Marcos Cruz
Hoje vou às palavras. Vou ver se estão boas, se estão fresquinhas, se vale a pena trazê-las e quantas. Gosto mais das palavras soltas, o problema é que as não há, ou então estão mortas, cortadas, mutiladas, como as flores que vemos deitadas na rua, à mercê de solas e rodas. As palavras também têm raiz, todas elas, e é uma pena arrancá-la, em qualquer caso, mas ainda assim prefiro fazê-lo a comprar palavras no mercado, arranjadas e metidas em bouquets para impressionar quem passa. O negócio das palavras, aliás, entristece-me, pelo amor que lhes tenho. Gostava de as ver crescer naturalmente, de as regar, de cantar para elas e com elas, de apreciar a forma como se desenvolvem e ganham novas cores, novos cheiros, novas texturas, novos sabores. Gostava de me perder num campo infinito delas, de fechar os olhos e de as ler nesse estado virginal, de as deixar ensinar-me a lê-las, de me ler nelas. As que mais encontro, porém, perderam a leitura, perderam até o leite, não se reproduzem, não se multiplicam, não se renovam, apenas se repetem, como cromos que se trocam por outros num mercado único, que nos quer ver a todos com a mesma caderneta. Mas depois há o amor, o sensor da surpresa, do desconhecido, o raio mágico que desperta com a palavra nova, solta, sem casa, e num instante cobre tudo o resto de sentido. É por ele que eu continuo a ir às palavras. Hoje trouxe estas. Pega, são para ti.
sábado, 25 de setembro de 2010
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Marcos, as palavras, na forma como as encadeias, nunca se repetem.
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