quinta-feira, 16 de dezembro de 2010

Carta aberta ao Presidente da República

Coimbra, 15 de Dezembro de 2010


Ex.mo Senhor Presidente da República


Com conhecimento: ao Primeiro-Ministro, ao Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior e aos líderes parlamentares.


Senhor Presidente, tomo a liberdade de lhe escrever esta carta porque, enquanto professor e cidadão, estou altamente preocupado com a erosão do tecido social em Portugal, e na Europa também, fruto não só da terrível situação de crise dita financeira pela qual estamos a passar e que é, sobretudo, o resultado do modelo económico, social e político que lhe está subjacente e preocupado igualmente estou, e muito, com a situação de crise que atravessa a Universidade em Portugal, fruto sobretudo de políticas anteriormente seguidas, fruto sobretudo da reforma de Bolonha, fruto portanto do mesmo modelo de referência que nos levou à situação actual. Uma Universidade em profunda crise e tão grande, na minha opinião, que não posso deixar de colocar aqui e de deixar à sua apreciação as razões do meu descontentamento.


Senhor Presidente, a crise da dívida soberana portuguesa amainou, o espectáculo oferecido pelos políticos dos dois maiores partidos, esse transitoriamente ao mesmo nível ficou, nos grandes bancos o nosso dinheiro, esse se embolsou, e o povo, esse continua a não perceber o que ninguém nunca lhe explicou: porque está a sofrer cada vez mais, a pagar cada vez mais e a dever cada mais e em nome de quê ou porquê? Que terá ele feito de mal para sofrer esta violência, agora? Num mundo e numa sociedade onde impere a honestidade, a justiça, a transparência, numa sociedade de profunda raiz democrática portanto, cada um deve ser responsável pelos seus erros e deve saber assumi-los; mas então que alguém lhes diga, a eles e a nós também, senhor Presidente, quais os erros que cada trabalhador desempregado neste sistema cometeu para que agora se deva sentir penalizado, quais os erros que levam a que cada criança com fome nele e dele se possa sentir culpada, quais os erros que cada velho que passou a vida a trabalhar duramente deles se possa sentir responsável para que veja os seus direitos de há muito tempo adquiridos agora fortemente anulados? Que haja alguém que lhes explique, pelo menos a eles, aos desempregados, às crianças com fome e com pobreza garantida como futuro, aos velhos que do passado foram bem enganados, para onde foram os vários milhares de milhões de euros que do bolso de cada um deles e de todos eles foram retirados para no BPN serem aplicados sem que nada tenha sido tocado na Sociedade Lusa de Negócios nem em ninguém que deles muito antes os delapidou e então, aqui, foi a favor de quem? Ninguém, nunca ninguém lhes disse nada, senhor Presidente, e todos nós lamentamos que assim tenha sido.



Um economista moderado, Thomas Piketty, a lembrar um outro intelectual importante dos tempos de Marx, Proudhon, num recente artigo sobre o salvamento da Irlanda, sobre o resgate dos bancos irlandeses, chama a tudo isto um nome. Passo a citar: “Digamo-lo claramente. Deixar que países que se enriqueceram graças ao comércio intra-europeu absorvam em seguida a base fiscal dos seus vizinhos, isto não tem rigorosamente nada a ver com os princípios da economia de mercado ou com o liberalismo. Isto só tem um nome e chama-se: roubo. E ir emprestar dinheiro às pessoas que nos roubaram, sem nada exigir em troca para que isso não se reproduza, a isto chama-se estupidez”.


