Carlos Leça da Veiga
Utopia que seja; quem quererá partilhá-la? (Continuação)
Será utopia querer modificar o mundo em que nos tem sido dado viver?
Como tentar fazê-lo?
A Democracia, e só a Democracia, tem obrigação e tem possibilidades de poder consegui-lo.
No nosso País, a República, tal como é determinado pelo seu ordenamento constitucional, não parece ser capaz de encontrar a resposta mais favorável, aquela que nos dias de hoje, é imperioso exigir-se. Uma outra República haverá de sê-lo. Experiência após experiência – a História a isso obrigará – algum resultado deverá conseguir-se, pese embora, admitir a possibilidade de conseguir atingir-se uma qualquer perfeição seja, pelo certo, um procedimento muito insensato. Utopia não é um sinónimo de insensatez. Um lugar procurado pode, jamais, conseguir encontrar-se.
Procure-se inventar uma República fundamentada numa Constituição Política que, como disse de Fernando Pessoa, saiba “ter saudades do futuro”; que, como desejado por Teilhard de Chardin, não inquine a perspectiva de “crescermos para cima e para dentro”; que, como ensina Jonathan Wolff saiba “determinar a distribuição adequada de poder político” e que, como prescreve Rabindranath Tagore, leve muito em conta que, “se fechas a porta a todos os erros, deixarás de fora a verdade”. Bastar-lhe-á que seja uma Democracia com uma Constituição desejável e exequível aberta, o mais possível à verdade, à participação de todos e que, por igual, seja a Democracia do ser, a do ter e a do saber.
É preciso defender-se um novo projecto de organização política do todo nacional – um projecto constitucional alternativo – que elimine os erros e as insuficiências da ordem constitucional vigente que, todos eles, de há muito estão a fazer sentir-se e permitem, como está a acontecer, uma gestão política demagógica, autoritária e danosa desenvolvida ao sabor das conveniências mais inconfessáveis tanto dos possidentes como dos seus fâmulos que, mais outra desonestidade, para conseguirem salvaguardá-la, tudo fazem para mostrá-la bem condimentada pela influência poderosa dum dirigismo internacional tentacular, estribado numa orientação político-económica neo-liberal e nitidamente imperialista. A experiência tem demonstrado que este modo da actuação política e económica é lesiva das boas práticas democráticas o que, entre nós, por exacto e por calamidade, está num curso ininterrupto. Os desmandos das desonestidades vindas a público, em termos de grandeza, superam, de longe, aqueles outros, muito pobres, dos indicadores favoráveis ao desenvolvimento.
Que razões haverá para que, mais uma vez na História portuguesa, continue a existir, à sombra da própria Constituição Política, uma tão grande subserviência aos ditames do exterior cujos, de facto, são as determinantes maiores do retrocesso político, económico, cultural e social da população portuguesa.
Que razão haverá, para não procurar-se uma solução nacional elaborada conforme a nossa própria História, de sobremaneira, a mais recente do pós-25 de Abril.
É fundamental, agir-se na conformidade estrita dos interesses políticos, sociais, culturais, económicos e ecológicos da maioria da população portuguesa que, por múltiplas razões, as geoestratégicas, como bom exemplo, não têm de ser, como não são e como não podem ser, por necessário, as mesmas doutros estados europeus com passados e presentes doutra conformidade evolutiva. O caso português deverá ser devorado pelas perspectivas estratégicas, retintamente expansionistas, duma Europa continental?
Portugal é um estado europeu marítimo logo com perspectivas geoestratégicas diferentes das dos estados continentais europeus que, alguns deles, por aberração, insistem, como outrora, em querer comandar os destinos do nosso continente, neles incluídos aqueles que são muito próprios dos portugueses. Neste sentido, o IV Reich, na sua versão de União Europeia, dá passos avassaladores contudo, por ora, contenta-se e basta-se com o disfarce suficiente para que, por alarde dito democrático e por via pacífica, vir a conseguir alcançar os seus propósitos dominadores. As proporções duma crise económica em crescimento acelerado permitem adivinhar que, com o decorrer do tempo, elas mesmas acabarão como bastantes para fazerem estalar o verniz que encobre a encenação do entendimento político franco-germânico. Não virá longe o dia em que entre estes comparsas estalará uma controvérsia muito séria da qual, mais uma vez na História, todos quantos têm aceite o manto da subserviência política, haverão de ser as vítimas privilegiadas.
Outrora, em 1580, a prata de Castela entrava em Portugal no dorso das mulas de Cristóvão de Moura e, sessenta anos após, o retrocesso patrimonial nacional era uma realidade desastrosa, inegável e irrecuperável. Agora as mulas que por cá entram são montadas pelos negociadores governamentais e parlamentares que, em Bruxelas, recebem como dádivas os subsídios europeus e, como é patente, desta vez, os resultados práticos, em bem menos anos de dominação, reconheça-se, não são muito diferentes.
É fundamental, é estratégico, acima de tudo, contra tudo e custe o que custar, privilegiar-se uma transformação eminentemente política, como seja, a da defesa duma nova Constituição que, substancialmente, elimine os erros e as deficiências da actual, entronize a participação efectiva da população e, por igual, expresse ao máximo e com toda a intransigência a defesa da Independência Nacional e o respeito pela Soberania Nacional.
Quem quererá partilhar esta utopia?
Será, de facto, uma utopia?
Depois de oito séculos de História será desejável passarmos a ser, apenas, mais uma região federada num estado europeu coisa que, é bom lembrar, nunca foi reclamada por ninguém da arraia-miúda portuguesa?
Não bastará como exemplo indesejável, entre quantos há na Europa, o daquelas Nacionalidades sujeitas à opressão dos reinos castelhano, inglês, prussiano, piemontês, franco etc.?
A História de Portugal deverá deixar de ter a sua identidade própria para passar a ser a dum mero aspecto da História da Europa?
Os Descobrimentos portugueses deverão passar a ser os Descobrimentos europeus?
sábado, 17 de julho de 2010
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