Carlos Leça da Veiga
Uma Constituição que afoga a Independência de Portugal A partir de 1974 não devia ter-se aceite a manutenção de sujeição político-militar face à Organização do Tratado do Atlântico Norte (OTAN) e, sobretudo, em sua concomitância, às exigências de igual ordem dos Estados Unidos da América do Norte (EUAN), isso, quanto mais não fosse, pelo seu sentido político eminentemente expansionista, pela sua malfadada agressividade militar e, também, se outras mais razões não houvesse, pelo apoio indesmentível que, sempre, OTAN e EUAN quiseram dar ao salazarismo.
Essa organização multilateral político-militar, na prática concreta, é uma indesejável “marionnette” às ordens dos EUAN que, com despudor, obrigava – continua a obrigar – Portugal a uma subserviência indigna que, desde muito antes de 1974, se não só já era um facto comprovado era, também, um juízo de valor em completo desfavor do salazarismo e repetido constantemente pelos autênticos oposicionistas desse regime ditatorial. Sob a capa da defesa do que chamam civilização ocidental, nada mais é pretendido que não seja garantir, aos EUAN, a sua posição de dominância instalada e, por igual, dar passos no sentido duma sua expansão sem limites.
Se, por razões da evolução da sua política externa, os EUAN tenham acabado por não poder prosseguir no apoio activo da ditadura salazarista – o colonialismo português prejudicava-lhes a imagem na sua campanha anti-soviética e pró direitos humanos – nada pode desculpar que, logo no final da Segunda Grande Guerra, depois de tantas promessas de Liberdade e de Democracia que os Aliados deram ao mundo, os seus comandantes, os EUAN, mas não só, tenham aceite proteger e servir-se de Salazar e Franco.
Essa ligação de sujeição que o salazarismo ofereceu à OTAN e à potência que a domina, foi um reforço poderoso do estrangulamento político imposto durante cinquenta anos à população portuguesa mas que, também, por interesse do imperialismo ianque, como a História demonstrou, actuou constantemente com benefícios políticos recíprocos.
Afinal os beneficiários do 25 de Novembro – pois é destes que deve falar-se – entenderam por bem continuar ao serviço duma política internacional de agressão, porém, como bons hipócritas, escreveram o Artigo 7º da Constituição, designadamente, o seu número dois e, desta maneira, fingiram apresentar-se como progressistas, inimigos do imperialismo, amantes da liberdade e defensores da dignidade dos povos.
Só a força dos interesses ideológicos alienígenas, todos eles de muito mau cariz – os de Leste, sorte a nossa, nada conseguiram; os de Oeste, azar nosso, pelo contrário – é que, associada com aquela de certas personalidades nacionais do pior jaez e ínsitas na alta hierarquia partidária portuguesa, é que tudo tem sido feito para manter, senão reforçar a dependência portuguesa face à política expansionista da OTAN que é, dito doutro modo, a dos EUAN. À custa dessas personalidades portuguesas mantidas, a qualquer preço, em estado de disponibilidade e prontidão para conseguirem assenhorear-se do poder político é que têm sido feito esforços constantes e reiterados de doutrinação destinados a fazerem ignorar e esquecer que a oposição nacional ao salazarismo assacava, com justeza e desprimor muito sentidos, bastos malefícios à sujeição portuguesa àquela organização político-militar que, anos sobre anos – não deve esquecer-se e não pode deixar de voltar a repetir-se – foi uma aliada do regime ditatorial derrubado em 25 de Abril de 74.
Com efeito, depois do 25 de Abril de 1974, devia ter-se pedido escusa e abandonado aquele pacto político-militar que tanto havia abençoado o salazarismo e que, para mais, no mundo, alimentava uma guerra fria contrária, em tudo, aos objectivos estratégicos perspectivados pelo 25 de Abril que – importa reconhecer-se – eram aqueles mesmos ambicionados, apoiados e proclamados pela generalidade da população portuguesa, de tal modo, como ficou bem patenteado, até foram respeitados – sem consequências reais – na letra constitucional pela maioria dos Constituintes de 1975.
Na verdade, defender-se o abandono da OTAN não é caso para quem quer que seja poder dizer estar a querer aventar-se um posicionamento político impossível ou, por igual, estar a defender-se o contrário da vontade nacional já que, na realidade indesmentível, outra leitura não pode fazer-se do que está escrito na actual Constituição da República Portuguesa, aprovada em 1975. Esta, como tem disposto, não vê com bons olhos a inclusão nacional em conluios internacionais político-militares indo ao ponto de preconizar, por expresso, que terminem pela sua dissolução.
Afinal o que tem acontecido? Apenas mais um desrespeito pelas disposições constitucionais e, de verdade – isso é indiscutível – nenhum executivo nacional, nem qualquer legislativo deram ouvidos ao estatuído na Constituição que, tem de reconhecer-se, é demasiado tíbio para não dizer permissivo.
Com efeito, o Artº.7 da Constituição vigente, que volta a ter de referir-se, é mais uma outra passagem do texto constitucional português que, a avaliar pela realidade vivida, não passa duma afirmação, dir-se-á piedosa – para não dizer desonesta – sem qualquer vigor político porquanto, em todos os seus sete números, nada estipula, com clareza e frontalidade, contra qualquer hipótese da aceitação dum dependência política do exterior, antes porém, como está escrito no número dois daquele Artigo constitucional, “Portugal preconiza a abolição do imperialismo, do colonialismo e de quaisquer outras formas de agressão, domínio e exploração nas relações entre os povos, bem como o desarmamento geral, simultâneo e controlado, a dissolução dos blocos político-militares …..”.
Quando a lei fundamental só é bastante para contentar-se em preconizar uma oposição contra várias modalidades dum qualquer constrangimento político-militar que possa recair sobre a livre autonomia de qualquer Povo, então as coisas estão a correr mal e muito terá de duvidar-se da democraticidade autentica dos Constituintes portugueses de 1975 mas, também, não esquecer, de quantos, de revisão em revisão, prosseguem na mesma linha.
A Constituição devia conter determinações frontais, firmes e obrigatórias para uma recusa total da aceitação de qualquer daquelas modalidades de violência imposta fosse a Portugal, fosse a outro qualquer Estado. A não ser assim, então, qualquer cidadão pode concluir que a Constituição da República não passa dum repositório de intenções plenas de hipocrisia ou, talvez, por que não dizê-lo, de traições à Democracia.
(Continua)
terça-feira, 22 de junho de 2010
Subscrever:
Enviar feedback (Atom)
Enquanto a UE não tiver o seu próprio exército (porque isso custa dinheiro) pagamo-lo pela sujeição a uma realidade a que não se pode voltar costas sem uma alternativa.
ResponderEliminar