Senhor Presidente, no país em que o senhor é Presidente, como em toda a Europa aliás, porque a massa da classe política actualmente no poder é toda ela a mesma ao nível das atitudes e dos princípios, é assim que genericamente as pessoas se sentem, isto é, sentem-se materialmente roubadas e intelectualmente de estúpidas consideradas. Um dos muitos exemplos possíveis, vemo-lo agora na Irlanda com o banco Anglo Irish Bank em que, falido, nacionalizado, pelo contribuinte a ser financiado, vem agora declarar que vai dar de bónus este ano 400 milhões de euros. E que responde o Governo de lá? Que vai sobretaxar os bónus do ano que vem! Um outro exemplo vemo-lo aqui e agora, em Portugal, como noutros países e por outros governos socialistas chamados, a permitir-se a antecipação de dividendos para evitar o pagamento de impostos que seriam exigidos para o ano, ou ainda o regime de favor que se criou aos grandes grupos financeiros com a isenção fiscal sobre as mais-valias ganhas com a venda da Vivo pela PT, tudo isto acompanhado por um discurso a nunca esquecer proferido recentemente na nossa Assembleia da República em nome dos grandes accionistas, pelo líder do maior grupo parlamentar, a outros tempos nos fazer lembrados. A lógica é a mesma, o comportamento é o mesmo, e já não é uma questão da direita ou da esquerda que está no poder. Recuando um pouco, na Islândia, enquanto se deixava, como agora na Irlanda, que as grandes fortunas escapassem, defendendo-se a liberdade absoluta dos movimentos de capitais, o governo pedia à Igreja que mantivesse as portas abertas mais tempo, para que as pessoas pudessem pedir auxílio a Deus, chorar, rezar! A lógica é a mesma, o comportamento é o mesmo, e já não é uma questão da direita ou da esquerda que está no poder, é uma questão de quem actualmente está no poder; é, sendo assim, uma crise de valores, uma crise profunda do sistema democrático que está em movimento. Movimento para onde? Lamentável imagem que se dá da democracia. Sobre isso vale a pena lembrar Helmut Schmidt na sua recente entrevista sobre a crise europeia: “Posso dizer que, de uma maneira geral, à Europa faltam dirigentes. Faltam personalidades, à frente dos Estados nacionais ou nas Instituições europeias, que tenham um conhecimento suficiente das questões nacionais e internacionais e que façam prova de uma capacidade de julgamento adequada”.


Senhor Presidente, a crise da dívida soberana portuguesa amainou, o espectáculo oferecido pelos políticos dos dois maiores partidos, esse transitoriamente ao mesmo nível ficou, mas o nosso país, o país de todos nós e que todos nós fazemos, os que trabalham, esse, não parou, nem a roda dentada da História, assim o considerou. Como nos lembra Alice no País das Maravilhas, vai-se sempre para qualquer lado mesmo que para nenhum lado se queira ir. Mas creio, profundamente creio, que eu e que todos nós sabemos que por este caminho que nos estão a impor, o lado nenhum para onde nos estão a empurrar é um verdadeiro desastre nacional onde vai imperar o desemprego e a miséria, senão também a fome e a desestruturação da sociedade portuguesa também.


Senhor Presidente, antes de estalar a crise, dita financeira, esteve toda a Europa sujeita a um tsunami silencioso mas, por definição, poderoso, que é a lógica implacável do neoliberalismo imposta pela classe política no poder e em nome da modernidade. Foram as instituições que durante trinta gloriosos anos animaram o crescimento económico e que eram a base do Estado-Providência que têm sido uma a uma minadas, descaracterizadas, quer ao nível do trabalho, da saúde, da educação, da segurança social, quer da visão global de sociedade e do seu futuro. Foi esse trabalho profundo e subterrâneo que agora nos torna vítima da voragem que os políticos no poder e os grandes financeiros nos querem impor e de que até agora temos sido incapazes, todos nós, de lhes resistirmos e de nos sabermos deles defender.


