sexta-feira, 17 de setembro de 2010
Morte de Claude Chabrol
António Sales
A primeira vez que estive em Paris terá sido no ano de 1959. Naquela época andava envolvido até à raiz dos cabelos com os cineclubes, os suplementos literários da imprensa regional, e exercendo o meu papel nas coisas de cinema no jornal da minha terra, “Badaladas”, assim como nas revistas “Visor” e “Imagem”, desta última era director o José Ernesto de Sousa (1921-1988), que tinha à sua volta um conjunto de apoiantes, a que eu pertencia, que o estimularam a realizar o filme “Dom Roberto”, estreado no cinema Império perante o entusiasmo da malta nova. Era a “Nova Vaga” portuguesa.
Para mim foi o grande momento em que aprendi tudo quanto podia e dizia respeito à preparação e realização de filmes, a sua linguagem técnica e estética, o trabalho do argumentista, os scripts, o som, a montagem. Assim como tínhamos actores e realizadores de culto também tínhamos escritores como o Georges Sadoul e publicações, a revista “Cahiers du Cinema”, espécie de bíblia cinematográfica formadora de científicos leitores “filhos” dos seus críticos e articulistas, futuros cineastas da “Nouvelle Vague”, entre os quais Claude Chabrol.
Tudo isto acabou por exercer sobre a minha pessoa paixão intelectual pelo que decidi, nessa tal primeira passagem por Paris, servir-me do meu cartão de crítico de cinema da revista “Imagem” e apresentar-me nos estúdios de Billincourt, a Cinecittái italiana, para entrevistar o senhor Claude Chabrol que rodava o filme “A Double Tour” com a bela italiana Antunella Lualdi. Através do organismo oficial francês de cinema marquei dia e hora para o acontecimento que se deu logo pela manhã num encontro de simpatia comunicativa, capaz de desfazer o nervosismo de um jovem que se via perante um nome, a par de Trufault e Godard, o chefe de fila da “Nouvelle Vague”.
Recordo-me bem daquele homem de estatura média a deitar para o baixo, o rosto magro e afilado e uns óculos de grossos aros de massa que pareciam destacar uns olhos coruscantes. A seguir aos cumprimentos iniciais convidou-me a ir para o estúdio onde filmava e aí nos sentámos, naquelas cadeiras de lona, símbolo dos realizadores. E daí, entre instruções de filmagem e amena conversa decorreu a entrevista e a manhã.
Claude Chabrol nasceu em Paris em 24 de Junho de 1930 e faleceu recentemente na mesma cidade (11 de Setembro), com 80 anos, vítima de um ataque cardíaco. Foi inicialmente importante referência da chamada Nova Vaga francesa, saída dos “Cahiers di Cinemas, com os filmes “Le Beau Serge” (1958), “Les Cousins” (1959) “À Double Tour” (1959), “Les Bonnes Femmes”(1960) e outros que se seguiram na sua careira de produtor e realizador.
Os seus primeiros filmes são trabalhos livres das convenções a que estávamos habituados e representavam um tipo de cinema mais imaginativo e autêntico tanto da linguagem estética como na direcção de actores bem mais solta. Todavia, nesse mesmo ano de 1959 há dois nomes que se impõem verdadeiramente: Jean-Luc Godard com “A Boute de Soufle” e François Truffaut com “Os 400 Golpes”.
Chabrol, havia revelado uma forma notável de cinema em termos de montagem e direcção de actores acaba por cair num certo retrocesso que representa uma perca de inspiração, de espontaneidade e sinceridade em relação às suas primeiras obras em benefício da habilidade executiva. De qualquer modo Claude Chabrol marcou num certo período o cinema francês como o cinema europeu. Como nunca mais ouvimos falar dele (e dos outros e de novos) pudemos julgar que deixou de filmar o que é mentira.
Naquele tempo sabíamos dessa cinematografias porque víamos filmes franceses, italianos, suecos, ingleses e não apenas os hamburgers de celulóide que passaram a impingir-nos em quantidades industriais. Devido a tais indigestões até supomos que os europeus deixaram de fazer cinema por imposição da CIA ou do FBI. Talvez fosse tempo da EU pensar que a unidade, prestígio e economia também passam pelo cinema como no passado ficou provado sem termos bandeira azul com estrelinhas.
