Carlos Leça da Veiga
(Continuação)
Toda a realidade política decorrente tanto da submissão portuguesa à OTAN como, também, da sua integração na União Europeia – não há outra política para poderem fazer-se aferições e comparações – constitui-se, com toda a objectividade da causa para efeito, como a particularidade mais responsável não só pelos prejuízos políticos, económicos, culturais e sociais que, dia após dia, recaem sobre a generalidade dos portugueses como, por igual, provocam a perda lamentável da visibilidade internacional de Portugal. Tudo o que possa dizer-se em sentido contrário não passa dum oportunismo político baseado na ideia ultrapassada que a Europa prosseguirá no mundo com o seu estatuto tradicional. Políticos e comentadores não conseguem afastar-se do caminho que está a levá-los à derrota.
Portugal que com o 25 de Abril deu um passo histórico verdadeiramente democrático e progressista, depois, pela mão dos dirigentes político-partidários, acabou por ter de ver-se enfeudado com tudo quanto representa retrocesso económico irreparável, submissão inaceitável à vontade do exterior e ausência total de boas perspectivas estratégicas.
Afinal em que parte do mundo é que estão a surgir, com sucesso económico estrondoso, os grandes potentados económicos?
Afinal com que parte do mundo é que, de facto, interessa ter mais e melhores relacionamentos?
A redefinição do centro do poder estratégico mundial jamais voltará a dar predomínio a qualquer dos Estados europeus, dos continentais, sobretudo.
Assim, para que parte do mundo deve caminhar Portugal?
Para aquela que, como deve ser, nunca praticou alinhamentos políticos com conglomerados multilaterais e que, na voz dos dirigentes do mundo ocidental, regra geral, foi sempre rotulada – erro tremendo e irreparável – como terceiro-mundista ou, muitas vezes, com desprimor e sobranceria inaceitáveis, de atrasada.
Na Constituição tinha de ter-se optado por uma linha de intervenção definitiva, peremptória e claramente adversa de quaisquer conluios internacionais com pactos militares ou civis de índole multilateral e de natureza expansionista. A verdade é que, para as cúpulas partidárias que têm comandado os destinos portugueses posteriores ao 25 de Abril, o caminho preferido tem sido o da aceitação despundonorosa da dependência nacional que, à custa duma propaganda política de baixo estofo, tentam exibir como uma comparticipação activa numa luta internacional em favor da Democracia contudo, atente-se, ou naquela sujeita á versão ianque, prepotente, asfixiante, hegemónica e de índole militarista ou, por igual, naqueloutra filha dos famosos, velhos e bafientos equilíbrios estratégicos europeus, muito viciados e imensamente destorcidos pelo poder dos seus interesses expansionistas – económicos e políticos – completamente desajustados e muito recusáveis, dos Estados continentais do centro europeu.
A verdade é que a Constituição portuguesa está muito longe de ser um instrumento político suficientemente poderoso, de verdade, colocado ao serviço da Democracia, da Independência e da Soberania Nacionais e, como assim, é difícil não dizer-se que, afinal, a avaliar pelos procedimentos políticos observados dia a dia, de facto, a Constituição até afoga a Independência Nacional.
Na Constituição da República Portuguesa, no número três do seu Artigo 7º, está escrito que “Portugal reconhece o direito dos povos à sua autodeterminação e independência e ao desenvolvimento, bem como o direito à insurreição contra todas as formas de opressão”.
Infelizmente esse reconhecimento não passa de mais outra frase que a nada obriga. Se assim fosse não era possível aos sucessivos governos portugueses continuarem a não apoiar, como exemplos muito pertinentes, entre muitos outros, os movimentos de independência justíssimos que, duma maneira mais ou menos evidente, têm a coragem de insurgirem-se contra, entre outras, as dominações castelhana, inglesa, prussiana, piemontesa, russa ou chinesa. Quantas Nacionalidades subjugam? “La «troisième Europe»” – escreveu o bretão Yann Fouéré, em 1968, na sua obra L´Éurope aux Cent Drapeaux – “ne pourra naître que de léffacement dês actuels États-nations souverains, communs diviseurs de l´Europe et legs attardé du XIX siècle: ces grandes formations étatiques – France, Espagne, Italie, Belgique, Grande-Bretagne, Russie …. – doivent être divisées.”
