quinta-feira, 9 de setembro de 2010

Canção de Setembro



Carla Romualdo

Em Setembro relembro a canção de Kurt Weil, anunciadora de que o tempo de espera se esgota, que os dias se fazem curtos, e que, nesse afunilar do tempo, cada dia se transforma num tesouro que não pode ser desperdiçado. Bem sabemos, como assegura a canção, que é um longo caminho de Maio a Dezembro, do auge da Primavera até à chegada do Inverno, e que tempos houve, talvez a meio de Julho, em que os dias de sol pareciam eternos, e as noites cálidas caíam sem pressa.

Mas quando irrompe Setembro, quando as nuvens anunciam o primeiro aguaceiro, e o fim da tarde traz um vento gélido, e a noite nos surpreende com a sua chegada prematura, sabemos que Dezembro já não tarda e que os dias, cada vez mais curtos, se fazem também mais valiosos.

A angústia do tempo desperdiçado faz-nos amontoar sobre as mesas de trabalho fichas de inscrição em cursos com irreconciliáveis horários, panfletos de viagens a cidades míticas cujos monumentos – ai de nós, que angústia – se degradam a cada ano um pouco mais com as invasões da turba de turistas (e que sobrará para nós, que sobrará?), pilhas de livros, recortes de jornais, impressões da web, programas de exposições.
E os telefonemas por devolver, as mensagens à espera de resposta, os papelinhos amarelos, que batem até os coelhos na rapidez com que se reproduzem, colados em todas as superfícies, alguns meramente informativos - “Dentista, dia 3” -, outros a roçar a histeria - “Telefonar S.!!!!” -, como se até as coisas inanimadas se juntassem ao coro das exigências a que nunca poderemos dar resposta inteiramente satisfatória.

E quando já não podemos negar que os dias se tornam mais curtos, Setembro toma-nos da mão, senta-se connosco para comunicar-nos, sem rispidez, que chegou o momento de abandonar os lamentos e viver o dia, tão curto, tão pleno de possibilidades no seu efémero esplendor.

Conta-se que Kurt Weil e Maxwell Andersen, autores, respectivamente, da música e da letra de “September song” escreveram-na em cerca de duas horas, no agora longínquo ano de 1938, quando já se anunciava a chegada de um longo, longuíssimo Inverno.

7 comentários:

  1. As minhas boas-vindas ao novo elemento dessa metade da Humanidade que por aqui anda tão deficitária. E gostei tanto do texto como da balada de Outono.

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  2. A Carla, já lho disse, vem beneficiar o Estrolabio em três planos:
    a) baixar a média de idades;
    b) aumentar a quota de participação feminina de 16% para 19%,vindo ao encontro do desejo da Augusta Clara;
    c) last but not least - traz-nos textos de uma grande qualidade literária, como se vê por esta «Canção de Setembro» - grande contratação, como se diz em futebolês!

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  3. Carla, que bom que é ler-te por aqui. bjs

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  4. Carlos, deixa-me cá analisar bem a tua vírgula nos 19% para que não restem dúvidas. Pelo sim, pelo não, é melhor eu acrescentar que o meu desejo é que passe depressa para 50% :)

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  5. Augusta, Maria, Carlos, muito obrigada por esta saudação de boas-vindas tão calorosa. Não podia começar melhor.

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  6. Amanhã será apresentada mais uma senhora, a Eva Cruz. A percentagem subirá de 19 para 21%.
    Não me lembro da percentagem na AR, mas não deve ser muito melhor. Os 50%, quanto a mim, não aão importantes - o importante é ter 100% de pessoas (e se 60 ou 70% forem mulheres, que importa? O Luís ficaria delirante).

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  7. Sim, convem que sejam todas pessoas com maiúscula. Mas não faço questão dessa igualdade absoluta...desde que a parte feminina ultrapasse os 50% :)))

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