconda, oh bela criminosa,
econverta-se em sombra a luz formosa
que ardeu nos sacrifícios da indecência.
Tolera da prisão toda a violência,
perdida já a nobreza generosa,
fique ainda entre a culpa indecorosa,
benemérita, ao menos a paciência.
Principia a morrer nessa clausura,
encobrindo um descrédito infinito
no antecipado horror da morte obscura.
Mas, oh!, se em ti, por último conflito,
como vai sendo a vida sepultura,
chegasse a ser cadáver o delito!
(Continua)
terça-feira, 29 de junho de 2010
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