Senhor Presidente, neste tsunami silencioso que vem de longe, de muito longe como diz o poeta/cantor, nesse tsunami silencioso inscreve-se a reforma de Bolonha do ensino superior, em que com ela, e na minha opinião, a Universidade está lenta mas implacavelmente a ser destruída. Com esta reforma, passámos a considerar as Universidades como o espaço onde não se pode ensinar pouco mais que generalidades e não creio honestamente, por maior que seja o esforço, que neste momento se possa passar para além disso. Onde deixa de haver capacidade de pensar, não pode haver, logicamente, capacidade de se ensinar. Com esta reforma, aí temos a Universidade a transformar-se num deserto de ideias, onde o acto de pensar, reflectir, criticar, argumentar, reconstruir, parece arredado na formação universitária dos jovens; se assim é, ensinar, no verdadeiro sentido da palavra, é agora apenas uma possibilidade virtual. O que desta reforma nos fica é a certeza de que se quer que o ensino represente menos despesas públicas no orçamento do Estado, sacrificando-se com isso a nossa juventude, os nossos filhos e os nossos netos, no altar da redução do défice público. É assim uma luta contra o tempo, é a luta pela compressão do estudo ao tempo mínimo e ao custo mínimo, como se valha mais ter um jovem deficientemente formado e na rua à procura de emprego do que um jovem de profundos conhecimentos capacitado na mesma situação, pois aquele representa um menor desperdício financeiro. Com a reforma de Bolonha, permitiu-se que se generalizasse uma forma de “ensino” mais leve para quem ensina e tem muitas outras ocupações mais rentáveis, mais leve para quem não quer entender que um professor tem a difícil função de apoiar os estudantes na descoberta do mundo que lhes é dado, do mundo que lhes cabe a eles refazer, tem a difícil função de os apoiar a ganharem novas formas de estar e de enfrentar o mundo hostil que lhes estamos a criar, tem a difícil função de estar intelectualmente disponível para os ajudar a que cresçam num profundo espaço de cidadania, a Universidade que desejamos, como cidadãos e como técnicos. Em suma, apoiá-los no seu desejo de transformar o mundo de modo a que a vida lhes confira sentido e, com este, sejam eles a conferir sentido ao mundo que conscientemente desorganizámos! Em vez disto, o que está a ser feito, no reino da facilidade com o processo de Bolonha já instalado, é tornar a vida muito mais leve para aqueles que não ensinamos e não ensinamos agora nem a ler ou a escrever bem nem, muito menos, a estudar bem. Isto é enganá-los, é dar-lhes uma forma de estar na vida pessoal e profissional que esta não comporta. Fornecedora de diplomas de não empregabilidade é o que a Universidade se apresta agora a ser, com o nível de licenciatura, o primeiro ciclo, que fornece.


Passemos um grau acima, passemos aos mestrados. Segundo sinais dos mercados quanto a empregos, e estes sinais valem o que valem, a preferência está a ir para os detentores destes diplomas, a começar pela Assembleia da República. A ser assim, isto significa, com o silêncio e os medos que se estão a abater sobre a sociedade portuguesa, o reconhecimento indirecto mas claro de que as licenciaturas pouco ou nada valem. Simplesmente, sejamos todos honestos. Se não produzimos licenciaturas de qualidade também não poderemos, de modo nenhum, ser capazes de fornecer mestrados de qualidade, porque só se ensina o que os outros são capazes de aprender, e estes, os nossos estudantes, já deixaram de saber o que é profundidade de ensino. Para o fazermos, seria então necessário muito trabalho para contrariar e vencer a redução de capacidades de que a Universidade foi entretanto o produtor exclusivo! A minha ideia e a daqueles que a vão dizendo em surdina é a de que simplesmente muitos dos mestrados estarão a ter um nível inferior ao da própria licenciatura. Não passa de uma ideia, de uma opinião, mas é opinião de quem tem estado desde há muito tempo no terreno, mesmo que esta opinião seja no papel contestada por alguns daqueles que fazem a ciência nos nossos dias e ignorada pela maioria de todos os outros.


