quinta-feira, 11 de novembro de 2010

Sempre Galiza! - coordenação Pedro Godinho: Síntese do reintegracionismo contemporâneo (4), por Carlos Durão



Síntese do reintegracionismo contemporâneo (4)

por Carlos Durão


(continuação)

Quanto mais nos achegamos aos nossos dias, mais numerosos são os testemunhos, e mais forte é o movimento, prematuramente rejeitado pelos pessoeiros do oficialismo. De facto, o “lusismo” fora já descartado por Carlos Casares por fins dos anos 70 no jornal La Voz de Galicia como “felizmente já superado”, considerando “peregrina” a proposta de R. Lapa (vide infra); mas anos depois também considerava “extravagante” a ortografia oficialista (1999, 902: 25); e Darío Xohán Cabana escrevia pelas mesmas datas, no semanário A Nosa Terra, que isso era uma “enfermidade infantil” do nacionalismo. (E o que anos mais tarde seria presidente da RAG, X.L. Méndez Ferrín, acusou os reintegracionistas de traidores à pátria, e de estarem em contra do idioma, o mesmo que a pior reação espanholista.)

Para designar este conceito empregaram-se os termos seguintes: “grafia renovada”, “reintegrar”, “língua franca galaicoportuguesa”, "unificação”, “novo idioma", unificação ortográfica”, “reabilitação literária”, “língua galaico-portuguesa”, “reintegração”, “recuperação literária”, “integração”, “integracionismo”, “integracionista”, “incorporado”, “mesma língua”, “reincorporação”, “ortografia comum”, “língua portuguesa”, “integração linguística galego-portuguesa”, “restaurar”, “ortografia unificada”, “rectificação”, “devolução”, “resgate”, “unificação ortográfica galego-portuguesa”, “galaico-português”, “galaicoportuguês”, "galego ou português", “regeneração”, “regeneracionismo”, “reintegração galego-portuguesa”, “recuperação”, “galego etimológico-reintegrado”, “reingresso”, “reinserção”, “lusistas-reintegracionistas”, “reintegracionismo/lusismo”, “luso-reintegracionismo”, “lusoreintegracionismo”, “restituição”, “revitalização”, “recuperação do idioma”, “recuperacionista”, “reintegrante”.

Também se empregaram para este campo semântico os termos “galego-português”, “galegoportuguês”, “língua galécio-portuguesa”, “português galego”, “português da Galiza”, “portugalaico”, “língua galaico-portuguesa”, “lusofonia”, “galaicofonia”, “portugalego”, “porto-galego” e “galeguia” (“lusismo” e “lusista” foram amiúde empregados com sentido pejorativo pelos isolacionistas para tentar desacreditar este crescente movimento diante da opinião pública).

Foi M. Rodrigues Lapa o primeiro que usou o termo “portugalego”, como abreviatura de português galego: “galego-português ou portugalego” (1977); “fala galega, mas língua literária portuguesa da Galiza sob o nome de portugalego” (1979: 127). Posteriormente empregaram-no R. Carvalho Calero: “galego-português, portugalego, galuso, galego ou português” (1983.1984: 16); A. Gil Hernández: “galego (português ou portugalego)” (1988, 14: 197), e Joaquim Reis: “galego-português [...] Ou portugalego, que é o mesmo” (1997, 785: 27). R. Lapa também  empregou “Portugaliza” por vez primeira: "Para designar isso mesmo, em termos menos sublimados, nós criámos uma palavra composta que vem a dar no mesmo: Portugaliza.  Isto é, a união de dois países irmãos, estreitamente ligados, mas em perfeita liberdade" (1982.1985: 37) (anteriormente empregara o termo “Portugalicia” pelo menos uma agência de viagens entre Londres e Galiza e Portugal).

Também Rodrigues Lapa empregou o termo “galeguia”: “Perante esta evidência, demonstrada a galeguia (que bonito nome!) do português de todos os quadrantes, perguntamos se é justa a opinião daqueles que se empenham em descobrir diferenças no génio dos dois povos irmãos” (1981, 74: 500). Posteriormente foi empregado pelo escritor brasileiro Luiz Ruffato para designar a lusofonia: “no meu caso, compreendi perfeitamente o galego -mas essa felicidade, que chamei de galeguia (galegria), dá um tom de suavidade muito particular” (2005, 83/84: 241), no VIII Congresso da Associação Internacional de Lusitanistas, Compostela, 2005 (21 julho), e numas Jornadas organizadas pela fundação Via Galego, em 2007; e ainda: “sabemos que a língua com que nos expressamos, antes de ser portuguesa, é galega - a Galiza é o berço do que se convencionou denominar, por injunções históricas, de língua portuguesa. Então, na época, propus que ao invés de levantarmos a bandeira da lusofonia, passássemos a falar em galeguia - que devolve o sentido original da raiz da nossa língua, relativiza o peso do passado colonial e reincorpora, com os devidos créditos, a Galiza a este universo comum” (2007, 89/90: 214).

Foi, com efeito, o professor Manuel Rodrigues Lapa, que se considerava galego de Anadia, um vulto fulcral na orientação do reintegracionismo. Cedo demonstrou o seu interesse, apaixonado até, pelos problemas do galego, sempre livre de qualquer “imperialismo linguístico” de que foi injusta e miseravelmente acusado pelo oficialismo galego: por exemplo por X. Alonso Montero, embora este aconselhasse ao crítico literário: “Non te esquezas do duro traballo que é darlle orde literario a un idioma que se presentaba sin elo. Non te esquezas que no papel non se pode poñer o lenguaxe tal como o ouvimos na boca do pobo. Haberá que pensalo e vivilo con mentalidade elevada, con mentalidade culta” (1951: 71). Mas para Alonso Montero o galego nasceu no século XIX (1958/1959). Para X.L. Méndez Ferrín o galego nasceu com o Pe Sarmiento (2006).

Já nos anos 30 escrevia Lapa: “Para esta indispensável aproximação é necessário em primeiro lugar reformar a ortografia galega no sentido da nossa ortografia oficial, sempre que isso seja possível, que quase sempre o é” (1932.1979: 20); “O acordo filológico entre as duas regiões seria coisa facílima, não precisando sequer da intervenção oficial: bastava um entendimento entre o Centro de Estudos Filológicos e o Seminário de Estudos Galegos” (1935, 425: 261-262); “Afinal, parece que estamos todos de acordo: fala brasileira, mas língua portuguesa do Brasil, com as singularidades próprias de cada uma, mas sem quebra da unidade fundamental [...] Com efeito, aquilo que atrás dissemos sobre o caso brasileiro, poderíamos repeti-lo quase nos mesmos termos a respeito do galego: fala galega, mas língua literária portuguesa da Galiza sob o nome de portugalego, isto é, com as peculiaridades próprias de cada uma, sem prejuízo da unidade fundamental [...] O português literário, sem garantia de propriedade, é privilégio de três países, Galiza, Portugal e Brasil, a que se juntaram agora mais cinco nações africanas emancipadas” (1979: 125/127/128); “não nos esqueçamos de que uma língua falada não é nunca língua de todo o povo; é de uma região, de uma profissão, de uma classe; só a língua escrita é uma língua geral, -no espaço e no tempo” (1979: 126); “Sempre considerei a Galiza, essa terra maravilhosa, desgraçada e incompreendida, como sendo a minha própria terra; e historicamente e geograficamente assim é, pois estou dentro dos limites da velha Galécia, que chegava pelo sul ao rio Mondego” (1979).

(continua)     

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