quinta-feira, 15 de julho de 2010

Novas Viagens na Minha Terra


Manuela Degerine

Capítulo XLIX

Décima quarta etapa: de Albergaria-a-Velha a S. João da Madeira

(continuação I)

Pinheiro de Bemposta tem belas casas brancas com cantarias de granito. Apenas saio do café, viro à esquerda, quando devera seguir em frente, o que aqui não me inquieta, quando compreendo o erro: subo por um bonito caminho entre muros de pedra. Procuro os correios e informo-me sobre a possibilidade de enviar as botas para Lisboa – parece que trago um cadáver na mochila! Compro a embalagem, começo a escrever o destinatário, continuo porém a reflectir, paro um instante, acabo por adiar: aguento outro dia. E pode ser que os meus pés cicatrizem...


Por enquanto vão muito contentes, segundo dia de caminhada sem me incomodarem, já não é pouco, não interrompi a viagem, porém ontem, como hoje, tenho tido sorte: caminho no alcatrão. E se, de repente, houver pedras? Com os crocs, mesmo na calçada, já eu sofro; sinto todas as saliências onde poiso os pés. Uma coisa é certa: não haverá sempre alcatrão. E, mesmo em Maio, pode chover. Tendo feridas nos dedos, será imprudente molhá-los. Convém por isso não me precipitar, não tomar decisões definitivas antes de chegar ao Porto… Tenho aliás dificuldade em imaginar que me encontro nos arredores do Porto: estou a dia e meio de viagem. O Porto, para mim, neste momento, situa-se a uma distância que talvez não consiga percorrer.

Há uma ponte para os peões atravessarem a N1. Subo, desço, na direcção de um grupo de peregrinos que, mortos de cansaço, após uma noite de caminhada, jazem em cima de um muro, incapazes de, por ora, darem mais um passo. Sento-me junto deles a comer uma barrita e a descansar as costas. Gostava de fazer lhes perguntas. De onde vêm? E... acham que o primeiro-ministro sabia quando disse que não sabia do negócio PT-TVI? Nos mass media só se fala disto: será o que leva tantos peregrinos a Fátima? Também é a razão, ainda não revelada, que me empurra para Santiago. (Vejo-me sem segredos a partir deste capítulo... Espero que o leitor prossiga – mesmo assim – a leitura.)

O percurso sinalizado coincide agora com o roteiro e leva-me a subir e descer encostas muito inclinadas para evitar alguns metros da N1. Atravesso por fim a nacional. Viro à esquerda. Passo por Travanca. A certa altura, ignoro onde estou, passo por um restaurante com freguesia, entro, há peixe assado nas travessas, peço, quando apanho a jeito um empregado, que me prepare uma sandes com peixe.

- Não prefere sentar-se?...

- Não tenho ainda fome.

Fita-me, perplexo.

- Quer uma sandes com espinhas?!

- Ponha para dentro do pão: eu entendo-me com elas.

- Só cá temos daquele pão...

Vejo em cima das mesas umas fatias muito apetecíveis. O empregado desaparece, desconfio que se esqueceu, quando ele enfim volta com um pão de meio quilo.

- Pode ser este?

Antes de eu abrir a boca, corta-o ao meio, entala lá dentro peixe, tomate, cebola e duas colheradas de molho. Quero protestar – já tenho uma sandes grande como um tabuleiro de Tomar. Não me atrevo... Peço, para conseguir comer, que corte aquilo em duas porções. Pago. E saio – muito mais pesada!

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