terça-feira, 10 de agosto de 2010

O Risco



Carlos Mesquita

Lendo uma conferência de Anthony Gidens num ciclo da BBC em 1999, descobri algo curioso sobre o “risco”, diz ele que a palavra é portuguesa, inventada durante a nossa História Trágico-Marítima.

Gidens é o teórico da “terceira via” que pretendeu reformar a social-democracia, convencido da prosperidade capitalista e numa globalização solidária; nessa via já se despistaram muitos casmurros que não viram que seguiam por um caminho de cabras, que corria em paralelo com a esburacada auto-estrada do neo-liberalismo, com as mesmas portagens e destino.

O risco está associado à ideia de empresa, ao investimento, à possibilidade de o calculado lucro não vir a existir e até o valor investido se perder. Com mar agitado só pescadores muito necessitados se fazem à faina, e mesmo assim avaliando o perigo.

Na época de maior sucesso empresarial da nossa história, minimizaram-se as percas fazendo embarcar à força condenados, enquadrados por aventureiros e corsários cujo risco se dividia entre o perdão a fama e a riqueza ou perecer. Quem mais lucrava com a empresa ficava seguro em terra firme, e as perdas em material e vidas humanas tinham a falta de importância que têm hoje o encerramento de empresas e o desemprego.

Era o ciclo económico do Império, e os efeitos da globalização à portuguesa. 
 
Hoje que a globalização já não é à portuguesa nem social-democrata de via alguma, mas imperialista e especulativa, o risco é diferente; não há como investir com garantia, não há costa à vista nem vigia a bombordo.

O sistema financeiro sempre protegido não sabe onde meter o dinheiro sem risco, segura-o no Estado.

Em Portugal o capital está historicamente concentrado, antes em algumas famílias, com as nacionalizações, no Estado, com as privatizações em poucos financeiros portugueses e cada dia mais em mãos de estrangeiros.

História à parte têm feito pessoas com expediente e profissionais qualificados, que, ou porque descobrem um nicho de mercado, ou se julgam tão capazes como os patrões, se lançaram a criar empresas; e foram tantos que constituem hoje os maiores empregadores. Pois são esses que o Estado persegue de tempos a tempos, para lhes lembrar que além do risco natural dos seus empreendimentos, têm de contar com a desconfiança da máquina que alimentam. O fisco só procura quem conhece, quem algum dia se inscreveu nos seus cadernos de presença. O Estado sabe que a parte do leão da fuga ao fisco é de quem está na economia informal, mas essa é paralela, vive na twilight zone, e o crepúsculo não convida a visitas. Talvez para encontrar a razão para não haver crescimento económico há dez anos, fizesse sentido ir ver quantos daqueles que abandonaram a produção de riqueza, por razões conjunturais, voltaram a cometer o erro de arriscar.

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