sexta-feira, 3 de dezembro de 2010

O capital e a capital

Carlos Loures

Nesta semana da Economia, não queria deixar de abordar um tema afim. Escolhi falar sobre capital. Acontece que Capital é palavra com muitos significados. Das mais importantes acepções destaco duas, dois substantivos com géneros diferentes – o capital, acepção do foro da Economia; a capital, na área da geopolítica. Dois famosos livros, entre muitos outros, celebram cada uma das acepções - «O Capital», de Karl Marx, e «A Capital», do nosso Eça. Como adjectivo tem também a sua importância – pena capital, por exemplo, para quem a ela tiver sido condenado, assume uma dimensão transcendente. Muito mais dramático do que não ter capital ou ainda pior do que viver nos subúrbios da capital.

“A Capital”, de Eça de Queirós, foi um romance que viria, depois, a dar lugar à sua obra-prima «Os Maias». Refere-se à capital de Portugal – Lisboa. No seu livro, Eça relata as vicissitudes de um provinciano numa capital, também ela provinciana. Porque naquela época final do século XIX, tal como agora, a capital era um espelho do País. Como se cada país tivesse a capital que merece.
Terá sido a necessidade de centralizar, de criar estruturas como, por exemplo, a Casa da Mina e da Índias que levou à criação de uma capital .. Creio que não se utilizava ainda, no século XV, o termo «capital», mas Lisboa começou nessa altura, como maior cidade do País, a concentrar as funções de «cabeça do Império», pois ali se acumulavam todos os órgãos gestionários quer das frotas que demandavam os mares, execução de mapas (o termo «cartografia» só apareceu no século XIX), armazenamento das mercadorias que saíam e entravam, e toda essa complicada operação de logística que implicava infra-estruturas fixas.

Lisboa é desde a Idade Média a maior cidade do País. Na lógica que veio colada ao dealbar do Renascimento, era o sítio ideal para instalar o centro de um império vasto que se espalhava pelos cinco continentes. Como diz Oliveira Marques, no 1º volume da sua «História de Portugal», terá sido «o desenvolvimento de Lisboa que caracterizou demograficamente o fim da Idade Média em Portugal». Era quatro a cinco vezes maior do que qualquer das outras cidades portuguesas.

Ignoro quando apareceu o termo «capital» na acepção geopolítica, mas só o começo a ver mais ou menos generalizado em textos do século XVIII (embora possa surgir esporadicamente em documentos mais antigos). Mas se a palavra não existia ou não estava vulgarizada, existia desde os alvores da Idade Moderna, em Portugal e nos restantes países europeus a realidade da concentração numa cidade dos órgãos de poder e das estruturas e infra-estruturas de governação. Na Corte.

Carlos V  transformou Madrid, uma pequena vila no centro geográfico da Península, numa grande capital. Em todo o caso, saudosistas da grandeza espanhola, lamentam que Filipe II não tenha instalado a capital em Lisboa (na época a maior cidade da Península, só acompanhada de perto por Sevilha e Barcelona). Ter-se-ia, segundo ele, com essa manobra, consolidado a unidade ibérica. Ainda bem que Filipe II não teve tal ideia.

Parece-me que este conceito de capital é arcaico. Nos dias de hoje não se justifica concentrar todos os centros de poder numa única cidade. Por esse mundo fora há exemplos de descentralização que podíamos seguir. Nos Países Baixos, embora a Constituição determine que a capital é na cidade de Amesterdão, quer o Governo, quer o chefe de e o supremo tribunal de justiça estão na Haia. No Chile, embora a capital oficial seja na cidade de Santiago, o Congresso Nacional está sediado em Valparaíso. A África do Sul tem uma capital administrativa, que é Pretória, uma capital legislativa – a Cidade do Cabo, e em Bloemfontein está sediada a capital judicial.  Para não estragar este pacífico artigo sobre Economia (?),  não falo de Jerusalém que Israel diz ser a capital do estado judaico e que os palestinianos consideram também como sua capital.
Sou de Lisboa, gosto da minha cidade, mas não me parece que retirar-lhe a capitalidade fosse prejudicial para os lisboetas. Construir uma cidade no centro geodésico de Portugal seria uma excelente ideia. Fica perto de Vila de Rei. Mas não deveria chamar-se Vila de Rei, nem Cidade de Rei – afinal somos uma República desde há cem anos! Um bom nome, seguindo o exemplo do Brasil, seria chamar-lhe Portugália. A venda dos direitos de naming à empresa cervejeira renderia bom capital. Por outro lado, a construção de uma nova cidade, acessibilidades (aeroporto, auto-estradas, TGV...), etc. , além de aumentar a oferta de emprego, daria um bom impulso ao sector das Obras Públicas, um sector estratégico da nossa Economia. Bingo!

Era aqui que eu queria chegar, mas não foi fácil.

1 comentário:

  1. Caramba, entraste no reino da utopia! Vila de Rei quem ficava contente era o D. Duarte. Portugália era horrível. Deixa lá ficar Lisboa que ninguém se importará se se atribuírem as importâncias devidas às outras cidades.

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