A revolução francesa deu-nos uma trilogia: liberdade, fraternidade e igualdade, só conjugáveis duas a duas, o neoliberalismo deu-nos a dualidade, to be or not to be, to have or not to have, e Bolonha, uma reforma organizada no interior do modelo neoliberal, na sua expressão mais forte e mais dura, aplicada à Universidade, leva-nos a uma outra trilogia: to be or not to be, to know or not to know e então to have or not to have. Mas aqui já não se conjugam duas a duas! Vou porém mais longe, quanto ao to know or no to know. Se a dualidade existe, se se verifica esta oposição binária, então garantidamente esta deve-se mais à formação de origem dos nossos alunos do que à qualidade de ensino que as estruturas de Bolonha levaram a ser ensinado, porque com estas estruturas nem elites capazes são possíveis de ser formadas no reino da facilidade agora instalado. Em lado nenhum do mundo as elites podem ser criadas assim e não será agora aqui, com certeza, que se iria operar o milagre. Não o creio. Mas então a pergunta: para que serve esta Universidade? Assim, como a vejo, só lhe vejo um sentido e um muito mau sentido: o de fazer a diferenciação no elevador social pelos diplomas, e a diferenciação nestes pelo dinheiro que se possa ter à partida, ou seja, à nascença. Da licenciatura ao mestrado do mestrado ao doutoramento serão anos a mais e muito mais dinheiro a gastar para exibir esse ticket de modo a poder subir uns andares a mais no referido elevador social que aliás bem mostras tem dado, desde há muito tempo, de estar avariado. Se isto é assim, o que reflecte esta situação? Ou, por outras palavras, o silêncio sobre a sua existência o que representa? A comodidade do nosso silêncio talvez, mas esta deve ser transformada na incomodidade das nossas recusas.


Hoje será a última aula teórica que dou como professor da disciplina de Economia Internacional, na licenciatura em Economia. Vou aposentar-me e não voltarei mais a leccionar estas matérias. Como o disse num outro contexto, saio por opção antes do final do meu contrato, já com anos de trabalho gratuitamente oferecidos ao meu país, saio vencido pela incapacidade de aceitar o que se está a fazer da Universidade e de nem sequer compreender os objectivos de missão que agora lhe estão subjacentes. Sempre me recusei a conviver com o regime de simplificação e de mentalidade que lentamente Bolonha instalou nas nossas vidas e nas nossas próprias subjectividades e não queria deixar esta disciplina sem o sinal de protesto que se me exige como professor, como cidadão, como pai e como avô. Faço-o solicitando que se procure perceber bem o que se passa no nosso ensino superior, faço-o apelando para se que encontrem respostas para os graves problemas da juventude de hoje, e que não seja esta a geração perdida de depois de amanhã, como o assinala a OCDE e o FMI, faço-o para que honestamente se questione que tipo de Universidade é que o país precisa.


Escrevo em má altura, numa altura de fanfarra pelos dados da OCDE, na base de inquéritos feitos em escolas, mas faço-o nesta mesma altura em que é evidente que a maioria dos filhos intelectuais de Sócrates e de Maria de Lurdes Rodrigues que entraram nas Universidades com altas notas a matemática, há três anos, mostram uma pobreza intelectual aflitiva. Dada a identificação pretendida, quer pelo Governo quer pela OCDE, dos resultados de PISA com a política de educação do actual primeiro-ministro, seria de esperar que os alunos que há três anos chegaram às Universidades reflectissem a mesma política de ensino. Mas a ser assim, das três uma: ou a selecção das escolas deformou os resultados, ou os alunos bons foram não sei sequer para onde, pois para as engenharias também não foram, a fazer fé no jornal O Público, que nos diz que uma parcela significativa dos estudantes do IST não faz operações algébricas simples, e nas outras Faculdades ninguém os vê, ou a maioria dos “beneficiados” desta política nunca conseguiram chegar à Universidade a não ser que venham a entrar depois de atingirem 23 anos, e isto mais uma vez de acordo com o espírito de Bolonha e de acordo com legislação aprovada pelo ministro da tutela, Mariano Gago. Independentemente dos resultados e das leituras que sobre estes têm sido feitas, o que se vai vendo, ouvindo e sentindo, é que os alunos de hoje, 2010, não são melhores que os dos anos transactos, dispõem de menos conhecimentos e de uma menor capacidade de aprendizagem, mas vontade de aprender, essa, ainda a têm. Dê-se-lhes tempo e meios e muitos deles poderão ainda vir a ser os técnicos a que socialmente aspiramos. Não os defraudemos, portanto.


