segunda-feira, 23 de agosto de 2010

Novas Viagens na Minha Terra

Capítulo LXXXVII

Vigésima segunda etapa: do Porrinho a Redondela



Como disponho de poucos dias, optamos hoje, mais uma vez, por percorrer duas etapas. Dezassete quilómetros do Porrinho a Redondela e vinte e um de Redondela a Pontevedra. Um total de quase quarenta quilómetros. Será possível?

Saímos do albergue às sete horas. Vesti a roupa que ontem lavei, toda molhada e malcheirosa. Como hesitava em calçar meias húmidas dentro das botas de couro, o meu companheiro de viagem empresta-me um par de peúgas novas; trouxe-as em grande quantidade. Atenua, de maneira simpática, a generosidade: assim não carrega com elas.

Até Mos caminhamos quase sempre à beira da N550; houve a travessia de uma pequena aldeia com campos de milho e um belo espigueiro – na qual todavia passavam enormes camiões. Mos é uma terra sossegada, na parte que atravessamos, com as casas de pedra, muros magníficos, um palácio, uma grande igreja, um albergue de peregrinos... Paramos para sentir o ambiente, admirar as serras ao longe, enquanto saboreio uma banana.

O caminho torna-se agradável a partir daqui. Encontramos quatro peregrinos chineses, de Cantão, dois rapazes e duas raparigas; são assistentes de língua chinesa em universidades espanholas. Vêm de Tui e têm que chegar a Santiago até sábado. Hoje caminham de Mos a Pontevera, de onde enviarão as bagagens para Padrón, o que lhes permitirá, com mais facilidade, percorrer esses quarenta e quatro quilómetros amanhã; e, no sábado, não será difícil, partindo de Padrón, alcançarem Santiago. Por ora avançam muito devagar por conseguinte, após alguns minutos de conversa, sobre Macau, Hong-Kong, Cantão e diferentes peripécias desta viagem, tiramos fotografias ao grupo, cinco mais um, que vai mudando – nós aceleramos um pouco. Eles chegaram a Mos às dez da noite... (Caminhar de noite à beira de estradas não é para mim.)

Hoje há sol. Pouco quente, por enquanto... Não só é mais agradável do que chapinhar na água mas permite-nos ver a sinalização e a paisagem – o que, nestas circunstâncias, não nos parece supérfluo. Há muito que suspendi as quatro peúgas na mochila. Quando as apalpo, não sinto mudança.

Descemos a encosta pela beira de uma estrada sossegada. Distraídos na conversa, enganamo-nos no caminho; uma mulher adverte-nos e explica que devemos virar à esquerda. O caminho encontrava-se, até agora, regularmente sinalizado, não é nada inútil, pois vamos fazendo ziguezagues, virar à esquerda, virar à direita, virar à esquerda... E Gérard também é, como quase sempre, em início de etapa, bastante explícito. Passamos por um marco miliário. Fazemos uma pausa, aparecem os peregrinos chineses, caminhamos mais um pouco juntos, deixamo-los no café da aldeia seguinte, depois quando atravessamos uma mata, encontramos duas brasileiras, estas pouco predispostas para a conversa, dali a pouco, fazemos outra pausa, elas ultrapassam-nos. O caminho de Santiago tem sido, a partir de Coimbra, animado por estas alternâncias com peregrinos que mudam ou se mantêm consoante o número de etapas que cada um vai percorrendo.

Entretanto a sinalização desapareceu: restam as indicações do roteiro, o qual nos orienta maneira explícita. (Obrigada, Gérard.)

Começamos a avistar Redondela. Durante toda a manhã, quando passamos por algum habitante, saúdo sempre em português:

- Bom dia.

Respondem todos:

- Buenos dias.

Agora, passa das onze, caminhamos à beira de uma estrada com bastante circulação, nos arredores de Redondela, aparece um homem, em sentido contrário. Já basta, desisto: falo espanhol.

- Buenos dias.

- Olá, bom dia.

- Ah, fala galego?!...

- Eu, não: falo português.

É de Braga.

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