terça-feira, 7 de setembro de 2010

Noctívagos, insones & afins: A síndrome de Estocolmo



Carlos Loures

Todos já ouviram falar desta patologia que, basicamente, consiste na disfunção psicológica que leva um sequestrado a identificar-se com o sequestrador. A designação deriva de um facto ocorrido em Estocolmo no ano de 1973 – durante um assalto a um banco, os reféns, sequestrados durante seis dias, mostraram-se, depois de libertos, solidários com os assaltantes mesmo durante o processo judicial. A solidariedade da vítima para com o seu captor nasce com pequenos gestos de urbanidade do sequestrador para com o sequestrado e cimenta-se durante o processo de libertação por parte das autoridades policiais, em que o sequestrado se identifica com o assaltante no receio de ser vitimado durante a luta.


Uma visão lúcida da realidade é difícil e as pequenas atenções dos bandidos transformam-se, na memória da vítima, em rasgos de bondade. Por outro lado, os sequestrados têm tendência em ser dóceis com os captores, procurando uma fuga a represálias. Uma estratégia de sobrevivência, digamos que dá lugar a uma bela amizade.

A evolução da síndrome é subconsciente, a vítima não tem consciência da progressão do trauma. Por outro lado, esta não afecta todas as vítimas em cativeiro, alguns defendem-se desenvolvendo um ódio, porventura exagerado (mas saudável), aos captores. A síndrome, de espectro abrangente, tipifica também o afecto que muitas mulheres vítimas de violência nutrem pelos maridos agressores.


Em grupos alargados, lugares e transportes públicos, ouve-se, desde que os governos são eleitos democraticamente em Portugal, protestos contra a forma como somos governados. Ninguém parece apoiar o partido que está no poder – fervem as anedotas, os boatos, as acusações… Foi sempre para mim um mistério como é que situações de descontentamento generalizado dão lugar a vitórias, por vezes rotundas, dos partidos que estão por detrás dos governos tão duramente criticados. Outro aspecto interessante da chamada psicologia de massas é, pessoas que votam em partidos de direita e que às vezes até se mostram saudosas da ditadura, quando os seus interesses pessoais são de alguma maneira afectados, invocarem «as conquistas de Abril».

Mas esta é uma questão anedótica e marginal. O mistério que gostava de ver esclarecido é como é que partidos que já se viu como governam continuarem a ter a maioria dos votos dos eleitores. Então surge uma explicação – a síndrome de Estocolmo – reféns do neo-liberalismo, nós os eleitores, cativos do círculo vicioso, ciclo e circo fantasioso, que faz alternar um dos dois partidos no poder – ganhámos afecto aos captores, somos seduzidos pelos pequenos gestos amáveis que travestem a violência de impostos e de medidas lesivas do nosso bem-estar.

Quando faço a pergunta directamente a votantes no PS ou no PSD, as pessoas encolhem os ombros e respondem - «é que os outros não dão garantias de poder governar». Talvez seja verdade. PCP e Bloco de Esquerda talvez até nem fossem capazes de governar e permanecer fiéis aos seus princípios. Talvez se «pragmatizassem». Porém, os dois compadres do bloco central deram já amplas garantias de não conseguirem governar na acepção nobre do termo. Porque «governar-se», perdoe-se-me o chulismo, eles conseguem sempre.

Sofremos colectivamente da síndrome de Estocolmo.

Só essa explicação pode justificar que continuemos a eleger e a confiar em quem faz de nós e dos nossos votos passadeira para satisfazer ambições pessoais, enriquecer o currículo e beneficiar interesses dos grandes empresários, ponte para negociatas obscuras…

Não, não somos nem masoquistas nem tão estúpidos como parecemos; estamos é afectados pela síndrome de Estocolmo.

Isto explica tudo, não acham?.

1 comentário:

  1. Eu o que acho é que nascem e morrem partidos em todo o lado e aqui não há reordenamentos partidários. Isso é que eu não percebo. É como a comunicação social, lá fora compramos um jornal e sabemos se é de esquerda ou de direita, aqui é rigorodamento isento!

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