quinta-feira, 7 de outubro de 2010

Mario Vargas Llosa – Um Nobel que é uma vitória da boa literatura.

Carlos Loures

Ainda há dias, numa troca de comentários com o Professor Raúl Iturra, dizia como me parecia injusta a não atribuição até agora do prémio Nobel da Literatura a Mario Vargas Llosa. Habituados, como estamos, aos tortuosos critérios da Academia de Estocolmo, não havia, porém motivos para surpresas. Houve, na minha perspectiva, prémios imerecidos – não estou a referir-me a Saramago – poderia, no entanto dizer muitos nomes que só por motivos marginais à literatura podem ter sido honrados com o Nobel. Critérios políticos, quase sempre. Principalmente durante a Guerra Fria.

Mario Vargas Llosa, oriundo da aristocracia peruana, homem que foi de esquerda e depois assumiu posições de um neoliberalismo radical, parece-me, no entanto, um daqueles casos em que apenas foram levados em conta argumentos literários – é, quanto a mim – um excepcional escritor. Talvez haja, mesmo na América Latina, escritores de uma grandeza superior que não conseguiram o prémio – Jorge Luis Borges é um desses casos. Tendo cooperado com a junta militar, manchou com uma lamentável posição política uma obra de uma excepcional qualidade intelectual. Outro argentino – Ernesto Sábato, de quem Saramago foi grande admirador, é outro caso de inexplicável “esquecimento”. Vive, embora à beira de completar um século, é marxista assumido – o que não tem sido motivo de exclusão.

Não vou repetir a informação biográfica deste homem que nasceu em 1936 em Arequipa, Peru. Nem referir a sua vastíssima bibliografia. Tudo está aí por todo o lado. Direi só que a sua obra é de uma grande qualidade literária. Abarca a ficção, o teatro e o ensaio. Destaco os romances Conversa na Catedral (1969), - Pantaleão e as Visitadoras (1973), - A Tia Julia e o Escrevinhador (1977), - A Guerra do Fim do Mundo (1981)- A Festa do Bode (2000) e Travessuras da Menina Má (2006).

Penso que desta vez nada há a censurar à Academia Sueca, mas já li declarações de escritores com opinião contrária à que aqui deixo. A minha apreciação é feita exclusivamente no plano literário. Felizmente que, quer nesse plano, quer noutros, não existe unanimidade. Para mim, foi uma vitória da boa literatura contemporânea e, pensando assim não podia deixar de aqui o vir dizer.

6 comentários:

  1. Carlos, sei que vais dizer que isto é um prémio literário, e é desse ponto de vista que escreves. A minha opinião, que vale apenas o que vale, é a seguinte: Quem não entende, e, pelo contrário, ataca severamente, nos dias de hoje, a revolução cubana, a revolução venezuelana e boliviana, não é capaz de entender nada neste mundo, por melhor que escreva.

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  2. Adão, o Vargas Llosa é um neoliberal - não lhe podes exigir perspectivas de esquerda na análise dos grandes problemas do nosso tempo. O Fernando Pessoa apoiou o Sidónio Pais e isso não lhe retira um grama ao seu génio. As perspctivas das esquerdas (plural) não são as únicas. Para mim, o escritor Mario Vargas Llosa é excelente, o político com o mesmo nome não me interessa. As posições políticas do Saramago, que tinha uma visão de uma esquerda que não é a minha, também não me interessavam absolutamente nada - os seus livros sim, li-os todos.

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  3. Carlos, estou plenamente de acordo contigo.Uma coisa é a obra e outra o homem. Mas com tanta coisa boa para ler, e que eu não leio por falta de tempo, dispenso ler, ainda que digam que é bom, o produto de homens por quem o meu respeito é escasso, e que produzem no meu ser anticorpos que levam a uma leitura mais parecida com agressão imunológica do que com prazer de leitura.

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  4. Tenho andado aqui a resistir não me meter na vossa conversa. Mas não consigo deixar de te dizer isto, Adão: perdes um grande livro se não leres "A Festa do Chibo" que, do princípio ao fim, podia ser escrito por um homem de esquerda. É um grande libelo contra a tirania, a tortura e toda a malvadez dum regime como foi o do Trujillo na República Dominicana. Para além de ser um grande romance altamente elogiado pelo George Steiner.E, que eu saiba, o Steiner não é de direita.

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  5. Mau português: "resistir a meter-me", assim é que é.

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  6. António Gomes Marques8 de outubro de 2010 às 14:56

    Como o Carlos se lembrará, o Vargas Llosa foi muitas vezes referido nas nosssas conversas e ambos comungamos da opinião de que é um grande escritor. Também a sua obra de ficcionista não pode ser apelidada de direita, bem pelo contrário. No entanto, senti-me atraiçoado quando ele virou homem de direita e hoje, quando pego num livro dele, nem sempre consigo resistir a arrumar de novo o livro na estante. Defeito meu, com certeza, mas que é um grande ficcionista, disso não tenho a mais pequena dúvida.

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