Clara Castilho
“Novas Cartas Portuguesas”
Lisboa, Abril de 1972. Três escritoras portuguesa, com obra já feita - Maria Isabel Barreno e a Maria Velho da Costa e Maria Teresa Horta, escrevem um livro em conjunto, a que chamaram “Novas Cartas Portuguesas”. Nelas aparecem figuras femininas marcadas por condicionalismos de vária ordem, maltratadas, enclausuradas, dependentes, vítimas de amor ou paixão, casadas à força, enganadas, exploradas… e pacientes!
Procuram um editor. A Dom Quixote - dirigida por outra mulher, Snu Abecassis, que já ousara enfrentar a censura com a publicação da obra de uma das autoras, e tivera como consequência a ameaça de fechar a editora, por parte de Moreira Baptista, Secretário de Estado da Informação e Turismo – mostra-se indisponível. Será outra mulher, Natália Correia, directora literária de “Estúdios Cor”, quem ousa enfrentar a censura que reagiu ferozmente: as autoras são acusadas de pornografia e ultraje à moral pública !
O livro foi retirado do mercado e seguiu-se um processo judicial a que só a pressão dos movimentos feministas internacionais e a Revolução de 25 de Abril de 1974 permitiram pôr termo. Dentro do país, devido à censura nos jornais pouco se soube. No estrangeiro, movimentos feministas faziam manifestações, marchas, acontecendo mesmo a ocupação da embaixada portuguesa na Holanda pelas feministas holandesas.
Quase quarenta anos se passaram. Mudou muita coisa? Mudou pouca? Continuaremos a falar sobre este assunto.
Recentemente foi reeditado, numa edição anotada por Ana Luisa Amaral.
Resulta de um projecto - "Novas Cartas Portuguesas: Três Décadas Depois", fruto de uma investigação do Instituto de Literatura Comparada Margarida Losa da Universidade do Porto, e é financiado pela Fundação para a Ciência e Tecnologia (FCT). Para a Professora Ana Luísa Amaral, interessava mostrar que se esta obra podia ser lida à luz dos estudos feministas, também deveria ser analisada à luz de teorias que questionam a própria noção de identidades estáveis.
O texto foi deixado intacto mas junto a ele há 200 anotações, um índice, uma bibliografia contendo os textos usados pelas autoras e o pré-prefácio que Maria de Lourdes Pintassilgo escreveu em 1980.
Programa-se uma tradução em inglês e outra em italiano e envolverá 15 países, 13 equipas e 26 investigadores. O objectivo é estabelecer e estudar o impacto das NCP "quer a nível histórico-social, quer a nível democrático". Estão envolvidas investigadoras de seis países e cabe aos coordenadores em cada país formar "equipas voluntárias de jovens investigadores que farão a recolha de tudo o que foi escrito sobre as “Novas Cartas Portuguesas” em cada país". Daqui resultarão dois livros: um em português, "NCP entre Portugal e o mundo", que será lançado em 2012, com colóquio em Évora; outro em inglês, em 2013, "New Portuguese Letters to the World, International Reception".
terça-feira, 7 de dezembro de 2010
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Lembro-me muito bem do lançamento deste livro e do escarcéu que houve na altura.Mulheres coragem.
ResponderEliminarA Maria Velho da Costa trabalhava na mesma instituição que eu. Lembro-me bem do sururu que por lá houve.
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