segunda-feira, 8 de novembro de 2010

Sempre Galiza! - coordenação de Pedro Godinho: Síntese do reintegracionismo contemporâneo, por Carlos Durão



Galiza Sempre! inicia hoje a publicação no Estrolabio do notável ensaio de Carlos Durão, Síntese do reintegracionismo contemporâneo, sobre as raízes e razões do reintegracionismo galego.
Para possibilitar uma leitura sequencial deste ensaio do professor Carlos Durão, e durante a sua publicação, Sempre Galiza! passará a ter uma presença diária.
A não perder, todos os dias, no Sempre Galiza!, a publicação da Síntese do reintegracionismo contemporâneo, de Carlos Durão.



Síntese do reintegracionismo contemporâneo

por Carlos Durão

(Nota prévia: O presente trabalho foi concebido com o alvo eminentemente prático de orientar as pessoas que se acheguem sem preconceitos à problemática do idioma galego. Não é um ensaio histórico: só “contemporâneo”; e não é um estudo em profundidade: só uma “síntese”; tem, sim, uma parte de história recente, mas sobretudo quer refletir os testemunhos de um grande conjunto de pessoas que, em muitos casos independentemente umas das outras, chegaram a conclusões parecidas e convergentes: por isso elas não figuram no texto em ordem histórica nem alfabética. E, pelas mesmas razões, conclui com um mínimo de bibliografia e endereços de organizações reintegracionistas. Uma versão abreviada foi publicada no 1º Boletim da AGLP, 2008)


Introdução

O alvo do REINTEGRACIONISMO é reintegrar as falas galegas do norte da raia galego-portuguesa (e leste da Comunidade Autónoma da Galiza, nas comarcas limítrofes do chamado galego oriental) no seio da língua inicialmente galaico-portuguesa e hoje internacionalmente conhecida como portuguesa: em fim reconstituir a unidade da língua nada na velha Galécia.

Embora fosse por fins dos anos 70 e princípios dos 80 do século XX quando se começou a espalhar o emprego dos termos REINTEGRACIONISMO e REINTEGRACIONISTA na cultura galega, o conceito é facilmente identificável desde muitos anos antes na obra de autores diversos que à primeira vista não pareceriam estar associados a este movimento.

Assim, brevemente, o  Pe Feijóo (1726) opina: “el idioma Lusitano y el Gallego son uno mismo”; e o Pe Sarmiento (1755.1974: 30): “la lengua portuguesa pura no es otra que la extensión de la gallega”. Pela sua parte, Gregorio Mayáns i Siscár (1737.1981: 58-59) diz: “El Portuguès, en el qual comprehendo el Gallego, considerando aquel como principal porque tiene Livros, i Dominio aparte; i dejando ahora de disputar qual viene de qual”. E Juan Valera (1896): “Lo mismo, aunque los gallegos se enojen, se puede decir del dialecto gallego con relación á la lengua portuguesa, que en mi sentir y tal vez en el sentir de los que no estén muy obcecados, es el gallego literario, atinada y ricamente cultivado durante cuatro siglos.António de la Iglésia, ao incluir um capítulo de Os Lusíadas na antologia El idioma gallego, está a evidenciar igual conceção.

(No mesmo sentido geral expressaram-se B. Vicetto, Marcial Valadares, López Ferreiro, Garcia de Olhóqui, Garcia Pereira, o Marquês de Figueiroa, F. Vaamonde Lores, F. Anhom, J.M. Pintos e a própria Rosalia de Castro. Depois Vitoriano Taibo, R. Cabanilhas, C. Emílio Ferreiro, A. Noriega Varela, Á. Zebreiro, Á. Gil, M. Lugris Freire, F. Bouça-Brei, F.L. Cuevilhas, A. Iglésia Alvarinho, A. Couceiro Freijomil. E dos não galegos: J.J. Nunes, Menéndez Pidal, Lindley-Cintra, Luciana Stegagno Picchio; também E. Alarcos Llorach e Koldo Mitxelena.)

Mª Helena Mira Mateus assinou uma moção, aprovada no CONGRESSO SOBRE A SITUAÇÃO ACTUAL DA LÍNGUA PORTUGUESA NO MUNDO (1985, I: 586), que diz: “o Congresso reafirma a tese de que o galego e o português são normas cientificamente reconhecidas de um mesmo sistema, que engloba as comunidades linguísticas luso-galego-brasileiro-africanas”.

Francisco Tettamancy (1907: 14) escreve: “O seu idioma é o nosso, e tais são as suas afinidades que em nada diverge do galego, pela sua estrutura, pela sua fonética, pela sua fraseologia, pelas suas desinências, etc., só que os portugueses o civilizaram”; Leandro Carré Alvarelhos (1959: 155-156): “o portugués é o noso mesmo idioma lixeiramente modificado pol-o uso constante das xentes cultas e bencriadas. Cáseque como falan hoxe os portugueses, falaban os nosos antergos cando Galicia era reino con personalidade propia”; Eugénio Carré Aldão (1921, 3: 71): “hoje os povos duma mesma raça se buscam e chamam, tratando, pese a quem pese, de se unirem numa só e comum aspiraçom”; e até os escritores galegos em castelhano, como Júlio Camba (“si en gallego se puede decir todo lo que se quiere, ello es tan sólo a condición de decirlo en portugués”), ou Venceslau Fernandes Flores (que confessou que “respiraria melhor” se lhe fosse possível escrever em português).

Igualmente os filólogos não galegos: Leite de Vasconcelos (1929, IV: 361): “sendo o galego e o português uma mesma língua”; José Agostinho (1921: 9): “A língua, todos nós sabemos quanto parece idêntica”; Margot Sponer (1927, 37:): “Cantas veces por empregar eu as verdadeiras formas galegas tomáronme por portuguesa!”; Sampaio Bruno (1906: 101): “português e galego foram diferenciando-se cada um do seu lado, de modo que cada um se topa em face do outro como um dialecto perfeitamente definido, não porque o português seja um dialecto do galego ou o galego um dialecto do português, mas porque português e galego saíram duma base comum, a língua galécio-portuguesa”.

Eduardo Pondal empregava a grafia etimológica, e cantou, em Queixumes dos pinos, o “verbo do grã Camões, fala de Breogã”. Manuel Murguia (1891.1974, 43: 83-89) posicionou-se sobre a necessidade de utilizar a grafia portuguesa: “o nosso idioma [...] que do outro lado desse rio é língua oficial”; e na apresentação da Academia Galega em 1906; escreveu em português para a revista Aurora do Lima, de Viana: conserva-se pelo menos um manuscrito português seu (1996, 47: 352-359); e num fragmento manuscrito, do arquivo da Real Academia Galega:El gallego y el portugués [...] son uno mismo en el origen, gramática [...] y vocabulario. Por que no aceptar la ortografía portuguesa? Si nos fue comun en otros tiempos, por que no ha de serlo de nuevo? (Caixa 113); “La verdadera lengua, gallega o portuguesa, -para el caso es igual- [...] es la corriente en Galicia y gran parte de Portugal, la misma que hablaron Camoens y Sáa de Miranda” (Risco, 1976: 182).

(continua)

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