Senhor Presidente, nesse sentido lhe deixo aqui, o texto de uma exposição feita em Lisboa sobre a reforma Bolonha, lhe deixo aqui a expressão das minhas angústias quanto ao futuro da Universidade em Portugal. Ironia da história, senhor Presidente, fui seu aluno e nessa época seu crítico fui, na qualidade de estudante, como o foram também Ferro Rodrigues, Augusto Mateus, Carlos Pimenta, Félix Ribeiro, Francisco Soares e tantos outros, com quem se partilhou perspectivas outras de Universidade que a de então mas também necessariamente muito diferentes daquelas com que nos deparamos actualmente. E hoje, de igual modo seu crítico sou, senhor Presidente, por não partilhar da mesma visão do mundo, mas é ao nosso Presidente que agora me dirijo, a si portanto, que venho com esta carta apelar para que se questione seriamente o que é a Universidade de hoje, o que queremos como Universidade de amanhã e, sobretudo, que nos preocupemos seriamente com a nossa juventude. De novo, ironia das ironias, tal como em criança fiz o protesto admissível ao ministro da Educação de então, protesto não divulgável porque estávamos em fascismo, hoje, em democracia, dirijo-me a si, senhor Presidente, fazendo o protesto que me é eticamente exigível , mas agora necessariamente aberto a todas as formas de divulgação que são próprias de quem resiste em nome da cidadania e do desejo de uma sociedade mais justa, mais solidária, mais ambiciosa nos seus projectos, faço-o, porque confio também agora no sistema, confio na Democracia que representa, confio na dignidade do cargo que ocupa e faço-o num momento em que sinto que as Instituições Governamentais estão a ficar de costas voltadas para as grandes missões de interesse público. E nestas está necessariamente, a imposição de não deixarmos que se deixe destruir a juventude de hoje, está a obrigação de tudo fazermos para que esta não se transforme irrecuperavelmente numa lost generation.


Senhor Presidente, parafraseando Thomas Piketty no artigo citado, considero que é urgente que os dirigentes portugueses, assim como todos os dirigentes europeus e todas as Instituições da União Europeia, tenham finalmente a coragem de ter uma visão nacional e europeia solidária e ambiciosa para se sair da crise actual e esta não é só financeira como nos querem fazer crer, esta atinge tudo o que é socialmente significativo na sociedade portuguesa. Comecemos nós por compreender a necessidade da existência dessa coragem.


Consciente de que é necessário perceber a dimensão do desastre que se está a criar e também a dimensão do mal-estar que a muitos docentes está a condicionar, espero, senhor Presidente, que este meu apelo seja entendido e com esta esperança lhe peço que aceite os meus respeitosos cumprimentos.


Júlio Marques Mota
Professor Auxiliar
Faculdade de Economia
Universidade de Coimbra





16 comentários:

  1. A posição assumida pelo Professor Júlio Marques Mota, é de uma grande coragem e de uma exemplar consciência dos seus deveres de cidadania, bem como das suas responsbilidades como membro do corpo docente de uma instituição
    como a Universidade de Coimbra; coragem e consciência que, infelizmente, a maioria dos cidadãos não assume. É um belo documento, claro na exposição dos seus argumentos. Não creio, infelizmente, que produza qualquer efeito na acção presidencial - incolor e submissa relativamente aos poderes instituídos - os da prevalência dos interesses privados relativamente aos direitos dos cidadãos. Se estas palavras despertarem algumas consciências menos pétreas do que a do presidente, já tera sido uma vitória. Um grande abraço, Professor!

