Carlos Mesquita
Lembro-me de um filme publicitário inglês em que um casal idoso, viajando no seu automóvel, ouve uma canção Punk (em alemão parece-me) e segue o ritmo da música alegremente, abanando o capacete e rindo cúmplices um para o outro; em rodapé passa a legenda, a letra é toda obscenidades. O slogan era qualquer coisa do género, “ não faça figuras tristes, matricule-se na escola de línguas XPTO”. São muitos os exemplos de gafes monumentais do nosso mundo político quando fazem citações para armar em cultos, usando frases de notáveis, a maior parte das vezes fora do contexto, para evidenciar que leram um ou outro teórico, ou simplesmente repetindo expressões que andam por aí, e que nunca usariam se soubessem a sua origem. Recentemente, Aguiar Branco discursando pelo PSD, resolveu transformar a sessão solene das comemorações do 36º aniversário do 25 de Abril, num cómico stand up, citando uma frase de Lenine que podia ter sido escrita por um carteiro dos CTT ou um dirigente de clube de futebol da segunda circular. Satisfeito pelo efeito – gargalhadas da plateia – continuou o número, expelindo uma versão livre de um parecer da revolucionária polaca e fundadora do partido comunista alemão, Rosa Luxemburgo, sobre a liberdade; aqui, ele ou quem lhe escreveu a conversa, teve o cuidado de truncar a frase, pois a expressão completa dita por políticos tão pouco respeitadores da liberdade dos outros, pediria uma barra de sabão azul e branco para lavar a boca. Mas a situação mais bizantina a que assisti ultimamente, foi o novel ideólogo laranja Calvão da Silva, em declarações sobre a proposta de revisão constitucional do PSD, que pretende higienizar a lei fundamental retirando-lhe os marxismos das letras e da pontuação. Disse Calvão da Silva: “É preciso que o Estado seja mais justo e equitativo na distribuição da riqueza, não tratando todos por igual (…) e que se aplique o princípio, a cada um segundo as suas necessidades, de cada um segundo as suas possibilidades”. Calvão da Silva, professor universitário e presidente do Conselho de Jurisdição Nacional do PSD, devia saber que estava a citar Karl Marx, e logo a rematar um paleio argumentativo anti-marxista. E não é um Marx qualquer, uma frase encontrada nos perdidos e achados como a citação de Lenine feita por Aguiar Branco, mas um texto fundamental para os marxistas que é a “Crítica ao programa de Gotha”. Calvão da Silva podia ter recuperado o princípio de distribuição para uma sociedade de transição, mas resolveu defender o critério para uma sociedade socialista, aquele que Marx entendia que na “fase superior do comunismo” a “sociedade poderá inscrever nas suas bandeiras: De cada um segundo as suas capacidades, a cada um segundo as suas necessidades.”
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Para os nossos liberais um dia os cidadãos são desiguais entre si, para no outro serem iguais e desiguais ao mesmo tempo, tanto defendem os direitos sociais como a sua não universalização, já professam a satisfação das necessidades quando o socialismo sempre admitiu transitoriamente uma distribuição desigual, no fundo denotam uma grande ignorância sobre a base ideológica da sua família e o limite teórico das correntes políticas. Daí a confusão sobre o papel do Estado, do trabalho, dos factores de correcção social, da equidade ou do igualitarismo. Podiam começar por decidir se querem tratar de forma desigual os desiguais.
Eu ando a traduzir o conceito de que o trabalho é para ser feito segundo as capacidades de cada um; vivo num 2º andar sem elevador, já disse à minha mulher: - A próxima bilha de gás acartas tu que não quero que os vizinhos pensem que somos comunistas, ou pior, que lhes passe pela cabeça que somos do PSD.
segunda-feira, 27 de setembro de 2010
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Ahahahahahaha! Agora que eu queria ir dormir é que dei com o teu artigo. Já me tiraste o sono de tanto chorar a rir. Não perco mais nenhum texto teu.
ResponderEliminarMuito bom Carlos Mesquita. Para mim a maior ignorância é a daqueles que nem sabem aquilo que não sabem.
ResponderEliminarEstou totalmente de acordo.
ResponderEliminarÉ terrível a mediocridade a armar em sabedoria.
Cada um sabe o que sabe.
Perante atrocidades tão grandes quer à língua ,quer ao conhecimento, só apetece reagir con a ironia inteligente do Ricardo Araújo Pereira.
Parabéns pelo texto.
Carlos, o que me vale é que tu andas sempre com atenção a estas coisas, vais tomando nota e depois sais-te com estas pérolas! Eu cá já nem os oiço, confio em que tu lhes vás descobrindo as carecas e pondo-as ao leu...E quanto à bilha do gás, acho bem, ãssim distribuem as hérnias lá de casa...Beijos
ResponderEliminarMeus bons amigos e amigas, há 3 dias que não vinha ao Estrolabio. Estive a vindimar, uvas minhas em Chaves e dos meus sogros em Belmonte.
ResponderEliminarInfelizmente as caixas que trouxe (de mesa e viníferas) são poucas, não dá para dar, as avelãs também são poucas, não dá para dar, as amêndoas também são poucas, não dá para dar, as nozes vão ser poucas, não dá para dar.
Lá mais para o inverno vou ter muitos marmelos; se alguém quiser fazer marmelada...!?
És mas é um forreta! Marmelos, obrigada, eu não gosto. Verdadeiramente do que eu não gosto é da marmelada :)Mas a bilha do gás é a cereja no cimo do bolo. Escreve mais assim. É como diz a Clara: eu já nem os oiço. Bjs
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