terça-feira, 12 de outubro de 2010

A nossa esperança de hoje: o resgate dos mineiros - por Raúl Iturra


Mulher de mineiro soterrado na Mina São José, sitío de Esperanza, Provincia de Coquimbo, Chile

De Isabel Matos Alves (LUSA) – Há 13 horas

Santiago do Chile, 11 Out (Lusa) -- As equipas de resgate esperam começar o salvamento dos 33 mineiros presos numa mina no norte do Chile, desde Agosto último, "a partir da meia-noite de quarta-feira" (hora local), anunciou hoje o ministro das Minas chileno.

"Esperamos começar o processo de resgate a partir da meia-noite de quarta-feira (04:00 em Lisboa) ", declarou Laurence Golborne, à comunicação social nas imediações da mina de San José.

O ministro chileno referiu que os testes realizados, no domingo, à cápsula que irá transportar um a um os mineiros até à superfície foram um sucesso, referindo que o engenho conseguiu atingir os 610 metros de profundidade.

© 2010 LUSA - Agência de Notícias de Portugal, S.A.

Agradeço a honra concedida de ser português. Antes fui Britânico, filho de espanhóis e outras ervas, que para este texto não interessam. Porque continuo a ser chileno de tomo e lomo, como dizemos em chileno castiço, sendo tomo a acção de aceitar, e lomo, sobre as costas. Porque é sobre as costas que aguentam não apenas os mineiros soterrados, bem como a maior parte dos chilenos que aceitam trabalhos pesados, mal pagos, moram em poblaciones callampas (bairros de lata em português), trabalhando o dia inteiro, acabam por aceitar outros trabalhos paralelos, porque os salários não permitem viver. Se a Europa está em crise económica, o Chile é crise económica permanente. Todos os homens da família vão trabalhar desde muito novos, especialmente nas minas de cobre, que têm cantos que só permitem a passagem de corpos pequenos. A escolaridade obrigatória acaba quando a criança é capaz de trabalhar.

Nunca esqueço que na minha dourada juventude, todos os verões íamos às áreas rurais e mineiras para alfabetizar. Com Paulo Freire realizámos esse trabalho milhares de vezes, com os eternos 400 estudantes, repartidos em acampamentos diferentes, dormíamos em Igrejas, escolas e regimentos. Eu orientava, era o Presidente da Federação de Estudantes e tinha sido o director de Paulo Freire, mais velho que eu, no Instituto Internacional de ensino, que acolhia estudantes oriundos de todos os cantos de América Latina, para os ensinar a interagir com pessoas pobres e ter a paciência de usar o método do Paulo para alfabetizar.

Aos mineiros do acampamento Esperanza nunca fomos e não havia jovens com garras para ensinar não apenas letras, como os seus direitos sindicais.

Este tipo de mal entendido causou não apenas o soterramento dos mineiros referidos, bem como la Matanza de la Escuela Santa María de Iquique, masacre cometida en Chile el 21 de diciembre de 1907. En estos eventos fueron asesinados un número indeterminado de trabajadores del salitre de diversas nacionalidades que se encontraban en huelga general, mientras alojaban en la Escuela Domingo Santa María del puerto de Iquique. Los eventos que configuran los hechos, suceden durante el auge de la producción salitrera en Antofagasta y Tarapacá, bajo los gobiernos parlamentarios. La huelga, provocada por las míseras condiciones de trabajo y explotación de los trabajadores, fue reprimida por medio del indiscriminado uso de la fuerza armada por parte del gobierno del presidente Pedro Montt.

El general Roberto Silva Renard, comandando las unidades militares bajo instrucciones del ministro del interior Rafael Sotomayor Gaete, ordenó reprimir las protestas, matando a los trabajadores junto con sus familias y dando un trato especialmente duro a los sobrevivientes.

Habrían sido asesinados entre 2.200 y 3.600 personas, donde se estima que un alto número no determinado, eran peruanos y bolivianos quienes a pesar del llamada de sus cónsules se negaron a abandonar el movimiento: Disseram eles: “Con los chilenos vinimos, con los chilenos morimos”. Obreros bolivianos en respuesta a su cónsul. Fonte: Iván Ljubetic Vargas. «[[1] LA MASACRE DE LA ESCUELA SANTA MARÍA]» (en español) págs. 6.

Gesto tão admirável, como os dos mineiros soterrados desde o 5 de Agosto e que serão salvos hoje às nossas 4 horas da madrugada (quando mudarmos a hora na União Europeia, estaremos a três horas de diferença). O debate entre os mineiros soterrados centra-se, agora, em decidir qual deles será o último a sair, como na Escola, quem seria o primeiro a parlamentar com as Forças Armadas. Mal soube a notícia, fiquei tremido de emoção. Felizmente quem dá a ordem, é o director da equipa de resgate. A decisão não é dos mineiros soterrados.

A imagem que exibo é a de uma mulher de um dos mineiros da etnia Aimara que habita no Norte do Chile. O cartão nas suas mãos onde se lê: el valor de estar presente! Acompanhado pela imagem de Nossa Senhora de Lourdes, padroeira dos mineiros do Norte do Chile. Como não tem mais recursos, são essas ideias as que a salvam: saber esperar e o seu ícone, além das missas quotidianas e várias ao longo do dia para os católicos ou preces para os nossos irmãos cristão que professam a fé protestante.

Seja como for, o jogo da nossa selecção com a Islândia hoje à noite, passa ao Plano Infinito, como diz Isabel Allende.

É sabido que não sou homem de fé, mas um Pai-Nosso, e em latim, cairá sobre eles desde a minha boca. É como Santa Maria de Iquique: mineiros não pagos, mina de cobre perigosa que mata mas os proprietários estrangeiros não se importam, como em Esperanza, mas devem pagar todos os imensos gastos do resgate dos mineiros soterrados, por ter mudado a lei e a prática desde 1907: há sindicatos, escolas e direitos que não podem ser ignorados pelos que governam o Chile de hoje.

Aja Deus para que esse içamento, que deve demorar horas, seja realizado com calma e serenidade, com assistência médica e psicológica e sem esse tão trilhado caminho dos abraços e o pranto profundo, que é usado no Chile e noutros países (excepto nos Britânicos e Saxónicos), quando se vê e toca o ser amado por quem, no presente caso, se esperou três meses e sete dias. Essa é a comemoração pretendida da hispanidade.

Não edito este texto, e emoção é muito forte. Mas, muito contida, que me permite, apesar da minha doença que mata, escrever estas linhas em honra aos trabalhadores do meu país, que vivem, desde sempre, em permanente crise…

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