Subscrever:
Enviar feedback (Atom)
Os americanos invadiram de tal forma o mercado europeu, que as últimas gerações aprenderam a ver cinema com os filmes e séries americanas - e é toda uma gramática diferente, assente numa dinâmica narrativa a que os europeus, de uma forma geral, não aderiram. Disse John Malkovitch aqui em Portugal, não sei se no Festival de Tróia - "o cinema que se produz em Hollywood é como as putas, dá-nos aquilo de que estamos à espera; o cinema europeu é como uma amante sofisticada - surpreende-nos", mais ou menos isto. O pior é que a maior parte das pessoas já não tem paciência para a sofisticação europeia, planos demorados, frases que ficam em suspenso...». Chabrol foi uma das vítimas da invasão ianque, bem como outros excelentes realizadores franceses,ingleses, italianos, espanhóis e até portugueses, para os quais havia uma quota de mercado - Eu via filmes europeus e podia agora aqui desfiar um rosário de nomes de grande extensão. O que é grave é que me surpreendo a sentir impaciência perante os filmes europeus. E penso que isto acontece com muito boa gente.
ResponderEliminarPrimeiro que tudo: DOMAGE! Mas, agora, pergunto eu: porque é que essas metáforas têm sempre a ver com as mulheres? Gaita! Para não dizer um palavrão mais forte. Será que os homens, em termos de sexo, se continuam a achar sempre uma perfeição. Caramba, como nós, mulheres, sabemos que isso é mentira! Oh, nossos amigos intelectuais, por favor!
ResponderEliminarEu sei que foi o Malkovitch que disse, eu sei. Mas a citação não fazia cá falta nenhuma.
ResponderEliminarUps
ResponderEliminarSim, Senhora Dona Augusta Clara! E embora corra o risco de agravar a minha situação, informo vocelência que é dommage - c'est dommage! Com a pressa de me ralhar, vossa eminência cortou um emezinho. Vou pra dentro.
Exactamente, foi da raiva! Tenho mais respeito pelas putas do que por quem usa essas metáforas.
ResponderEliminarSe me chamas eminência, é que já não respondo por mim.
ResponderEliminarEu gosto é dos filmes europeus, com aquelas mulheres transparentes, lindas, ao contrário das mulheres grandes americanas,cheias de botox e sem feminilidade. E gosto dos realizadores europeus, que fazem filmes suaves,com imagens bonitas, sem violência.Ali no King passam lá.
ResponderEliminarLogo que veja o John Malkovich, dou-lhe o recado.
ResponderEliminarÉ, tens razão, Luís, as americanas são horríveis, cheias de botox, sem uma gota de feminilidade... olha a Scarlett Johansson, por exemplo.
ResponderEliminarAugusta, eu até queria vir aqui defender a nossa minoria e desancar no Malkovich e nas metáforas dele, e se fosse outro qualquer - o Clooney, por exemplo - eu até fazia isso mas tenho um fraquinho pelo Malkovich que não me deixa abrir a boca. E então a maneira como ele dizia "saudade" naquele filme do Manoel de Oliveira (O convento, acho eu)? Há que perdoar-lhe, Augusta, há que perdoar-lhe
ResponderEliminarE eu gostava muito do Malkovich e não o imaginava a dizer tamanha bestice. Espero que twnha sido bem assobiado.Mas, apesar de tudo, o cinema americano ainda tem bons filmes.Vi alguns da selecção do Público bastante bons.
ResponderEliminarEu vou-lhe perdoar, Carla, mas fiquei muito ressentida, precisamente por gostar tanto dele. Olha, Carla, mas anda aí um vampiro a fugir à responsabilidade de ter trazido essa citação para aqui
ResponderEliminarRepara só como é que esses dois aí atrás se tentam limpar: comparando as mulheres americanas com as europeias.Ainda têm a coragem de subestimar a nossa inteligência. Ainda por cima! Valha-me Deus!
ResponderEliminarQuando as mulheres são as melhores alunas, são em maior número na ciência,nas universidades, são as mães,já ninguem discute na base desse preconceito, Augusta. Inteligência têm para dar e sobrar, mas eu adoro mulheres, naquelas diferenças que nos distinguem.Oxalá sejamos sempre assim diferentes.( quanto a esse tal Malkovich, esse sim, é capaz de uma tirada daquelas, o gajo não vale nada...burrrrrr )
ResponderEliminarA Scarlett é tão diferente das americanas que até foi namorar para Tóquio com um homem mais velho ( o que prova a sua maturidade) e casou-se com um Canadiano.Só prova que não é apreciada nas américas. A mulher europeia é "mignonne", as cá debaixo do mediterrâneo e do centro, salta por cima das alemãs e depois continua na Hungria...(desculpem já estou a delirar...)
ResponderEliminarEh pá, continuem. Está giríssima, a discussão. Mas não se esqueçam do Chabrol. Eu lamento dizer que vi poucos filmes dele. Recordo-me de Landru e dos Sete Pecados Mortais (fez um episódio). Gostei bastante do que vi, na altura, já lá vão cerca de quarenta anos. O Chabrol fez sobretudo filmes policiais, no geral de bom nível ao que sei. Era admirador de Hitchcock, como aliás a maioria dos realizadores da chamada Nouvelle Vague. Foi actor, produtor, em suma, um homem do cinema. Obrigado ao Sales por este post, e pelos vossos comentários.