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  2. Impecável. Magnífico e pedagógico documento. Parabéns. Pena é que não chegue às mãos do Presidente. E se chegar pena é que ele não o leia. E, se por acaso o ler, pena é que não atinja nada do que ele contém. Interpretando carlos Loures, que estas palavras tão necessárias possam atingir, ao menos, consciências e mentes menos anquilosadas e petrificadas.

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  3. Grande integridade e grande honestidade intelectual, como todos os docentes deveriam manifestar. Esta carta deveria transformar-se num documento de circulação nacional, sob a forma de manifesto para poder ser apoiado por muita gente. Pela minha parte, dar-lhe-ei a maior divulgação possível.

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  4. soberbo. Que lição!

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  5. Curiosamente Fernando Ulrich disse ontem que a Universidade só fabricava licenciados e doutores, e saltaram-lhe às canelas.
    Por outro lado faz-me lembrar os "vencidos da vida". Talvez o Eça agora escrevesse a Cavaco, não se sabe. O que se sabe é que onde os professores não desistem há resultados, sempre assim foi em todos os tipos de escola.
    A onda de lamúrias que atravessa o Estrolabio é uma desilusão mas não é geral. espero que não haja aí um Antero que se suicide.

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  6. É preciso aparecerem os optimistas, mas não me parece que tenhamos razões para sermos felizes. Quanto a estas diferentes visões a do Prof Júlio Mota é a do académico, a do Fernando Ulrich é do banqueiro. Oxalá se oiçam.

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  7. Peca apenas por não referir as responsabilidades dos próprios docentes. Herdou-se um sistema fechado em que a autonomia universitária serve não raras vezes os interesses instalados, a autoridade do professor de carreira, a sua intocabilidade (nao tanto em relacao ao poder politico do qual muitas vezes participa, mas em relação aos alunos, à sociedade, etc.) A qualidade do ensino universitário em Portugal, ou a falta dela, deve-se em parte (não pequena talvez) à endogamia do sistema, à falta de mobilidade e de sangue novo. A figura e papel do professor catedrático em particular e talvez um dos mais perniciosos, senão mesmo herdeiro directo da cultura de autoritarismo e arbitrariedade que reconhecemos nos tempos do fascismo. E nem sempre o parco orçamento justifica a falta de qualidade do ensino universitário, como se pode ver pela publicação recente de concursos para a contratação de mais de 20 novos professores catedráticos na Universidade Técnica de Lisboa (apenas para dar um exemplo). Quantos professores estagiários, convidados, etc. poderiam ser contratados no lugar deste professores catedráticos, optando-se pelo conhecimento não raras vezes anquilosado do professor catedrático, em vias de jubilação?

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  8. Esse circuito fechado é responsável, sem dúvida.Mas segundo julgo saber agora já é possível que professores de fora da universidade possam concorrer, há mesmo já um exemplo de um estrangeiro que terá concorrido.

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  9. Carlos Mesquita, desejo muito que não sejas tu o Antero porque eu acho completamente descabido o teu comentário perante um texto tão digno e tão corajoso como este onde estão apontados todos os problemas por que te tens rebelado tanto. Também acho muito estranho que dês tanta atenção aos comentários dos banqueiros em relação à educação.A mim, interessam-me tanto em relação a esse como a outro assunto qualquer. Essa das lamechices no Estrolabio também é outra que não entendi. Podias esplicar melhor.
    A anónimos não respondo.

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  10. Augusta Clara,não há lamechices nenhumas, há uma realidade dura que durante muito tempo muitos não quiseram ver.Acreditaram que fomos os últimos a entrar na crise e os primeiros a sair.Já se fala à boca cheia em implosão social nos próximos 3 meses como já existe na Grécia e na Islândia. Um país mais injusto e mais pobre do que há 20 anos.

