sexta-feira, 15 de outubro de 2010

Há opções à austeridade?

Carlos Mesquita



É uma história com muitos anos, de tempos a tempos estamos em crise.

Os portugueses ainda não estão (todos) convencidos de que é impossível manter o tipo e nível de vida actual, ou vir a recuperá-lo, sem tomar medidas correctivas que são dolorosas. Disse aqui que achava estranho os nossos parceiros europeus aprovarem medidas económicas restritivas, e nós nada fazermos. É verdade que a culpa é dos políticos e dos seus jogos, mas é justo dizer que os partidos em quem nós votámos e agora culpamos, tiveram 10 milhões (somos 10 milhões?) de cúmplices. Os portugueses estão a ser enganados ou tem sido conveniente viver no engano? Gente que continua a viver bem tece amuos por causa da miséria alheia, mas não prescinde dos privilégios que conseguiu. Qualquer corte nas benesses adquiridas pela faixa da população que decide quem governa, (a base de apoio do “centrão”) provoca ameaça de crise política, e dos lados, à esquerda e à direita, sobrevive-se melhor em crise política.

Há desavenças e falta de entendimento entre as forças políticas, mas é resultado dos equilíbrios que os portugueses tentam fazer quando votam. Pensou-se por cá que se não houvesse estabilidade governativa, nunca chegariam as medidas impopulares, que da necessidade dos políticos agradarem ao povo, nunca faltaria dinheiro, subsídios, borlas e crédito barato. Acontece que os governos pedem dinheiro lá fora para manter essa ilusão, e quem o empresta é que define as condições. Esses mercados financeiros onde a banca vai buscar o dinheiro para emprestar à economia, e onde o governo também recorre para pagar as despesas do Estado, estão atentos à situação do país. O que é visível por qualquer observador estrangeiro é preocupante; não há crescimento económico, o consumo privado não é suficiente (e com as medidas de austeridade vai piorar) aumentámos as exportações mas as importações ainda subiram mais, e não se consegue parar o aumento das despesas do Estado. A somar à situação económica que não consegue pagar as contas, à despesa pública que não baixa, inventou-se uma crise política de efeitos imprevisíveis.

Após o anúncio das medidas de austeridade, verificou-se um alívio nos mercados financeiros, mas de lá para cá, cada vez que Passos Coelho abre a boca para dramatizar a aprovação do Orçamento de Estado, Portugal fica a dever mais uns milhões de juros. O PSD está no direito de votar contra o Orçamento, mas se vai viabilizá-lo através da abstenção (é o mesmo que votar a favor) tem de ser responsabilizado por estes custos. Como também será se Portugal ficar á mercê do FMI e das penalizações do mercado, por causa de não haver Orçamento. Os apelos de todos os quadrantes a Passos Coelho para ter juízo e não prejudicar mais a situação difícil em que estamos é caricata, como tem sido a hesitação do governo, ou a conversa demagógica do resto da oposição.

Com o rumo que as coisas estão a tomar, parece-me que as alternativas para os portugueses são de ir empobrecendo devagar ou de um dia para o outro.


(In Semanário Transmontano)

6 comentários:

  1. Uma das coisas que mais raiva me mete é que ninguém de nós, o povinho que vota, pergunta ao presidente (como não preside a nada, vai em minúscula) da República o que aconteceu aos milhões que, enquanto primeiro-ministro, anunciou que entravam, por dia, no país durante o seu governo.Para onde foram?
    Mesquita,tens razão em indignar-te mas, perante a realidade do que acontece sucessivamente sem que possamos ter mão nisto, já não me admira a apatia das pessoas quanto ao OE. Se se escamoteiam os pormenores que mais interessam...

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  2. Augusta, nao e ao Presidente, ou antes tambem e, e ao PS que esta no governo ha 12 anos nos ultimos 15...

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  3. Primeiro que tudo, bem-vindo, Luís. Ou ainda estás na China?
    Depois, tens razão no que dizes, mas eu lembro-me bem desses governos do Cavaco porque estava a trabalhar e do optimismo reinante por ir haver dinheiro para os projectos de investigação,independentemente dos bloqueios que criou entre os laboratórios do Estado e as Universidades o que, na altura, prejudicou muito a investigação científica no país. Mas, enfim, Cavaco é Cavaco, e não há muito a esperar daquela rigidez mental. É preciso não esquecer que foi nessa altura que ele elevou remunerações na função pública. Eu por mim falo. Estava lá e fui beneficiada com isso.

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  4. Ainda estou na China. Mas a austeridades ja deveria ter comecado ha muito, gradualmente, ainda este ano o governo gastou mais 450 milhoes de euros com os professores, para os calar. O problema e que no Estado ninguem esta a altura exigida.O proprio ministro das financas que tem, por natureza, uma funcao tecnica de contencao e bom senso, andou a varrer as casa ao Socrates todo este tempo. O Luis Campos e Cunha saiu ao fim de 3 meses, percebe-se porque...

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  5. Empobrecer,Carlos, isso ja e certo!Ha muito que nao se produz so se distribui e, muito injustamente, o que pedimos emprestado.

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  6. Luís olá,cuidado com os campos de trabalho e os cães xau xau, são ambos indigestos.
    Só uma rectificação histórica:
    Em 2005 os titulares de cargos públicos passaram a ter de optar por um terço do vencimento de uma das fontes de rendimento. Foi uma atitude simbólica sobre a famigerada acumulação de pensões de reforma com salários, a que dediquei um post recente da nova versão que não foi adiante. Dois ministros estavam nessa situação, Mário Lino e Campos e Cunha; Lino aceitou e Campos e Cunha bateu com a porta, não quis deixar de receber por inteiro a pensão por ter sido 6 anos vice governador do Banco de Portugal, no valor de 114.000 euros/ano (6anos/114.000!) e o de professor da Nova, 4.000 e picos a 5.000 e picos mais o salário de ministro. A razão não foi política.

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