A população portuguesa, não pode contentar-se em aceitar os adornos de hipocrisia que, os Constituintes, por puro oportunismo político, entenderam apropriado e conveniente introduzir na letra do número três do Artigo 7º da Constituição da República. De facto nunca foi visto que Portugal – tanto os seus representantes oficiais como, até, quaisquer dos das suas forças partidárias – tenha sentido a obrigação política e ética de ter uma intervenção activa em favor de quaisquer dos movimentos independentistas espalhados pelo mundo ou, por igual, de exercer uma condenação concreta, caso a caso, de quaisquer formas de opressão sobre quaisquer Nacionalidades que não tenha sido, triste realidade, por determinação prepotente ou com a anuência interesseira da política expansionista dos EUAN.
Portugal, sem que nada possa obstá-lo, precisa e deve procurar o espaço internacional que lhe seja mais necessário e mais favorável para a consequente afirmação da sua particularidade política muito invulgar, valiosíssima e, provavelmente, ímpar – no mundo poucos conseguirão exibi-la – de não ter quaisquer Nacionalidades subjugadas logo, desse modo, ser um país que pode afirmar-se, sem margem para quaisquer dúvidas, como um farol do legitimo direito democrático à autodeterminação e independência de todos os Povos que, em todos os continentes, desde há séculos, ainda permanecem sujeitos a autoridades estrangeiras. Quais – raríssimos – sem telhados de vidro, estarão tão bem colocado como Portugal para poder falar duma nova ordem internacional democrática?
É inaceitável a desculpa, agora em grande circulação, que pretende contrapor e subverter o valor e o orgulho indispensáveis da Independência política aquele dos interesses económicos dos grandes espaços territoriais.
Na República actual, tal como na Primeira, quem nelas pôs e dispôs, aceitou e aceita prosseguir, senão incentivar – muito negativo – uma ligação internacional alicerçada na dependência absoluta dum potência hegemónica que se deixou de ser a da pérfida Albion (bem aceite e bem mendigada em 1910, tal como o fora, por três séculos, com os Braganças) passou a ser a ianque acrescida depois, anos após, por aqueloutra centro-europeia, cujas, por igual, uma ou outra, a modos distintos, não deixam de ser asfixiantes.
Se na Constituição da Primeira República Portuguesa o assunto das alianças multilaterais com o exterior não foi versado, na da Segunda* – a de agora – bom grado, por expresso, no texto constitucional, aparecer afirmado que Portugal é avesso à sua inclusão em pactos político-militares inclusive avance com uma afirmação sobre a sua necessária desarticulação (o já citado número dois do Artigo 7º), apesar de tudo isso – é uma repetição intencional – Portugal, o governo português, com a integração na OTAN, não só prossegue numa prática semelhante à do tempo do salazarismo como, para cúmulo, à semelhança dos erros da Primeira República, excede-se e facilita contingentes militares expedicionários sobre o pretexto ardiloso da defesa e da promoção da paz em territórios com cujos problemas internos e, em muitíssimo especial, com os de política exterior nada há em comum e, talvez mesmo, até só haja inconvenientes muito sérios em aceitarem-se envolvimentos intempestivos, por evento, politicamente irreparáveis já que em desacordo total com a tradição política portuguesa. É incompreensível que os portugueses aceitem – ao sabor dos interesses ideológicos de ocasião – como um bom procedimento político que possa haver uma rarefacção dos relacionamentos bilaterais com quem não temos qualquer litígio, isso em troca de oferecer-se alguma ajuda à potência que, no mundo, mais atenta contra a Paz
quinta-feira, 24 de junho de 2010
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