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  11. Olá Augusta. Achas o que achas e eu acho o que acho. O que tu achas não altera o que eu acho, principalmente sendo o argumento tu achares diferente do que eu acho. Acho o teu comentário ao meu comentário completamente descabido perante um comentário tão digno e corajoso onde eu aponto problemas contra os quais me tenho rebelado tanto.
    Agradeço-te o desejo que eu não seja um Antero (não esperava outra coisa duma amiga) mas é improvável; como ele fiz parte duma geração combativa que queria revolucionar a sociedade, mas perante a adversidade sei que não fico deprimido. Passei e estou a passar por problemas graves, mas enfrento-os, se for preciso à marrada. Por isso, para mim, a lamúria alheia é insuportável. É o que mais noto à minha volta, é uma cruz, mas é a vida.
    Acho estranho que aches estranho que eu ouça com atenção quem fala publicamente, e mais estranho, sabendo tu que faço da análise da realidade a minha intervenção cívica.
    Não tenho nenhum índex de personalidades a não ouvir, sejam banqueiros ,papas, ou outros, só não presto atenção aos surdos-mudos porque não sei linguagem gestual.

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  12. temos que enfrentar a realidade, andar à pedrada mas manter a serenidade. mas isto é muito mau.Nos próximos 3 meses vamos ter problemas sociais graves, não os desejo, mas não vale a pena meter a cabeça na areia.

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  13. Carlos Mesquita, tirando os trocadilhos iniciais, engraçados, mas supérfluos, eu estaria, em abstracto, tentado a concordar com o que dizes. Porém, num país onde como, no nosso, as pessoas ou calam-se ou consultam a cartilha do politicamente correcto antes de se pronunciar, uma carta como a do Professor Júlio Marques Mota é de saudar e considerá-la como uma lamúria é não a ter lido com atenção. O Professor está a dirigir-se ao «mais alto magistrado da Nação» (embora seja iletrado, não sabendo quantos cantos têm "Os Lusíadas"e ne, conseguimos imaginar o que ele não sabe...), apesar disso, pela vontada emanada do livre voto dos cidadãos, ele é o presidente da República e quem lhe escreva uma carta não pode esquecer esse pormenor. Em suma, Mesquita, considerando o objecto da tua crítica,acho-a injusta. E o facto de tu não achares... etc, etc.

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  14. António Gomes Marques19 de dezembro de 2010 às 22:17

    Logo que li a carta que o Júlio me enviou, respondi-lhe como segue:

    «Meu Caro Júlio

    Gostei da tua carta a Sua Excelência, cada vez mais excelência pela manifesta incapacidade de ouvir, de ver e de falar (responder) a quem o questiona. É uma pessoa morta mas que respira, perfeitamente dispensável nos tempos que vivemos, principal responsável (sem desresponsabilizar os que se lhe seguiram) pela situação que vivemos em função da sua actuação como Primeiro-Ministro e que tem a desvergonha de vir dizer que a situação seria bem pior se não fossem os avisos que fez e as influências que exerceu.

    ...»

    Vamos gramar mais 5 anos de Cavaco, o que mostra bem a consciência política dos portugueses. Mas como podemos nós exigir consciência política a milhões de portugueses (no mínimo 2 milhões!) que não sabem sequer se no dia seguinte vão ter dinheiro para comer? Como exigir a estes milhões de portugueses consciência política se nem sequer sabem como dar de comer aos filhos?

    E José Sócrates continua a dizer-se defensor de um Estado social e ousa apresentar-se como o seu único garante, ele que tem em Cavaco Silva o seu candidato, embora disfarce fingindo apoiar Manuel Alegre.

    E, meus amigos, qual é a pessoa de esquerda que em Portugal se sente representada por Manuel Alegre? Se Sócrates quisesse outro Presidente que não Cavaco Silva apoiaria tal personagem?

    Ai Lampedusa, que numa simples frase nos ensinaste tanto!

    E fico-me por aqui... por agora.

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