Manuela Degerine
Capítulo XXXIV
Passeio pelos museus:
Museu Nacional de Arte Antiga e Museu Nacional de Arqueologia
No Museu de Arte Antiga demoro-me diante de uma vista de Goa no século XVII, de um mestre desconhecido, localizando a praia de Chapora, onde passei dois meses, o forte de Aguada, onde tanta vezes fui... Pintado em Goa no século XVI, o retrato de Afonso de Albuquerque continua a impressionar-me pela força e autoridade que dele emana – ao lado, D. Francisco de Mascarenhas é apenas uma imagem oficial.
Este museu é um festival da língua portuguesa: encho duas páginas com palavras. Selecciono agora o ceboleiro, recipiente onde germinam os bolbos (de jacinto, por exemplo), as doceiras e compoteiras, pelas delícias que evocam, o ventó, caixa-escrivaninha indo-portuguesa... Detenho-me a ver pratos de religiosas aristocratas com o nome e as armas da proprietária: SOROR BRITES THEREZA DEIEZUS. Isto é... Soror Brites Teresa de Jesus. Revejo as naturezas-mortas de Antonio Pereda y Salgado, há pouco expostas na fundação Calouste Gulbenkien, passo pela Salomé de Lucas Cranach, reparando na aparência daquela rapariga: nossa contemporânea no trajo e penteado, se apanhasse o Metro, chamava a atenção apenas por ser bela e elegante. Imobilizo-me em êxtase perante o retrato de um aristocrata pintado em 1700 por Nicolas de Largillière: o vermelho da capa, o ouro da casaca, o branco da cabeleira, o gesto e o olhar... tudo é superlativamente espectacular. Rococó, claro! E concluo a visita fotografando, é claro e evidente, duas esculturas que representam Santiago.
No domingo seguinte vou ao Museu de Arqueologia. Começo pela exposição sobre os vestígios, encontrados na Quinta do Rouxinol, perto de Corroios, de uma olaria romana com actividade ao longo de 250 anos, que produzia ânforas, telhas, loiça, lucernas... Trago para casa a palavra lucerna, de que muito gosto, tomo até a decisão de escrever um texto com palavras encontradas nos meus passeios de domingo, aponto uma citação de Duarte Nunes de Leão (Descrição do Reino de Portugal, 1600, capítulo XIII, folha 34 v°): Outra coisa tem o Tejo com que se avantaja de outro rios de Hespanha, que é da grossa pescaria que nele se faz de diversos géneros de pescado. As ânforas destinar-se-iam portanto ao transporte de pastas e molhos à base de peixe e marisco de que os romanos eram muito apreciadores.
Nas Antiguidades Egípcias miro os sarcófagos de Irtieru e Pabasa, oiço conversas de outros visitantes, tá bem pintado, não tá?, aponto uma passagem do Livro dos Mortos (do capítulo 125): Não blasfemei contra os deuses / Não roubei os bens do pobre / Não fiz sofrer / Não fiz passar fome / Não fiz chorar / Não matei / Nunca fiz mal a ninguém. Também está bem dito. (E bom era se, trinta e cinco séculos mais adiante, isto começasse a ser praticado.)
A secção Tesouros da Arqueologia Portuguesa expõe a técnica, estética e funções dos metais preciosos da pré-história à época romana. Miro a estátua de guerreiro usando um torque semelhante aos que, em ouro, aparecem expostos, divertem-me os comentários de alguns camponeses suíços... Expressão dubitativa e hesitante de quem não compreende por que carga de água dão, naquele museu, tanta importância a anéis, colares e pulseiras:
- Agora podia-se fazer isto tudo!
Concluo a visita na exposição Religiões da Lusitânia perante os quatro varrões ou berrões de Cabanas de Baixo. Imagens de fertilidade?... Regresso a casa. A Lusitânia permanece para mim obscura e esta exposição, pouco explicativa, não me ajuda a esclarecer nada.
quarta-feira, 30 de junho de 2010
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Manuela, e nos painéis de S. vicente, a nova teoria que haverá uma data numa das botas de um dos infantes e que abre caminho para novas e revolucionárias interpretações? Será?
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