Texto de João Machado e
fotografia de José Magalhães
Esta fotografia do José Magalhães (terá sido tirada no Douro? Já para além da barra?) prende a atenção e faz sonhar. Ocorre pensar no mar, mas no mar alto. Os barcos estão amarrados, mas o homem que se vê parece preparar-se para sair para a faina. Pus-me a contemplar e lembrei-me do Raul Brandão:
Luz e Cor
(De Os Pescadores, de Raul Brandão)
O mar às vezes parece um véu diáfano, outras pó verde. Às vezes é dum azul transparente, outras cobalto. Ou não tem consistência e é céu, ou é confusão e cólera. De manhã desvanece-se, de tarde sonha. E há dias de nevoeiro em que ele é extraordinário, quando a névoa espessa pouco a pouco se adelgaça e surge atrás da última cortina vaporosa, todo verde, dum verde que apetece respirar. Diferentes verdes bóiam na água, esbranquiçados, transparentes, escuros, quase negros, misturados com restos de onda que se desfaz e redemoinha até longe. E ainda outros azulados, com a cor das podridões. Tudo isto graduado e dependendo do céu, da hora e das marés. Há momentos em que me julgo metido dentro de uma esmeralda, e, depois, numa jóia esplêndida, dum azul único que se incendeia. Mas a luz morre, e a luz agonizando exala-se como um perfume. É uma grande flor que desfalece. O doirado não é simplesmente doirado, nem o verde simplesmente verde: possuem um alma delicada e extática.
Penso que este trecho do Raul Brandão nos põe a ver o mar. Permito-me, a seguir, e a propósito da contemplação do mar, dedicar ao pescador (e claro, ao José Magalhães), uns pobres versos:
Pescador que vais ao mar
Não te esqueças do teu lugar
Aqui, bem seguro, junto ao cais
Longe da agitação para onde vais
O mar é transparente e azul
Quanto mais te chegas ao sul
As ondas sobem e vais sonhar
Com ninfas que te vão abordar
Na tua rede já pesa o peixe
Em terra já há quem se queixe
E diz que o pescador faz falta
Antes que venha a maré alta.
sexta-feira, 24 de setembro de 2010
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