quarta-feira, 18 de agosto de 2010

Iberismo? Não, obrigado! (1)

Carlos Loures

A ideia de uma Península Ibérica unida politicamente não é nova. Não falando nos episódios históricos remotos em que ora Portugal, ora Castela, se tentavam mutuamente devorar, através de artimanhas, como a política de casamentos entre descendentes das linhas dinásticas ou de acções militares, episódios que tiveram o seu auge quando, entre 1580 e 1640, três reis de Castela e Aragão juntaram à sua coroa dual a de Portugal, reportando-nos a tempos mais recentes, o ideal do Iberismo tem feito correr tinta e dado que falar. Vejamos.

Personalidades como Antero de Quental, Ana de Castro Osório, Latino Coelho, Sampaio Bruno, Teófilo Braga, entre os portugueses, manifestaram, de uma maneira ou de outra, a sua simpatia por essa união. Do lado castelhano, refere-se quase sempre o mesmo nome – Miguel de Unamuno, o grande escritor e pensador nascido no País Basco, mas indubitavelmente um homem da cultura castelhana, reitor da Universidade de Salamanca no conturbado ano de 1936 em que a Espanha iria mergulhar na maior tragédia da sua história.

O pioneiro desta ideia na sua versão contemporânea, tanto quanto julgo saber, foi um andaluz de Utrera – José Marchena y Ruíz de Cueto (1768-1821) – que no seu Aviso al pueblo español (1792), propôs uma federação ibérica e republicana. Outro pioneiro, foi o catalão Joan Prim i Prats (1814-1870), militar e político que propôs um modelo federal para Portugal e Espanha. Morto num atentado o general Prim i Prats, foi a sua concepção de organização do Estado adoptada na Primeira República, proclamada em 1873 (sem a componente portuguesa, claro).

Na Catalunha, a ideia colheu mais adeptos, destacando-se o grande poeta e filósofo Joan Maragall, o lusófilo Ignasi Ribera i Rovira, Francesc Pi i Margall , presidente da Primeira República Espanhola, em 1873. Mais recentemente ainda, portugueses como Miguel Torga, Fernando Lopes-Graça, António Lobo Antunes, Eduardo Lourenço, José Saramago, entre outros, têm manifestado a sua simpatia por essa união que, olhando para o mapa da Europa, faz sentido. Falamos de uma união política, para concretização da qual seria necessário articular instrumentos constitucionais, limar arestas culturais, varrer preconceitos e desconfianças mútuos.

Teófilo Braga chegou a planificar as bases de uma Federação Ibérica, dentro da qual a Espanha teria de aceitar condições sine qua non: passar a ser uma República, dividir-se em estados autónomos aos quais Portugal se juntaria. Lisboa seria a capital dessa Federação Ibérica. Ana de Castro Osório via a união a três – «Catalunha, Castela, Portugal…Quem pudesse dar-lhes a autonomia que ambicionam os catalães e sem a qual hão-de estar sempre vexados e com razão!» Esta ideia das três entidades – Portugal, Castela e Catalunha, esquecendo a Galiza e o País Basco, enformava quase todas as teses iberistas do princípio do século XX, incluindo as de Unamuno, Ribera i Rovira, Maragall, Antero e Teófilo Braga. A ideia prevalecente era a de uma Federação de estados autónomos em quase todos os aspectos, com centros de decisão comuns – a política externa, por exemplo. E a tinta começou a correr.

Em 1906, Joan Maragall, em artigo publicado no Diario de Barcelona, defendia o ideal do federalismo ibérico. Mais perto de nós, em 1963, o escritor catalão Agustì Calvet i Pasqual, que assinava os trabalhos jornalísticos como Gaziel, escrevia no La Vanguardia, também de Barcelona, que «Poucas vezes a insensatez humana terá estabelecido uma divisão mais falsa» (do que a das fronteiras peninsulares) «Nem a geografia, nem a etnografia nem a economia justificam esta brutal mutilação de um território único».

Reunião, em Coimbra, do Círculo de Cultura Íbero-Americano - da esquerda para a direita: Egito Gonçalves, Carlos Loures, Eduardo Guerra Carneiro e António Cabral. Fèlix Cucurull esteve na reunião de Sábado, partindo para Lisboa ao fim do dia. A foto foi tirada no Domingo de manhã.

