sábado, 4 de dezembro de 2010

Os bancos irlandeses serão eles os responsáveis pela crise?

Está a terminar a nossa Semana da Economia,. Apresentámos, no passado dia 3, a versão original deste artigo de Marc Roch que trazemos hoje na tradução do Professor Júlio Marques Mota. São do Professor estas palavras que consigo transportam o repto de um debate. Debate que, na sequência de algumas das ideias aqui lançadas, seria útil e, por certo, esclarecedor.

Face ao descrito no texto que se segue e face às medidas impostas pela União Europeia e pelo FMI deixamos como interrogação: como é possível explicar aos nossos alunos e aos nossos netos, no quadro de sociedades estruturalmente desenvolvidas, as razões, os mecanismos e as respostas sobre a crise que estamos a passar, que estamos a viver, que estamos a sofrer ? Como é possível que os nossos alunos e os nossos filhos expliquem às gerações futuras o roubo que às gerações presentes é feito do seu próprio futuro e, de novo, roubo que é suposto ser feito, ele também, no quadro de sociedades consideradas altamente desenvolvidas ? Como questão final e face ao descrito no texto como se compreende, ainda no quadro de sociedades altamente desenvolvidas, que a União Europeia e o FMI sancionem os roubados da Irlanda, o seu povo, e não aqueles que o roubaram. Quem souber que responda.


E por esta via talvez abram o debate e que seja duro


Terão eles sido bem controlados?

Não terá A UE feito vista grossa durante muito tempo?

Todas as descrições que desde há vários anos ouvimos e lemos sobre o Tigre Celta, como foi a Irlanda baptizada devido às suas taxas de crescimento equivalentes às taxas dos Tigres Asiáticos (daí o nome) começavam invariavelmente por um sedutor paradoxo. E o paradoxo era a metamorfose das terras pantanosas, sem nada semeado, em altas torres todas elas de vidro e aço em movimento perpétuo.
A elite bancário estiveram no centro da transformação de um país rural e profundamente religioso num laboratório prodigioso do sector terciário. Mas, como o ilustra bem o actual colapso económico da Ilha Esmeralda, “os escândalos” acabaram por juntar um mundo financeiro em profundo conluio com os promotores do sector imobiliário e com e os políticos. Um triângulo tóxico...

"Desconfiem dos grandes bancos dos pequenos países que privados de iniciativas locais dignas deste nome, se sentem, naturalmente, levados a crescer para além da sua base de partida, correndo fortes riscos...": como o afirma um operador da City, o naufrágio irlandês encarna até ao limite máximo possível o que foi a corrida louca de cada banco local para aumentar a dimensão.

O milagre da Irlanda. Como na da Bélgica, Islândia ou na Escócia, o sector financeiro irlandês está organizado em oligopólio. Três grandes bancos de retalho (Bank of Ireland, Allied Irish Banks e Anglo Irish Bank), assim como duas de crédito repartem entre si o essencial de um mercado interno de 4,4 milhões de pessoas.

O que fazer com esse dinheiro, que de repente fluía para os seus cofres no final dos anos 90, como resultado do nível de vida e de bem-estar, com uma saúde de autêntico cavalo? Uma política fiscal agressiva, especialmente a baixa de impostos sobre as empresas o que atraiu empresas estrangeiras, uma praça financeira em pleno desenvolvimento e especializada na administração de hedge funds e mão-de-obra formada e barata foram estes os elementos que alimentaram o milagre da Irlanda.

Para os bancos em busca de investimentos altamente rentáveis, para este maná de liquidez, a solução é óbvia: investir pesadamente no sector imobiliário, principalmente na parte comercial e escritórios. Os bancos de Dublin financiam de olhos fechados promotores imobiliários e empresas de construção . Enquanto isso, às famílias, muitas delas nem sempre solváveis, eram-lhes oferecidas a compra de casas com hipotecas a 100% ou mesmo mais, sem sequer confirmarem os rendimentos familiares, nem ao menos o recibo de pagamento salários .

À frente dos bancos, uma nova geração de dirigentes megalómanos substituía os antigos banqueiros prudentes e conservadores . Demasiado pequena para eles, a Irlanda: estes precisam da Ásia, do Reino Unido, da América! Abriram filiais luxuosas em todos os cantos do globo. Tanto quanto o pagamento de dividendos era grande, os accionistas não tinham nada a criticar quanto às anomalias dos balanços, os bónus de fim de ano eram miríficas, o estilo de vida era luxuoso, era sim para os senhores do dinheiro.

