domingo, 24 de outubro de 2010

Senhores Singulares -( O romance da revelação do Brasil)- 13 - por Sílvio Castr

(Continuação)

Lenda de adugo, o jaguar


Num dia quente de grande sol, Tainá me disse sabe? para mim você é adugo.



Tinha uma vez no tempo mais antigo dos tempos um índio que caminhava na floresta na procura de uma boa gameleira. Queria tirar muito leite dela para com ele amolecer o urucu que lhe serviria para as festas que suas gentes faziam naqueles dias. Ele caminhava e sonhava as cores mais belas para enfeitar-se. Estava finalmente recolhendo o leite da gameleira quando foi atacado por uma onça enorme. Grande e longa foi a luta entre eles, por todo o dia, desde as primeiras luzes do amanhecer até aquele momento em que o sol começa a cair por detrás dos montes e colinas. O guerreiro se sentia já sem forças e então disse adugo, adugo, deixa-me livre, já não posso mais. Está bem, te deixo livre, mas deves prometer que me darás tua filha por mulher. O guerreiro exausto e vencido prometeu assim fazer. Tendo recebido a promessa, adugo disse ao futuro sogro deves dizer a tua filha que moro nesta floresta, mas muito longe, na última caverna. Quando ela para lá for, primeiro vai encontrar o buraco da irara, preta ao longo do corpo, mas branca no peito, e de focinho cinzento; logo depois será a vez do gato do mato, aimeareu, de listas pretas transversais; depois dele, ela vai se embater na jaguaterica, de pele manchada de escuro; estará quase chegando à última caverna, onde eu moro, mas antes encontrará aigo, a onça parda e muitos mais.

O homem vencido voltou para a sua taba e tudo contou à filha. Então a bela rapariga partiu para dar-se em esposa a adugo. Entrou na floresta e depois de muito caminhar encontrou a dona do mel, a irara, que lhe perguntou onde vais, bela rapariga? vou a procura de adugo sou eu e ainda que comece a escurecer, como bem podes ver as minhas patas e minhas costas são pretas. Depois de assim dizer levou-a para a caverna e ali passaram a noite. Ao amanhecer a irara disse à jovem agora ficas aqui à minha espera enquanto eu vou caçar. Então a bela jovem poude vê-lo bem e saber que não era adugo. E fugiu para dentro da floresta, quando mais adiante e já se fizera quase noite, encontrou aimeareu, o gato do mato, este lhe perguntou onde vais? vou ao encontro de adugo para com ele me casar ah! mas não vês? sou eu adugo não enxergas as minhas garras agudas a minha cara e meu pelo? Já que era então noite fechada ela não podia dizer que tudo era mentira e foi com aimeareu para a sua caverna e ali passaram a noite. Agora que é dia ficas aqui vou procurar comida para nós e volto logo. Mas a moça não esperou porque reconhecera a mentira. Então ela se pôs a caminhar a caminhar sempre a caminhar pela floresta quando de novo chegou a noite e ela encontrou okwa e com ele passou a noite, mas no dia seguinte dele fugiu, vendo-lhe o rabo fino. E assim também aconteceu na noite seguinte quando urie saiu da caverna para caçar e ela viu as suas patas negras, de novo escapou para a floresta. Cansada, a bela rapariga já não sabia como encontrar adugo; entreviu aipobureu e ainda uma vez aconteceu a mesma coisa e depois se confrontou na noite escura com a onça parda, aigo. Onde vais? vou casar com adugo bem! sou adugo podes vir para a minha caverna que ali está. Assim foi, mas chegada a manhã ela viu que aquele não era adugo o seu prometido. Fugiu correu, caminhou caminhou, quando de repente depois da viagem longa encontrou adugo onde vais? vou à procura de adugo para ser sua mulher eu sou adugo. Ela reconheceu que era adugo mesmo e se casaram.

Você, Afonso, para mim é adugo.


Conto de Afonso para Tainá

Tainá me pediu umas estórias da minha terra. Então eu lhe contei.

Tinha uma vez um homem muito poderoso, senhor de castelos, terras, amado de sua gente, casado com a mulher mais bonita jamais ali vista, pai de três esplendentes filhas, mas era um homem sempre triste.

Mesmo quando recebia os mais belos presentes, ele sorria, é verdade, mas era um sorriso quase morto nos lábios grossos. Sua mulher, que se chamava Manuela, vendo-o assim triste, os olhos perdidos nos longes, o acariciava, passando-lhe toda a doçura de suas mãos, de seus abraços, de sua infinita ternura, mas ele somente sabia responder-lhe com um distante sorriso feito de insatifações

tu não me amas; Gonçalo, tu não mais me amas, por que?

por que?

por que?

… … que?

sim, uma vez

me amavas

se tu não mais me amas, como faremos a viver

perdidas são as

alegrias

O triste Gonçalo fugia na solidão de seu castelo onde está Gonçalo?

Um dia houve uma grande festa no castelo do triste Gonçalo em homenagem a um senhor vindo de longe e que tinha consigo sua filha Teresa

Tu és Teresa a mais bela entre as mulheres

se me queres, me deves seguir para a minha terra que fica muito longe daqui, entre as montanhas e o mar

O triste Gonçalo agora novamente alegre e feliz ria e ria de alegria seguindo Teresa entre o mar e as montanhas

aqui estou,Teresa, deixei tudo por ti

meus castelos, minha casa, minha mulher que tanto me amava, minhas lindas filhas

agora deves ser minha como me prometeste faz tanto tempo

não ainda, meu querido, porque és sempre o triste Gonçalo

Gonçalo implorava o amor de Teresa e quanto mais ela se negava, tanto mais ele entristecia

se entristecia

se entristecia

Muitos anos se passaram e Gonçalo não conseguia demover Teresa

quanto tempo!

quanto tempo!

quanto tempo!

Gonçalo caminhava sem saber para onde voltava, até que chegou diante de um castelo que lhe parecia como uma casa sempre conhecida

Gonçalo! Gonçalo!

A mulher de Gonçalo o abraçou recobriu de carícias os cabelos muito brancos, brancos brancos como se houvessem colhido toda a neve caída em longos anos de ausência.

Gonçalo sentia a doçura amorosa das mãos de sua mulher

e então em meio a uma névoa de lembranças sorriu alegremente fixando aqueles doces olhos reencontrados.


(Continua)

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