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sexta-feira, 24 de dezembro de 2010

Natal e marketing - Natal é marketing

Carlos Loures

Natal e marketing - Natal é marketing – um simples acento agudo colocado sobre o e, transforma a conjunção em tempo verbal e converte dois conceitos que desde há muitos anos andam juntos numa afirmação que, não sendo toda a verdade, consubstancia toda uma verdade.


Não vou aqui repetir a consabida história da Coca Cola que pegou no São Nicolau lhe vestiu um traje vermelho e o transformou numa «tradição». Foi em 1929, no Natal, dois meses após a quinta-feira negra de 24 de Outubro, do crash da bolsa novaiorquina. As vendas haviam caído vertiginosamente, era preciso um golpe de asa e… voilá! - sai um Pai Natal. As tradições agora são assim – os touros de morte em Barrancos começaram em 1928 e também já são «uma tradição». Não há paciência para deixar passar os séculos – queremos uma tradição, já!

quarta-feira, 20 de outubro de 2010

Os valores de todas as coisas (II)

(Conclusão)
George Monbiot

Esta viragem foi reforçada pela publicidade e pela comunicação social. O fascínio da comunicação social pelos políticos no poder, as suas listas de ricos, os seus catálogos das 100 pessoas mais poderosas, influentes, inteligentes ou bonitas, a promoção obsessiva que faz da celebridade, da moda, dos carros velozes, das férias caras: tudo isto incute valores extrínsecos. Ao gerar sentimentos de insegurança e de inadequação – o que equivale a reduzir o sentimento de estar bem consigo próprio – também afasta os objectivos intrínsecos.

quarta-feira, 7 de julho de 2010

Um case study

Carlos Loures


 – Estou lixado. Desta vez nem tu me vais poder salvar...

Viera sentar-se à minha frente a beberricar, com um ar taciturno e carregado de preocupação, o seu insólito copo de leite, enquanto eu bebia o uísque de malte que ele, gentilmente, me enviara momentos antes à mesa como emissário anunciador da sua chegada.

Conheci-o poucos anos antes do 25 de Abril. Fomos colegas numa agência publicitária e, porque nessa altura eu o safara de uma alhada terrível, ficou-me para sempre muito grato, tratando-me com carinho pelo diminutivo, oferecendo-me, no Natal e aniversário, livros, gravatas, cachimbos, e pagando-me bebidas sempre que me encontrava. Embora inteligente e perspicaz, é uma daquelas pessoas que, parecendo transpirar autoconfiança, são inseguras e complexadas. Se, pelo Natal ou pelo aniversário, lhes oferecemos um dicionário, desconfiam que lhes estamos a chamar analfabetos e, se lhes damos uma água-de-colónia, suspeitam de que estamos a acusá-los de higiene precária. No caso deste meu amigo, é justamente essa insegurança congénita que, aliada à sua incultura enciclopédica, fruto de leituras dispersas e sempre apressadas, e a uma estranha vaidade, ou, mais precisamente, a uma incontrolável atracção pelo abismo, o faz entrar constantemente em territórios desconhecidos, gera uma fatal propensão para se envolver em trapalhadas, em situações difíceis e, sobretudo, complicadas. Penso que ele é vítima de um uso exagerado do chamado método de «leitura em diagonal», ou «método Kennedy» como também outros chamam a um sistema de leitura que consiste sobretudo em não ler, em tresler. Aprendera o tal método, salvo erro num livro das «Selecções do Reader’s Digest» e gabava-se de ler com rapidez meteórica mesmo as grandes obras da literatura universal. «Apanho sempre o essencial», dizia.

quinta-feira, 20 de maio de 2010

O dinheiro fica todo na farmácia.


Carlos Mesquita

Entrei na farmácia perto de casa, virei à direita, nesta vira-se à direita, e ainda a curvar sou abalroado de chofre por uma bata branca, caiu-me em cima vedando a passagem, a bata tinha dentro uma mulher a falar. Havia algo estranho, fiquei alerta; os neurónios a rebate trocaram chistes, e antes da intrusa acabar a primeira frase, já o meu cérebro calejado nestes enredos tinha processado que estava a ser alvo duma emboscada. A bata era de farmacêutico (não é por acaso) o comportamento da mulher não. Perguntou-me com voz suficiente para se ouvir ao redor: -o senhor tem problema nas articulações? Disse-lhe que não. Ela, exibindo-me uma caixa colorida continuou, agora com o paleio B. Olhe que está na idade em que…cortei-lhe a palavra, e para a convencer que não me vendia nada para as articulações, articulei-lhe pausadamente e com bom som; - não tenho queixas e se as tivesse ia ao meu médico, ele receitaria o que fosse indicado, já o teria feito se fosse preciso como preventivo, depois disso viria aqui à farmácia aviar a receita, comprar o que ele prescrevesse, percebeu. Pareceu aturdida com o argumento, olhou para os outros clientes para verificar se tinham ouvido o meu responso, e profissionalmente desistiu. Ainda me refilou – é a sua opinião! Segui para a fila de clientes a remoer no disparate de ir ao médico ser uma questão de opinião e a vendedeira de produtos para as articulações foi pôr-se de atalaia atrás da porta. A presa foi a primeira pessoa que entrou, senhora de idade. Foi na conversa, ainda protestou que quarenta e tal euros era muito caro para ela, mas aceitou comprar o produto. A vendedora da bata contrafeita que tinha levado a freguesa até ali, acompanhou-a a tiracolo até à caixa, satisfeita por ir facturar.

Provavelmente a idosa, que não tinha ar de acumular várias reformas ou ter filhos gestores públicos, em casa olhando para os trocos irá arrepender-se. Presumivelmente irá lamentar-se às raparigas da sua idade e maleitas similares que o dinheiro fica todo na farmácia. De certeza quando entrou na farmácia não contava fazer esta despesa suplementar.

A técnica (de vendas) agressiva, aproveitando situações de fragilidade como é a dos doentes, e em espaços que são de confiança entre eles e os profissionais da saúde, como são as farmácias, é de todo inaceitável.

Cristo não descerá à Terra para correr com estes vendilhões. As farmácias correm o risco de se transformarem em locais de libertinagem comercial, com bancas modelo praça e regateiras a condizer. Imagine-se a farmácia do futuro; corredor extenso com pontos de venda de ambos os lados, e detrás dos balcões os vários propagandistas a apregoar as vantagens dos seus produtos; lá chegaremos.

Pelo sim pelo não, para acautelar embaraços, vou passar a espreitar para dentro das farmácias antes de entrar. Supunham que uma promotora comercial me aborda, e diz, – o senhor aparenta ter mais de 55 anos, sabe que nessa idade deve ter cuidado com a próstata, dá-me licença que lhe faça um toque rectal?