Nestes mesmos anos 60 do século passado em que Gaziel publicava o seu texto, um grupo de jovens ibéricos criou um Círculo de Cultura Íbero-Americano, com objectivos confessadamente culturais e inconfessadamente políticos. Fiz parte desse grupo. Éramos meia dúzia de portugueses, gente de Lisboa, do Porto e de Vila Real, alguns catalães e maiorquinos, um escritor castelhano de Ciudad Real, um ou outro sul-americano. Elemento comum: todos vivíamos sob ditaduras e o ansiarmos pela Democracia fazia-nos aceitar uma solução em que o ideal democrático estivesse envolvido. Fizemos reuniões, publicámos livros, estávamos a preparar um boletim multilingue, quando a PIDE acabou com a festa, prendendo um de nós, o que centralizava os contactos.

Em Barcelona, houve também pelo menos uma prisão, a de um escritor catalão que a nós estava ligado. Não digo nomes, pois não sei se os outros elementos do grupo querem, ou quereriam (alguns já não são vivos), que se saiba que foram iberistas. Eu assumo que o fui. Na época, as federações pareciam funcionar bem – Jugoslávia, Checoslováquia, União Soviética… - e se era bom para eles, com culturas, línguas e até com religiões diferentes, também não podia ser mau para nós. No entanto, a guerra que dilacerou a Jugoslávia e restaurou a independência das seis nações que a constituíam, demonstra-nos que as nacionalidades são como os cursos de água que, durante as inundações, recuperam os leitos ocupados pelo cimento, usurpados pela ganância dos construtores civis. Podem ser submetidas pela força militar ou pela artimanha diplomática mas, mais tarde ou mais cedo, o sentimento patriótico explode no peito daqueles cuja independência foi suprimida. Depois desta sumária descrição do que tem sido o Iberismo e da confissão de que já fui um iberista convicto, vem a parte dramática deste texto e que se refere a um iberismo mais recente.

Nestes casos, talvez seja melhor falarmos de iberismo integracionista.

(Continua)

3 comentários:

  1. Com o Europeísmo o Iberismo foi de vez à vida.

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  2. Sinceramente não perfilho a opinião do Luis Moreira de que o iberismo foi de vez à vida pois no respeito das autonomias de cada participante talvez nem seja tão mau como isso. Mas não é isso que justifica este comentário, antes o artigo do Carlos Loures no que respeita ao catalão Prim y Prats que fez uma enorme pressão sobre o rei D. Fernando II, pai de D. Luís I, para que este assumisse o governo de Espanha, o que era aprovado por várias cortes da Europa que o tinham em grande consideração. D. Fernando estava casado com a Condessa d'Edla e o convite de Prim provocou controvérsia em Portugal. O general P.P. chegou a enviar ao nosso país o emissário Angel de los Rios e o embaixador de Espanha a Pedir à condessa que exercesse a sua influência para que o marido aceitasse. No essential as coisas passaram-se assim mas D. Fernando colocou desde logo duas questões: 1- as coroas ou exercício do poder de Portugal e de Espanha jamais poderiam vir a ficar sobre a mesma cabeça; 2 - sua mulher deveria ser tratada na qualidade protocolar de esposa de um rei. Após diversas insistências D. Fernando acou por dizer definitivamente não e pouco tempo depois Prim y Prats era assassinado.
    Por mim com iberismo ou sem ele segue-se o folhetim nacional. Mas se a melhoria dos povos ibéricos (cultura, economia, defesa ambiental, demografia, prossional, etc.) estiver aí estarei cá para isso. Na minha próxima reencarnação, claro! Nesta já não dá.

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  3. Eu acho que o iberismo na península nunca será viável enquanto houver colonização hispano-castelhana e a exercer, como sempre,uma postura altiva e de superioridade sobre todas sa outras regiões.
    Eu, por mim, direi sempre nunca a esse passo até porque os espanhóis catelhanos não são sérios porque, para além de tudo, mantêm cativo o território de Olivença e não o entregam à governação portuguesa, como lhes compete, pela convenção de Viena de Àustria, de 1815, e que eles subscreveram em 1817.
    Os espanhóis castelhanos são aldrabões e mentirosos, nunca nos respeitaram e sempre nos atraiçoaram. Veja o acordo de paz que com eles estava firmado antes das invasões napoleónicas e surrateiramente nos viram as costas e imediatamente aliam-se a napoleão e atacam-nos em Olivença de surpresa.
    Abaixo a espanha castela

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