A rebelião dos jovens estudantes conimbrenses de 1865, guiados pelo gênio de Antero de Quental, é um marco da modernidade portuguesa que supera os limites de um tradicionalismo prepotente e que, em politica, denuncia a decadência da revolução liberal e anuncia aquela socialista.
Não se trata tão somente de uma reação de jovens poetas e literatos estudantes da mais importante das Universidades portuguesas contra Antonio Feliciano de Castilho e o seu reconhecido poder político-cultural, mas como proclamação epocal.
Em estreita correlação com a ação de rebelião aos radicalismos institucionais e didáticos da Universidade, os ativistas de 65 se exprimem igualmente contra a predominância do espírito burguês sentida nas expressões sócio-cultural e política de Portugal. Ainda que imbuídos de um inicial, mas evidente espírito positivista, os rebeldes de Coimbra são igualmente herdeiros do espírito romântico mais revolucionário. Mesmo sendo o positivismo nascente uma tendência à afirmação da burguesia na complexa divisão das classes sociais, isto não impedia aos aos jovens revolucionários conimbrenses de proclamarem dialeticamente uma atitude anti-burguesa no quadro da realidade nacional. Atitude de profunda natureza cultural que propunha principalmente uma nova moral para os comportamentos individuais. A nova moral se confrontava e negava os valores convencionais da ainda limitada, mas potente burguesia emergente, valores que abrangiam um largo espaço, da economia, à política, à religião.
Outro fator que determina a Questão coimbrã se refere à problemática do dito “gosto burguês“, do gosto convencional. Naturalmente a ação de natureza cultural que guia os jovens de 65 transforma a contestação de ordem moral, para aquela outra estético-cultural do “gosto” em geral.
Neste exato ponto se ajusta a ação direta contra a personalidade e o poder político-cultural de Castilho. A Questão nasce diretamente de dois polos: o primeiro é a apresentação que Antonio Feliciano de Castilho faz para as poesias de Pinheiro Chagas do volume Poema da Mocidade, apresentado pelo lider conservador como a máxima voz da moderna poesia portuguesa a opor-se contra os desvarios de jovens poetas, como Antero de Quental; o segundo polo é o famoso panfleto de Quental, Bom Senso e Bom Gosto, Carta ao Ex.mo Sr. Antonio Feliciano de Castilho. Nele Antero de Quental proclama a sua incontida indignação:
“V. Ex.a fez-se chefe desta cruzada tão desgraçada e tão mesquinha. Não
posso senão dar-lhe os pêsames por tão triste papel. Mas se eu, como homem, desprezo e esqueço, como escritor é que não posso calar-me; porque atacar a independência do pensamento, a liberdade os espíritos, é não só ofender o que há de mais santo nos indivíduos, mas é ainda levantar mão roubadora contra o património sagrado da humanidade – o futuro.“
Começava assim um novo tempo não só para a literatura portuguesa, mas igualmente para a cultura política do País, novo tempo culminado em 1910 com a proclamação da República que teria como seu primeiro Presidente provisório um dos mais focosos rebeldes de 1865, Teófilo Braga.
Belo relato de uma época tão fecunda.
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