Além disso, no interior dos bancos, o nepotismo é a regra. Os princípios da boa gestão são alegremente ignorados. A casta dirigente na frente e por trás dos auditores dos auditores desviava dezenas de milhões de euros para financiar a compra de vivendas de luxo, iates e carros desportivos de topo de gama.

Clientelismo, elevador social desligado e as maquinações. Como é possível explicar tais derrapagens, dignas de uma república das bananas? Em primeiro lugar, neste pedaço de terra, neste pequeno país, onde todos os decisores se conhecem, a nomenclatura financeira vive em completa simbiose com o mundo político e industrial.

Desde a independência em 1921, a vida pública é dominada por dois grandes partidos, o Fianna Fail e Fine Gael, que se situam... ao centro. Sobre as questões económicas, não há diferença de substância. O clientelismo, o desligar do elevador social e as falcatruas são a norma. Parlamentares, financeiros e magnatas da construção frequentam os mesmos clubes de golfe ou os mesmos círculos hípicos e entendem-se tão bem como os ladrões de feira.

Essa ligação umbilical explica que no Outono de 2008, Brian Goggin do Bank of Ireland, e Eugene Sheehy, do Allied Irish Banks, conseguem mesmo impor ao novo ministro das Finanças, Brian Lenihan, que proporcionasse uma protecção a 100 % aos depósitos bancários como aos créditos concedidos, de má qualidade, créditos hoje denominados tóxicos. Essa decisão só veio piorar as coisas.

Até à data, apesar das graves vigarices comprovadamente feitas, nenhum banqueiro foi colocado para lá das grades, na prisão. Os promotores no centro do escândalo puderam emigrar com toda a impunidade. Outros transferiram a propriedade dos bens ilicitamente adquiridos para o nome das suas mulheres para os colocar ao abrigo de qualquer confiscação. "Este país permanece um clã, unido, parece quase uma máfia. O poder é patrimonial", diz-nos um observador indignado, perplexo, com a inércia da justiça e da polícia. É evidente que, aos olhos dos banqueiros, se o sistema financeiro capotou, a culpa é da crise de confiança, é dos construtores tubarões, é dos investidores gananciosos... Não é culpa deles.

Controladores pouco experientes. O segundo ingrediente da tragédia que se desenrola hoje é a fraqueza do regulador. Três controladores muito inexperientes foram durante tempo os responsáveis pela supervisão dos dois maiores bancos da ilha. Associados ao Banco Central, o organismo de tutela não fez qualquer esforço para incitar o seu rebanho a minimizar o risco. Além disso, o medo da fuga dos investidores estrangeiros que andam à procura de estabilidade e de benefícios fiscais levou o Tesouro irlandês a abrandar ainda mais as regras.

Depois, confrontado com a atracção de altos salários na praça financeira ou nos gigantes de equipamentos eletrónicos, a função pública bem se esforça para poder recrutar os melhores elementos. É por isso que o governo tomou como adquirido a subavaliação do financiamento do “buraco” bancário, como foi expressa pelo seu banco de consultoria, a Merrill Lynch, escolhida por causa de sua origem irlandesa. Depois disso, não houve nenhum controle quanto á utilização de 50 mil milhões de euros injectados pelo governo de Dublin desde 2008 no sector financeiro.

Os irlandeses estão agora a sofrer a ressaca e interrogam-se . Para sair da rotina, os seus bancos, de facto em falência e nacionalizados, devem rapidamente aliviar-se mesmo depreciados dos seus activos periféricos ou dispositivos externos. A prioridade consiste agora em se concentrarem no mercado interno desvalorizado durante a última década a favor da expansão no exterior, a favor do boom no mercado imobiliário ou dos pequenos génios dos mercados de produtos e dos produtos miraculosos. Como diz Byron a propósito de Itália, os bancos irlandeses não são mais do que a "a triste mãe de um império morto"...

Marc Roche (correspondente em Londres), "Les banques irlandaises sont-elles responsables de la crise? ", Le Monde, 26 de Novembro de 2010.

2 comentários:

  1. São, são! altas taxas de remuneração do capital accionista muito acima da taxa padrão, altas remunerações dos gestores assentes nos resultados de curto prazo e reguladores de olhos fechados (não sei se lhos fecharam ou se são cegos de nascença).Foi assim em todo o lado.

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  2. Discordo desta análise que desculpabiliza os responsáveis pela ideologia político-económica dominante nos últimos cerca de 30 anos.
    Vou explicar-me no post de amanhã.

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