quarta-feira, 9 de junho de 2010

Opinião. Manuel Alegre era um independente e agora…

Carlos Mesquita


Manuel Alegre percebeu, ao contrário de alguns dos seus apoiantes de 2006, que com o lirismo da candidatura da sociedade civil, jamais será alternativa ganhadora a Cavaco Silva. Nas condições actuais, de crise, com um governo socialista (que é o seu partido) obrigado a tomar medidas impopulares, concorrendo contra um presidente instalado, e a caminhar para o segundo mandato, ir a eleições sem amparos partidários é tempo perdido. Os apoios não são contraditórios, abarcam genericamente a esquerda e o centro esquerda, e cidadãos sem partido, é o espaço natural de Alegre, fruto do seu esforço nos últimos anos, de aproximação a sectores à esquerda do PS. Que o seu discurso seja hoje ajustado para atrair o maior número de militantes socialistas não é estranho, e que durante a campanha consiga com temas como o patriotismo, a defesa da língua, e o seu substrato cultural, conquistar votos que nem são da esquerda também será normal. O que é esquisito, embora esperado, é a quantidade de puristas da política que julgam ser possível cooptar Manuel Alegre para os seus restritos grupos ideológicos. Coisas como a unidade orgânica das esquerdas, partir o partido socialista, criar um novo partido, não correspondem a qualquer necessidade de recomposição partidária ou movimentação social visível. O equívoco, em cidadãos e em franjas dos dois partidos que lhe deram apoio, o Bloco e o PS, assenta na incompreensão do que Alegre quer significar com “aprofundar o diálogo à esquerda”. No BE entenderam “já é dos nossos”, e no PS perante a participação em eventos do Bloco e criticas pontuais à governação, chegaram a pedir a sua expulsão do partido. Exageros, a linha ideológica de Alegre é a mesma de sempre, a sua orientação estratégica antepõe ultimamente a abertura à esquerda em vez de à direita, com quem Sócrates tem governado, desfigurando na sua opinião a identidade do Partido Socialista, com a submissão a políticas neo-liberais. É só isso que se passa com Manuel alegre, e nessa relação com as outras esquerdas, como na Câmara de Lisboa, descobriu que também ele podia ganhar.


Manuel Alegre tem de contar com vários amuos; de Mário Soares, humilhado pelo resultado de 2006, de parte do BE que não consegue votar em alguém apoiado também pelo partido do governo, e no PS pela mesma razão em relação ao Bloco. Juntam-se ao coro alguns membros do MIC que estavam com Alegre por serem órfãos de partido à procura de adopção. Depois de feitas as contas, se verá se as minorias que representam as birras anunciadas são largamente compensadas pelo alargamento da base de apoio do candidato; Alegre pensará que sim.

O essencial anda arredado dos comentários; é Cavaco Silva. Não se pode discutir Alegre sem ir à hipótese de Cavaco ser o próximo presidente e o PSD ganhar as legislativas, antecipadas ou não. O grupo de Soares que vê na presidência de Cavaco maior estabilidade para um governo PS que tendo Alegre em S.Bento, não diz o que espera do país com toda a esquerda arredada de qualquer poder. O que vai acontecer por exemplo, à Segurança Social, à Escola Pública ou ao Serviço Nacional de Saúde? Para certa esquerda apologista do quanto pior melhor, é conveniente esse quadro, mas para os portugueses significa perder, talvez definitivamente, conquistas sociais até agora universais a toda a população.

Manuel Alegre não é uma corrente política, é tão só o candidato melhor colocado para enfrentar o candidato da direita, e vai por isso ter apoio de quem nunca esteve sequer próximo politicamente. Pessoalmente mais facilmente apoiaria uma personalidade como Boaventura Sousa Santos, mas a realidade são os candidatos que temos. Há quem afirme que Cavaco Silva pode ser derrubado na rua, pode, se conseguirem passar-lhe uma rasteira antes dos seguranças intervirem, mas para tirá-lo de S.Bento, alguém precisa de ter mais votos que ele.

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