ResponderEliminarÓ Luís,eu, também, adoro homens - um de cada vez - quando valem a pena, mas não só pela beleza física. Mas o Malkovich já não o queria nem forrado de ouro.
ResponderEliminarEm defesa do John Malkovich, tenho a declarar que o termo usado por ele foi, salvo erro, "whore" ou "hooker"; eu é que traduzi pela palavra que me pareceu mais adequada. Mas a conversa, de facto, devia centrar-se no Chabrol. Devo dizer que, entre os realizadore franceses, preferia outros como Jean-Luc Godard, do "À bout de souffle", ou François Truffaut, dos "Les quatre cents coups", bem como o Alain Resnais (de Hiroshima, mon amour)
ResponderEliminare outros como o delicioso Jacques Tati. Os filmes de um realizador, acho que os entendidos o consideram menor, o André Cayatte, impressionavam-me muito - temas jurídicos "justice est faite" ou "nous sommes tous des assassins". Filmes fortes. Foi um grande cinema, o francês.
Foi um grande cinema, o francês e acrescento o italiano. Hoje, não há como esquecer o grande Kiarostami!
ResponderEliminarO Kiarostami não é o iraniano? É muito bom. Mas estávamos a falar do grande cinema europeu do século passado. os italianos, como dizes, eram excelentes. O Visconti, o Antonioni, o Sica, o Fellini, o Bertolucci, o Rossellini, etc, etc. E, olha, o Sergio Leone de que o mesquita ontem aqui falou, o dos western spaghetti - Aconteceu no Oeste...
ResponderEliminarEu não me lembro dos realizadores, lembro-me das mulheres luminosas, vi esses filmes todos mais do que uma vez, à primeira distraía-me com a história e não as via bem. A Binoche,a Huppert...uma coisa que nunca entenderei é como há homens que despertam o amor dessas mulheres.Italianas, a Laura Antoneli, a Gina...em Espanha a Penelope, ía-me dando uma coisa má quando a vi no primeiro filme com esse gajo do Jardem que a engravidou,desgraçado...em Portugal a Ana Padrão, a Ana Moreira, como é que um homem pode ser feliz...a leonor Silveira, "No Vale de Abraão" com os olhos a competirem com a luz do sol, já perguntei ao Manuel Oliveira como é que se filma aquela luz nos olhs de uma mulher (uma vez sentaram-me ao lado dele na Gulbenkian..)
ResponderEliminar..Vale Abraão...
ResponderEliminarFalei no Kiarostami por conta do que podemos de qualificar com bom cinema da actualidade, e fiquei aqui remoendo porque não falava do meu sobrinho Palma de Ouro, em Cannes com a curta: Arena. O João Salaviza não tem medo do tempo e aposta no tempo certo!
ResponderEliminardesculpem-me os erros! Aqui segue a errata:
ResponderEliminarFalei no Kiarostami por conta do que podemos qualificar como bom cinema da actualidade. Cinema português: fiquei aqui remoendo porque não falava do meu sobrinho Palma de Ouro, em Cannes com a curta: Arena. O João Salaviza não tem medo do tempo e aposta no tempo certo!
Augusta, tambem não me atraem as grandes "vampes" de grande beleza...
ResponderEliminarPara que o segmento feminino não passe em seco, vá uma de homens europeus que no cinema
ResponderEliminardesempenharam bem o seu "suspirante" papel masculino: Jean Paul Belmomdo, Jean-Louis Trintignant, Philippe Noiret, Eddie Contantine, Gerard Philippe, Jean Sorel, Renato Salvatore, Vittorio Gasman, Marcello Mastroianni, Alain Delon e o Burt Lancastre que só passou a ser um actor de referência depois de passar pelas mãos do Luchino Visconti
Filmes e realizadores, para mim, acima de todos os italianos, sobretudo Visconti, Rossellini e Bertolluci. O grego Theo Angelopoulos (?),o Lars von Trier.
ResponderEliminarActores: Marlon Brando, Paul Newman, Sean Penn...
Actrizes: Maryl Streep, Juliette Binoche, Uma Turman (aí está uma americana grandona que gosto de ver representar)...
E ninguém falou em "O gosto dos outros"
ResponderEliminarNão consigo lembrar-me se vi esse filme. Qual era o tema?
ResponderEliminarJá sei que não vi. Tenho que o encomendar. De facto, não falámos nada do cinema actual. Temos que voltar a esta conversa.
ResponderEliminar