sexta-feira, 15 de outubro de 2010

A Situação Internacional. Interrogações.

João Machado

Qual o alinhamento de forças no mundo após a queda do Muro de Berlim e o ataque às Torres Gémeas? Qual o papel da defesa dos direitos humanos? Aonde chegará a  China nos próximos anos? Não será o equilíbrio das contas públicas um novo actor na cena internacional?


Após a queda do Muro de Berlim e o colapso da União Soviética os Estados Unidos ficaram na cena internacional como a única superpotência mundial. Ciosos do seu papel, têm procurado junto da opinião pública justificar a manutenção desse estatuto, apresentando-se como os campeões da defesa da democracia e dos direitos humanos. Têm sido ajudados consideravelmente nesse papel pelas grandes limitações nessas matérias existentes na muitos países, incluindo nalguns que aparecem a fazer-lhes oposição, como é o caso daqueles em que predomina a religião islâmica. Mesmo tendo em conta que existem grandes deturpações causadas pela parcialidade na informação sobre a vida nos vários países, conforme a sua posição em relação ao Ocidente (atente-se nas diferenças no modo como se apresenta à opinião pública a situação no Egipto ou em Marrocos, por um lado, e no Irão por outro), esse tem sido um trunfo que tem sido usado com êxito junto da opinião pública. O ataque às Torres Gémeas de Nova Iorque (não vamos neste momento levar em conta as teorias que têm sido formuladas sobre este acontecimento) e a eleição de Barack Obama reforçaram, de modos diferentes, o êxito da propaganda norte-americana.

A defesa dos direitos humanos é a pedra de toque de uma civilização. Um dos seus aspectos fundamentais é com certeza a defesa dos direitos das mulheres. No Monde Diplomatique de Setembro último, Serge Halimi, no seu editorial Fotografias sem Luzes, refere-nos o caso de Bibi Aisha, mulher afegã mutilada eventualmente pelos talibãs (há informações de que o autor do crime terá sido o sogro), que foi capa da Time Magazine, com o título O que vai acontecer se abandonarmos o Afeganistão? Halimi refere também o caso de Sakineh Mohammad-Astiani, iraniana chicoteada por adultério. Analisa o peso e o significado destes símbolos, e sublinha a evidência de que a presença dos exércitos ocidentais no Afeganistão não impediu a mutilação de Bibi Aisha. Acaba lembrando que os talibãs também terão fotografias de civis mutilados ou mortos pelos mísseis ocidentais, que a Time Magazine também há de publicar. Pergunta se uma dessas fotografias será capa da revista, e qual a legenda.

Notória é a pouco simpatia que tem merecido aos americanos a ascensão do BRIC (Brasil, Rússia, Índia e China) na cena internacional. Estas potências têm procurado, de um modo não muito evidente, criar uma alternativa na cena internacional, construindo relações que não são à partida abençoadas por Washington. Lula, nos últimos tempos da sua presidência distinguiu-se nesse campo, mostrando uma grande capacidade diplomática e a ascensão do Brasil nos últimos anos. Mas, deste grupo de nações, sobressai sem dúvida a China.

Neste momento não nos vamos debruçar sobre os problemas internos da China, nem sobre o caso do Prémio Nobel da Paz, Liu Xiaobo. Vamos apontar apenas um aspecto, num campo que tem estado na primeira linha, o campo financeiro.  É sabido que a China tem vindo a fazer grandes investimentos no estrangeiro, inclusive comprando dívida pública de outros países, incluindo Portugal. Actualmente parece que um quinto da dívida pública norte-americana está nas suas mãos. Num debate recente em Seul com Paul Krugman (ver The Guardian, do dia 14 de Outubro corrente), o economista Niall Ferguson, que é de opinião que a situação das finanças públicas dos Estados Unidos é pior que a da Grécia, afirmou que em breve se verão forçados a fazer cortes na defesa para minorarem a seu défice. Por um lado, é caso para dizermos que temos outro actor na cena internacional, o défice orçamental. Por outro, é de pôr a interrogação de até onde conseguirá a China ir, no plano internacional?

4 comentários:

  1. Faz bem o João Machado em trazer estas interrogações. Em minha opinião devíamos deixar as ferramentas da geo-estratégia política tradicional para olhar o mundo. Será mais importante saber onde se vai dar o próximo colapso financeiro que onde vai rebentar uma guerra. Um conflito armado pode ou não ter reflexos mundiais, uma catástrofe económica no Japão, por exemplo, fará vítimas globais; e é no Japão que se desenha o maior problema, camparativamente, a Grécia é uma brincadeira. A China tem crescido através das exportações, promovidas pela desvalorização artificial da "moeda do povo", numa guerra comercial que apesar de ajudar a manter a inflação baixa nos países ricos lhes está a destruir a economia, o maior problema americano é o deficit comercial, fecham industrias como a do aço. Para os EU, com o dólar imune aos ataques dos mercados, o deficit orçamental e a divida, sendo problemas têm tempo de ser resolvidos; as opções de Obama são opostas das europeias, vai traçar o país de auto-estradas.
    Neste mundo em que tudo é grandioso, uma pequena economia como a nossa é essencialmente vítima da sobrevalorização do Euro, que convém à Alemanha e aos países do norte da Europa. Nós vamos ter mais problemas, mas não acredito em milagres chineses, para eles as verdadeiras dificuldades ainda não começaram. O mundo vai ser muito diferente do que conhecemos, ainda vai piorar antes de se tomarem medidas para estabelecer equilíbrios.

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  2. António Gomes Marques16 de outubro de 2010 às 12:56

    Oh, João, a China, com o desenvolvimento do PIB que tem, tornar-se-á uma potência económica que poderá vir a suplantar os EUA, mas, mesmo que isto venha a acontecer, não podemos deixar de referir que tal desenvolvimento assenta, em grande parte, no trabalho escravo a que o povo está sujeito. É com grande mágoa que escrevo isto, admirador que sou da cultura chinesa.
    Os EUA não deixam de sabotar Cuba, não olhando a meios, mas encolhem-se em relação à China pelo poder económico que este país já tem e pelo grande mercado que constitui e constituirá para os seus produtos.
    Há. no entanto, outras notícias que nos vão chegando da China, apesar da censura feroz, que não respeitam ao Prémio Nobel (a posição do «nosso» PCP sobre esta matéria é ignóbil, com mágoa o digo!), e que têm a ver com a reivindicação dos próprios chineses, do povo chinês, para os direitos humanos, para o direito à reforma, para o direito à assistência médica e medicamentosa, etc, etc., reivindicações estas que têm estado na origem de várias greves, cruelmente reprimidas. Mas o Governo Chinês têm muito dinheiro, compra a nossa dívida e a dívida dos EUA e de outros países da Europa para que a «calma» ocidental não sofra alterações e todos continuemos a viver no «melhor dos mundos». Viva a actual China!

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  3. Obrigado, amigos,pelos vossos comentários. A China, só por ela, merece muitos posts nossos. Os avanços e recuos do capitalismo, incluindo do capitalismo trazem sempre grandes catástrofes. Temos que nos debruçar sobre o assunto.

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  4. Havemos de voltar à China e ao PIB que não é bem assim, e o PIB per capita então...

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