sexta-feira, 12 de novembro de 2010

Sempre Galiza! - coordenação Pedro Godinho: Síntese do reintegracionismo contemporâneo (5), por Carlos Durão



Síntese do reintegracionismo contemporâneo (5)
por Carlos Durão

(continuação)

Nos anos 50 e 60, R. Lapa colabora com a editora Galaxia em publicações de textos medievais, como as Cantigas d'escarnho e de maldizer dos cancioneiros medievais galego-portugueses (1965.1970), e insiste: “Uma das grandes dificuldades para quem se ocupa dos trovadores é e continua a ser a determinação dos seus lugares de origem, da sua pátria, digamos, no fraseado de hoje, que não correspondia ao de então. É, em muitos casos, uma tarefa vã; e isso mesmo tem um significado lisonjeiro, porque revalida a ideia de uma perfeita identidade entre as duas Galizas, a de além e a daquém Minho” (1952, I: 9); “O único remédio eficaz para a salvação do idioma, gravemente ameaçado, deverá ser uma decisiva aproximação com o português, que poderá considerar-se a expressão literária do galego” (1971.1979: 27); “o galego não pode morrer: sobreviveria no português, sua pulcra expressão literária” (1973, 42: 466); “o galego, ou se perde, devorado pelo castelhano, ou se salva, incorporado no português, sua língua natural, como pretendia o grande Castelão” (1983.1986, 6/10: 26);  “De qualquer forma, e para conforto dos que o amam, o galego não morrerá, por uma simples razão: é que ele está bem vivo e razoavelmente puro no português de hoje” (1974.1979: 71); “Pois bem: quando 3 milhões de galegos falarem galego e escreverem português, ou galego-português, como língua de cultura, estará findo em glória o drama crucial que tem afligido o povo da Galiza” (1979: 110); e adverte: “a singularidade só se compreende dentro de um largo espírito de comunhão, que a reforça e engrandece.  O culto injustificado e abusivo da diferença, respeitável em si mesmo, só pode conduzir à desgraça.  Foi o que aconteceu ao filho pródigo; e é também o que pode acontecer ao galego, em termos de língua e de cultura” (1981.1982.1985, 4/5: 38); “todo Portugal é mais ou menos galego.  A toponímia demonstra-o claramente” (1985, 4/5: 39-40); “o reintegracionismo desejado, que se nos apresenta como única salvação do galego” (1981, 74: 498); e em fim: “Falta ao galego de hoje a consciência de que galego e português foram e são ainda a mesma língua, apesar das diferenças que a uma delas imprimiu o contacto com outra língua, culta e dominadora. [...] Por isso, quaisquer que sejam as vicissitudes que o destino e a cobardia dos homens reservem ao idioma galego, uma coisa temos como certa: esse doce linguajar não morrerá, pois se ouve e se lê em Portugal, onde é uma língua de cultura [...] De qualquer maneira, estamos a braços com um dilema, que exige uma opção crucial: ou o galego se perde, submergido pelo castelhano; ou se salva, apoiando-se na força duma língua em ascensão como é o português” (1972, 8: 2).

Foi nos anos 70 quando R. Lapa, sabedor de que a “Ley General de Educación y Financiamiento de la Reforma Educativa” (Ley 14/1970, de 4 agosto, BOE, no 187) autoriza por primeira vez, sequer timidamente, o ensino do galego na escola primária, publica o seu artigo "A recuperação literária do galego" (1973, 13: 5-14), que já anunciara antes em correspondência particular à redação do Grupo de Trabalho Galego de Londres; assim: “É que tenciono responder a uma carta que o nosso bom e comum amigo Ramón Piñeiro escreveu ultimamente para a revista portuguesa “Colóquio” (no 8), na qual ele põe o problema do galego dum modo exageradamente optimista, sem declarar os perigos a que ele está sujeito e que os galegos aí de Londres tão perspicazmente enxergam” (1972); “Tenho esboçado um longo artigo, a publicar na revista “Colóquio/Letras” da Fundação Gulbenkian em resposta a uma “Carta de Santiago” nela publicada pelo nosso querido amigo Ramón Piñeiro, em que ele vê o caso com excessivo e perigoso optimismo. Na verdade, só vejo nesse problema crucial duas hipóteses: 1) ou se forja a passo acelerado a koiné indispensável ao uso literário, recorrendo principalmente ao português [...] 2) ou a língua literária do galego culto será singelamente o português já feito, que lhe é oferecido em salva de prata -de fácil aprendizagem, pois se trata da mesma língua./ Isto é fundamentalmente o que eu penso e o que desejaria ver discutido, com seriedade, objectividade e desejo de acertar” (1972); e mais adiante: “Ainda vou dar uma réplica final ao nosso bom amigo Piñeiro, aduzindo novas razões, mas não quero prolongar uma polémica, que sei que os magoa, pois vejo-os numa atitude suicida frente ao problema da língua e da cultura” (1974); e ainda: “Com a teimosia, levada ao paroxismo, o Galego sofre hoje de outro mal, o complexo da singularidade; e isso leva-o a recusar o retorno à tradição comum, como você diz muito bem” (1981).

No seu soado artigo, que como vimos é uma resposta a Piñeiro, diz claramente Lapa: “Nada mais resta senão admitir que, sendo o português literário actual a forma que teria o galego se o não tivessem desviado do seu caminho próprio, este aceite uma língua que lhe é brindada numa salva de prata” (1973, 41: 286). O artigo é “contestado” por Ramón Piñeiro (1974), embora confesse “que non son dúas senón tres as linguas que xurdiron do común galego-portugués: o galego, o portugués e mailo brasileiro [...] lingua filla do portugués como este o é do galego-portugués [...] estamos totalmente de acordo en que o galego e o portugués son radicalmente a mesma lingua” (1974: 401). E Lapa: “Pergunto daqui ao meu querido amigo Ramón Piñeiro, que na dedicatória do seu Cancioeiro da Poesia Céltiga [sic] (1952) me considerou “o mais ilustre galego de aquém-Minho”, o seguinte: -Se eu tenho orgulho em ser galego desta Galiza de aquém-Minho, e não é a primeira vez que o manifesto (sou de Anadia, nos limites da Galiza anterga [sic]), por que razões ele, homem de Lugo, que pertencia à metrópole de Braga, não há-de ter orgulho em ser português? Dizendo melhor: por que não havemos todos de ter muita honra em ser galego-portugueses?” (1977, 55: 44). Mais adiante: “o galego de hoje é um composto de formas arcaicas e populares do galego-português com mistura aberrante de castelhanismos de toda a espécie. A este idioma desgraçadamente poluído dá-se o nome de ‘castrapo’” (1982: 235-236).

(continua)

2 comentários:

  1. Muitos leitores interessados na Galiza e na língua Galaico-portuguesa. belo serviço público.

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  2. Este trabalho do Pedro, tal como outros trabalhos extensos que por aqui têm passado, mereciam ser integrados numa base de dados onde pudessemos ir consultá-los sempre que quisessemos.

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