segunda-feira, 9 de agosto de 2010

Novas Viagens na Minha Terra

Manuela Degerine


Capítulo LXXIII

Décima oitava etapa: em Ponte de Lima

Deparamos com uma fila de mochilas à entrada do albergue. Nós preferimos esperar: falta-nos força para passeios, até mesmo sem mochila. De súbito, oiço chamar:

- Manuela!

Marlene e o marido abrem-me os braços. Trocamos meia dúzia informações mas interrompemos a conversa porque os alberguistas chegaram e Sérgio começa a ser atendido – daqui a bocado haverá ocasião para compartilhar as múltiplas aventuras. Entretanto também chegaram alguns donos de mochilas, todos alemães, os quais, como é frequente entre os germânicos, contrariamente ao que se pensa, têm dificuldade em respeitar regras, sobretudo no estrangeiro, livres do controlo social que os torna, na aparência, tão ordenados. Aqui: desagrada-lhes terem de fazer bicha para se inscreverem. Fazem comentários jocosos. Eu estudei um ano de alemão, não percebo grande coisa, oiço repetir a palavra portugueses – e vejo, de supetão, o marido de Marlene, dar um berro, vermelho de cólera: se acham a Alemanha perfeita, passassem lá as férias, ninguém os chamou para cá. Ou algo do género. Lanço-lhe um sorriso.



E entramos. O responsável pelo albergue pede-me a credencial, faz uma fotocópia do bilhete de identidade, cobra três euros, soma simbólica que nem o duche pagará, inquire se trouxe saco-cama. Marlene pergunta:

- Alugam cobertores?

- Não.

- Não?!...

- A lavagem fica cara, após cada utilização e, se não os lavarmos, tornam-se imundos, ganham ácaros, transmitem doenças... Vocês não têm saco-cama?

- Temos lençol...

- Comprem: não é caro.

Explico que o problema não é o preço mas o peso. De qualquer maneira agora, como o frio persiste, sendo impossível dormirem só com lençol, os meus amigos vão procurar uma pensão. Despedimo-nos certos de, dali a bocado, nos encontrarmos nas ruas de Ponte de Lima.

(Tais são os labirintos de Santiago: não voltarei a encontrá-los. E, como não nos ocorre, neste instante, apontar os mútuos telefones e endereços electrónicos, não podemos retomar o contacto após o regresso. Talvez agora... Marlene, se leres este capítulo, manda uma mensagem.)

Os dois alberguistas dão-se ao trabalho de conduzir cada peregrino aos pisos superiores, mostram o dormitório, a cozinha, as casas de banho, o lugar das lavagens, o espaço da Internet... Este albergue instalou-se num solar bem restaurado, resultando um espaço funcional e magnífico no qual, para além do requinte em cada pormenor, tudo brilha de asseio.

Ponte de Lima é a primeira cidade na Via Portuguesa de Santiago de Compostela onde, graças a uma autarquia inteligente e numerosas boas vontades, os viajantes encontram um acolhimento comparável – eu diria até mais atento e cuidado – aos que existem através da Espanha.

1 comentário:

  1. A imaginação pode muito. Até restaurar e manter belos edificios para atender os caminhantes...

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