Carlos Leça da Veiga
Quem submete Portugal?
Norte-americanos e centro-europeus, uns e outros, embora em decadência manifesta, por razões estratégicas, políticas e económicas que são muito próprias de cada qual, não desistem, pelo contrário, insistem em garantir os seus variados graus de comando em toda a área do mundo que consideram sua. Neste sentido, e sempre a troco de assegurarem um controlo absoluto do mundo chamado ocidental, não descuram quaisquer fracções do território submetido, em cujas dispõem, ás suas ordens, um dispositivo bastante para dar-lhes as garantias mais seguras duma continuidade inalterável.
Aqui, em Portugal – vê-se no dia a dia – as orquestrações alienígenas, para uma sobrevivência mais garantida, não deixam de envidar esforços de ordem vária na mira de assegurar a sobrevivência económico-política dos possidentes portugueses e, por igual, a dos seus parasitas inefáveis, mau grado, a estes últimos, serem-se-lhes reconhecidas as autorias da maior parte dos atropelos sucessivos à legitimidade com que, com muita impunidade, atingem e mancham a prática democrática da justiça social. Esta situação com aspectos sociais verdadeiramente calamitosos é fácil de constatar-se pelo conhecimento dos sucessivos retrocessos dos indicadores sócio-económicos de referência, pelos sucessivos escândalos dos atropelos à legalidade, pela exibição constante duma propaganda política falaciosa, senão mentirosa e, também, pela exibição mal disfarçada dum constante servilismo político-económico internacional.
Bastará fazer-se a leitura da Constituição da República Portuguesa para ficar a saber-se que, apesar de não estar expresso, a situação de dependência nacional não é uma circunstância minimamente reconhecida, sequer admitida, contudo, a vivência nacional diz-nos que ela existe, é superiormente bem acolhida e, também, como tudo leva a demonstrá-lo, tem conduzido a um acentuar constante do défice democrático que é aceite sem contrariedade de maior pelos partidos políticos que dominam a vida política e social portuguesa.
Os portugueses têm de ser súbditos da Organização do Tratado do Atlântico Norte (OTAN), uma sucursal dos Estados Unidos da América do Norte e, também, têm de ser súbditos da União Europeia (EU), uma sucursal do centralismo franco-germânico. Por força da primeira organização – uma herança do salazarismo – são obrigados a assumir compromissos e acções ao serviço dos interesses estratégicos expansionistas do imperialismo ianque que, no mundo, são cada vez mais reprovadas e condenados. Por força da segunda – uma imposição ditatorial do soarismo – têm de ter uma política internacional que é aquela das potências continentais centro-europeias; têm de ser importadores forçados de tudo quanto lhes é mais necessário; estão sujeitos às regras neoliberais impostas pelo mercado europeu; têm desigualdades sociais que geram verdadeiros abismos sociais e, de facto, vivem sob a pressão duma aculturação importada que, para cúmulo, não é deliberadamente contrariada pela acção educativa da escola cuja, também, para tudo piorar, recebe o suplemento negativo da ajuda inteiramente “pimba” que a comunicação social, de sobremaneira, sabe publicitar e incentivar.
A política internacional portuguesa teria de ter sido conduzida, como tem sido, sob o signo da dependência do exterior?
A política internacional portuguesa terá de continuar a ser conduzida deste mesmo modo?
As consequências do 25 de Abril não deveriam ter conduzido Portugal para uma posição sem alinhamentos políticos?
Aceite-se – é demasiado óbvio – que Portugal não tinha, nem tem, ao seu alcance a mínima possibilidade de dissolver, sequer tentar dissolver, quaisquer blocos político-militares e como tal, nem por sombras, fossem quais fosse as circunstâncias, pudesse admitir-se a hipótese de forçar a desmobilização da Organização do Tratado do Atlântico Norte (OTAN) ou do já defunto e não menos atrabiliário Pacto de Varsóvia. Mesmo assim sendo, como é, nada, no direito internacional, inclusive qualquer deliberação da Assembleia-Geral da Organização das Nações Unidas (AGOTAN), podia e pode obrigar Portugal a coibir-se de manifestar declaradamente a sua oposição activa e efectiva à persistência de quaisquer pactos político-militares e, nesse contexto, a pronunciar-se por querer excluir-se da OTAN.
O texto constitucional português, embora com alguma tibieza e sem quaisquer consequências, pronuncia-se pela dissolução de todos os blocos político-militares, porém, quem tem governado, jamais, tomou qualquer atitude no sentido de dar corpo ao preconizado na legislação fundamental.
Desse modo, na medida dos seus interesses geoestratégicos próprios, da sua letra constitucional e das suas possibilidades políticas e diplomáticas, Portugal, em termos políticos e, por desígnio, em favor dos princípios democráticos, podia conseguir dar uma indicação concreta, a todo o mundo, da assumpção duma atitude perfeitamente legítima em matéria de política internacional que fosse claramente descomprometida com alianças político-militares multilaterais, para mais comprovadamente agressivas. Seria um exemplo de independência política impossível de ser julgada como uma atitude de política internacional desprezível ou errada, antes pelo contrário, seria um comportamento político autónomo posto em favor do justo orgulho nacional, da Paz mundial e do melhor entendimento de todos os Povos. O que aconteceu? Como é que as coisas aconteceram?
As altas instâncias dos Órgãos de Soberania e os maiores partidos políticos portugueses, ao arrepio das melhores disposições expressas no texto constitucional nacional, proclamaram e festejaram, com entusiasmo redobrado e continuado, a ligação de dependência, em alto grau, frente à OTAN, um bloco subentendido, no número 2 do Artigo 7º do actual texto constitucional português, como mais um que esse alto instituto jurídico desejava fosse destinado à dissolução. Ao seu arrepio, prosseguiram com uma integração nesse bloco politico-militar multilateral que desde o seu começo esteve sempre colocado ao serviço duma potência mundial, os Estados Unidos da América do Norte (EUAN) afinal, um estado reconhecido, desde a sua fundação, pelas suas pretensões hegemónicas e em cuja história são bem conhecidos variados esbulhos territoriais operados sobre territórios e estados tanto da sua vizinhança próxima como, também, sobre outros, a maior ou menor distância, particularidades que não deveriam ter sido esquecidas, pela flagrante contradição, com o momento histórico em que Portugal vivia ao libertar, em favor das suas Independências, os territórios coloniais que ocupou durante séculos.
(Continua)
sábado, 3 de julho de 2010
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meu caro, entre estas verdades que defende e a realidade vai um abismo!
ResponderEliminarÉ verdade Luís. As utopias estão sempre distantes da realidade. Por isso é que são utopias. Sartre disse, mais ou menos, que uma ideia antes de ser concretizada tem uma estranha semelhança com uma utopia. Se reduzimos o realismo ao que existe podemos ter de justificar a realidade «real», por mais injusta e aberrante que ela seja. Já aqui discordei das utopias do Leça da Veiga, não por serem utopias, mas por serem diferentes das minhas. No entanto, também já saudei a pertinácia e convicção com que ele defende o seu direito de sonhar com uma realidade diferente da que vivemos.
ResponderEliminarA minha melhor homenagem é que leio todos os seus textos.
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